Condenação de activista local na Rússia junta milhares de manifestantes
A condenação a quatro anos de prisão de Fail Alsynov, conhecido por defender os direitos de um grupo étnico do Sul da Rússia, motivou protestos e confrontos com a polícia.
Milhares de manifestantes entraram em confronto com a polícia russa na sequência do julgamento em que um conhecido activista político foi condenado a quatro anos de prisão na região do Bascortostão, próxima da fronteira com o Cazaquistão.
O nome de Fail Alsynov poderá não dizer muito ao público estrangeiro, talvez nem sequer à maioria dos russos, mas na república do Bascortostão – uma província russa no Sul dos montes Urais com quatro milhões de habitantes – o activista é uma das personalidades mais respeitadas e acarinhadas, sobretudo entre a comunidade de bachquires, o grupo étnico ancestral deste território.
Nesta quarta-feira, o tribunal da cidade de Baimak, a 1400 quilómetros a sudeste de Moscovo, condenou Alsynov a quatro anos numa colónia penal pelo crime de incitamento ao ódio racial. O activista foi acusado de ter insultado os migrantes da Ásia Central e do Cáucaso que trabalham em minas na região ao referir-se a eles como “negros” enquanto discursava durante uma manifestação em Abril do ano passado.
Mas a defesa de Alsynov alegou que o discurso em causa foi “traduzido de forma grosseira” e que a expressão usada pelo activista – “kara halyk”, segundo o Moscow Times – no idioma bachquir significa “grupos de pessoas que fazem trabalhos pesados ou não qualificados”.
Para os seus apoiantes, a condenação de Alsynov é uma retaliação por parte das autoridades russas pelo seu longo percurso de activismo, sobretudo em defesa dos direitos dos bachquires e em oposição aos projectos de exploração dos recursos naturais da região. Foi num protesto contra a mineração ilegal no distrito de Baimak, em Abril do ano passado, que Alsynov fez o discurso que agora lhe valeu a condenação judicial.
Alsynov também se manifestou contra a mobilização militar russa para a guerra na Ucrânia, acusando o Kremlin de promover o “genocídio do povo bachquir”, tendo sido multado em dez mil rublos (cerca de cem euros). Inúmeros relatos dão conta da predominância de recrutas provenientes de minorias étnicas entre as forças russas que combatem na Ucrânia.
Para muitos, o desfecho do julgamento desta quarta-feira não foi uma surpresa. Alsynov “era o último líder livre do movimento nacional dos bachquires que ameaçava [o governador, Radii] Khabirov, com a sua capacidade de influenciar os bachquires”, disse ao Moscow Times o activista bachquir Ruslan Gabbasov, actualmente no exílio.
À porta do tribunal onde Alsynov foi julgado nesta quarta-feira concentraram-se milhares de pessoas, que enfrentaram temperaturas próximas de -20ºC para mostrar o seu descontentamento com o que acreditam ser uma perseguição ao activista. Alguns tentaram bloquear a entrada para o tribunal e envolveram-se em confrontos com a polícia.
Foram usadas granadas de gás lacrimogéneo para dispersar a multidão e houve denúncias de agressões à bastonada, segundo o grupo de defesa dos direitos humanos OVD, citado pela BBC. Foram abertos processos por “revolta em massa” contra alguns participantes na concentração, pelo qual podem incorrer em penas de até 15 anos de prisão.
Durante o protesto, o ministro do Interior do Bascortostão, Rafail Divaiev, dirigiu-se aos manifestantes, apelando a que não “arruinassem” as suas vidas.
Alsynov agradeceu o apoio demonstrado e garantiu que nunca irá admitir qualquer culpa. “Sempre lutei pela justiça, pelo meu povo, pela minha república”, afirmou, citado pelo site RusNews.
Esta terá sido a manifestação popular contra as autoridades russas mais ampla desde os primeiros dias após o início da invasão em larga escala da Ucrânia, em Fevereiro de 2022, à qual se sucedeu um endurecimento do quadro legal contra este tipo de acção.