Os Green Day remexem no seu património em Saviors

No álbum que será editado sexta-feira, os Green Day recentram-se, mostrando-se eficazes e certeiros. Mas isso não chega para quem fez Dookie e outras pérolas pop-punk.

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Saviors é o 14.º álbum dos Green Day Emmie America
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O 14.º álbum dos Green Day chega pouco depois de os norte-americanos lançarem uma edição comemorativa dos 30 anos de Dookie, o seu magnum opus, um dos discos punk mais importantes de sempre. A operação revivalista incluía maquetas de canções como She, F.O.D. e When I come around. Assim, em estado bruto, descarnadas, essas e outras pérolas reluziam com força, confirmando os Green Day dessa era como supremos melodistas. Nessa altura, apetecia pô-los ao lado dos Buzzcocks, dos Ramones, dos Descendents e dos Hüsker Dü na galeria dos grandes artífices pop do punk.

Nos anos mais recentes, sobretudo depois de American Idiot (2004), os Green Day tornaram-se outras coisas, poucas delas excitantes. Em Father of All Motherfuckers (2020), o antecessor de Saviors, viraram-se para o falsete, a vertigem rock’n’roll, as pianadas, o exibicionismo glam – a coisa andava “entre Prince e os MC5”, como disse o vocalista, guitarrista e compositor Billie Joe Armstrong, mas soava melhor no papel do que no disco. Os fãs dividiram-se: não era a primeira vez que a banda inventava fora do molde pop-punk, mas talvez nunca tivessem ido tão longe. Talvez em demasia.

Saviors será recebido como um “regresso à forma” e parece ter sido concebido com esse intento. A banda chamou Rob Cavallo, produtor de Dookie e American Idiot, os seus dois blockbusters. E o pop-punk clássico do grupo parece ecoar aqui e ali – em particular em 1981, velozes dois minutos que emulam essa banda de pós-adolescentes interessados em canábis e masturbação (problema insuperável: os três têm agora 51 anos), e Strange days are here to stay, que começa com guitarra palm muted e uma melodia adoçada, a lembrar meia dúzia de canções dos Green Day (“Strange days are here to stay/ Ever since Bowie died/ It hasn't been the same”).

É o trio a rever o seu próprio património, mesmo que nem sempre com sucesso. The American dream is killing me pisca o olho a American Idiot, mas dela a história dos Green Day não rezará. Suzie chapstick porta-se melhor, lembrando o álbum Warning (2000), com coros suaves, guitarras acústicas e eléctricas acariciando-se numa melodia impecável. Dilemma lida com as adições de Armstrong – “welcome to my problems”, avisa ele –, canalizando rock dos 50s para descarga pop-punk. Bobby Sox surpreende com o refrão urrante, Weezer via Jeff Rosenstock.

Noutros momentos, os punk rockers pousam o punk e ficam-se pelo rock. Living in the 20’s chama a electricidade pélvica dos Hives; One eyed bastard fará sorrir um fã de Arctic Monkeys. Nada disto é particularmente memorável, mas, pelo menos, não acarreta efeitos secundários. O mesmo não se pode dizer de Father to a son, uma balada xaroposa, Fancy sauce, rock tedioso, e outras canções soporíferas.

Saviors é talvez o melhor disco dos Green Day em muitos anos. Mas chegamos ao fim e queremos voltar a ouvir as maquetas de Dookie.

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