SOS Racismo condena inquérito do INE por não ter a fiabilidade dos Censos

Em vez de um inquérito obrigatório que chega a todas as casas, INE optou por um inquérito a cerca de 35 mil habitações, critica associação.

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INE tinha chumbado inclusão de pergunta sobre origem étnico-racial no Censos Matilde Fieschi
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A Associação SOS Racismo criticou nesta sexta-feira o inquérito do Instituto Nacional de Estatística (INE) para conhecer a origem ou etnia da população nacional, alertando que poderá "não espelhar a realidade", porque "não tem a fiabilidade de uma pergunta dos Censos".

Pela primeira vez, o INE levou a cabo um inquérito para conhecer a origem e pertença étnica da população adulta, assim como as suas ligações ao país e os casos de discriminação, o Inquérito às Condições de Vida, Origens e Trajectórias da População Residente em Portugal.

No entanto, a SOS Racismo lamentou "ter-se perdido a oportunidade" de usar o Censos de 2021 para conhecer a realidade de quem vive em Portugal e que, em vez de um inquérito obrigatório que chega a todas as casas, se tenha optado por um inquérito a cerca de 35 mil habitações.

Em declarações à Lusa, o activista José Falcão questionou a que "sítios foram" os técnicos do INE : "Foram ao Alentejo, às pensões onde os imigrantes vivem? Foram falar com as pessoas que vivem na periferia de Lisboa? Foram aos bairros da vertente sul de Odivelas? Isto não tem a fiabilidade de uma pergunta feita no Censos, que abarca toda a população."

O representante da SOS Racismo José Falcão deu o seu caso concreto: "No Censos vieram a minha casa e para este inquérito não apareceu ninguém, sendo que eu tenho pessoas racializadas a viver comigo."

Para José Falcão, o trabalho divulgado nesta sexta-feira "não espelha a realidade completa daquilo que o Estado português precisa de saber para poder avançar com políticas públicas".

O fundador da SOS Racismo lembrou o trabalho realizado durante um ano e meio, para que o Censos abordasse a questão, que acabou por ser recusado em 2019. "Desistiram do que poderia ser uma medida séria de perceber onde é que as pessoas estão e as suas condições. Isto foi bastante grave", criticou.

Questionado sobre os resultados do inquérito hoje divulgado, no qual a maioria dos inquiridos considerou existir discriminação em Portugal, José Falcão voltou a sublinhar que "não espelham a realidade completa".

Segundo o inquérito, mais de 1,2 milhões de pessoas (16,1%) já sofreram discriminação em Portugal, especialmente as ciganas (51,3%), as pessoas negras (44,2%) ou "com pertença mista" (40,4%).

Mas a discriminação também afectou desempregados (24,9%), os mais jovens (18,9%), pessoas escolarizadas (18,3%) e mulheres (17,5%), de acordo com as categorias estabelecidas pelo INE, que conclui que "mais de 4,9 milhões de pessoas (65,1%) consideram existir discriminação em Portugal e 2,7 milhões (35,9%) já testemunharam esse tipo de situações".

O grupo étnico, a cor da pele, a orientação sexual e o território de origem constituem "os factores mais relevantes" na discriminação percebida e testemunhada, segundo a mesma fonte.

O inquérito teve início em Janeiro para abordar, entre outras questões, a origem étnico-racial das pessoas que residem em Portugal há pelo menos 12 meses, e surge depois de o organismo ter decidido não incluir nos Censos 2021 uma pergunta sobre essa matéria, como pretendia a maioria dos membros do grupo de trabalho criado em 2019 pelo Governo para avaliar a questão.