Uma carta aberta, assinada por 37 laureados com o Prémio Nobel e por mais de 1500 cientistas europeus, foi enviada, na última sexta-feira, aos eurodeputados a pedir que votassem a favor das novas técnicas genómicas.
A carta, coordenada pela organização não-governamental ambientalista WePlanet, foi enviada dias antes de a Comissão do Ambiente do Parlamento Europeu se pronunciar sobre uma proposta que visa isentar as novas técnicas genómicas (NTG) da regulamentação europeia proibitiva no âmbito dos organismos geneticamente modificados (OGM).
A votação decorreu esta quarta-feira, com os eurodeputados a apoiarem a proposta de flexibilização das regras aplicáveis às plantas geneticamente modificadas criadas com a ajuda das novas técnicas genómicas, suscitando fortes críticas por parte de grupos ambientalistas.
A carta aberta foi assinada, por exemplo, pela bioquímica Emmanuelle Charpentier e pela microbiologista Jennifer Doudna, que partilharam o Prémio Nobel da Química de 2020 pela descoberta da CRISPR-cas9, uma técnica de edição de genes considerada como um dos avanços mais significativos na história da biologia. Outros signatários incluem os autores Steven Pinker e Peter Singer. São, aliás, estes os quatro nomes que lideram o grupo de mais de mil signatários no apelo à legalização da utilização das novas técnicas genómicas na Europa.
“Rejeitem as trevas do medo anticiência”
No documento, os cientistas defendem que a utilização da CRISPR-cas9 no cultivo de plantas pode reduzir drasticamente a utilização de pesticidas e fertilizantes na agricultura, permitindo também um aumento da segurança alimentar através da criação de variedades de plantas resistentes ao clima.
Os signatários pedem aos eurodeputados que “rejeitem as trevas do medo anticiência” e sublinham que “as novas técnicas genómicas são imensamente promissoras para uma agricultura sustentável, uma maior segurança alimentar e soluções médicas inovadoras”.
“Por conseguinte, encorajamo-los a colaborar com a esmagadora maioria dos agricultores e dos verdadeiros peritos, e não com os lobistas reactivos anticiência da bolha de Bruxelas. Imploramos-vos que votem a favor das novas técnicas genómicas”, concluem, de acordo com um comunicado divulgado pela WePlanet.
Os cientistas alertam ainda que o bloqueio das novas técnicas genómicas poderá ter um grande custo ao nível económico, podendo “custar à economia europeia 300 mil milhões de euros por ano em ‘benefícios perdidos’ em vários sectores” — entre os quais a agricultura, o sector dos materiais e dos produtos químicos, a energia e a saúde.
Comissão do Ambiente aprova proposta
Na quarta-feira, a Comissão do Ambiente do Parlamento Europeu aprovou a proposta para flexibilizar as regras por 47 votos a favor, 31 contra e quatro abstenções, segundo a agência de notícias Associated Press. O Parlamento Europeu deverá agora votar a proposta de lei durante a sessão plenária de 5 a 8 de Fevereiro, antes de poder iniciar negociações com os países membros da União Europeia (UE), que continuam divididos sobre a questão dos organismos geneticamente modificados, cuja legislação foi adoptada em 2001.
Os eurodeputados concordaram em criar duas categorias diferentes e dois conjuntos de regras para as plantas geneticamente modificadas produzidas com recurso às novas técnicas genómicas: as consideradas equivalentes às culturas tradicionais ficariam isentas da legislação sobre OGM, enquanto as outras plantas NTG teriam de cumprir os requisitos actuais.
A comissão concordou igualmente com a proibição de todas as patentes registadas para as plantas NGT, afirmando que tal ajudará a “evitar incertezas jurídicas, custos acrescidos e novas dependências para os agricultores e criadores”, cita a Associated Press.
Jessica Polfjard, membro da comissão, considerou a proposta fundamental para reforçar a segurança alimentar na Europa de uma forma sustentável. “Temos finalmente a oportunidade de implementar regras que abracem a inovação e estou ansiosa por concluir as negociações no Parlamento e com o Conselho o mais rapidamente possível”, afirmou.
Porém, a aprovação da proposta suscitou críticas por parte de grupos ambientalistas. A Greenpeace tinha já afirmado que, se for adoptada, a nova lei poderá ameaçar os direitos dos agricultores e dos consumidores, uma vez que não concede protecção suficiente contra a contaminação das culturas com novos OGM.
“Décadas de progresso na UE em matéria de direitos dos agricultores e de protecção da saúde das pessoas e do ambiente não devem ser anuladas em nome dos lucros da indústria biotecnológica”, afirmou Eva Corral, activista da Greenpeace, citada pela Associated Press. “A legislação da UE não proíbe a investigação e o desenvolvimento. O seu objectivo é garantir que o que é desenvolvido não viola os direitos dos cidadãos da UE à saúde e à protecção do ambiente”, acrescentou.