Abanar presentes pode dar demasiado nas vistas sobre o que procura numa prenda

Será um ou dois objectos? E será grande ou pequeno? As dúvidas assolam quem pega num presente e o abana – e não são só miúdos. Quem está de fora, também percebe o que procuram os presenteados.

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Abanar as prendas é um ritual comum em muitas crianças durante o Natal Universidade Johns Hopkins
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A pressa de abrir as prendas é normalmente equilibrada com um pequeno momento de suspense: pega-se no presente e abana-se, à procura de pistas sobre o que está lá dentro. Mas o que queremos descobrir de antemão sobre a prenda? Afinal, é bastante simples de perceber. Basta observar e em alguns segundos pode descobrir se procuram o formato, se é mais do que um objecto ou se é algo pesado, por exemplo.

A pergunta era simples: apenas com a observação, pode alguém dizer o que é que outra pessoa está a tentar descobrir? A equipa de Sholei Croom, Hanbei Zhou e Chaz Firestone, investigadores da Universidade Johns Hopkins (Estados Unidos), dedicou-se a esta questão através de cinco experiências: filmaram voluntários a jogar a um jogo de física em que têm de determinar o número de objectos escondidos numa caixa e a sua forma. Os observadores tinham de perceber se a pessoa no vídeo estava a tentar decifrar a forma ou o número.

Na maioria dos casos, os 500 participantes (uma centena em cada uma das experiências) acertaram em cheio. A taxa de acerto varia entre os 63% e os 100%, sendo este último na primeira experiência, considerada mais “fácil” pelos investigadores que detalharam este trabalho na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.

O método para descobrir se estamos perante um ou vários presentes ou até se é um objecto grande ou pequeno pode ser visível através da forma como abanamos o presente, explica Sholei Croom, um dos autores do trabalho publicado no final de Novembro. “Pode ser uma diferença subtil, mas as pessoas são fantásticas a apanhar estas pequenas subtilezas”, diz, citado num comunicado enviado pela Universidade Johns Hopkins.

Os resultados acrescentam mais detalhes ao que conhecemos da cognição humana, esse grande espectro de domínios pessoais que envolve a aprendizagem, a atenção ou a percepção, por exemplo. Neste caso, o cerne é a aprendizagem. Mais do que sabermos que aquela criança está à procura de pistas sobre o presente, percebemos agora que conseguimos detectar pormenores que nos indicam do que essa criança está à procura.

“Ao olhar para o movimento do corpo de uma pessoa, conseguimos dizer o que ela está a tentar aprender sobre o ambiente”, refere Chaz Firestone. E, apesar de já se ter demonstrado que os “observadores” podem perceber os objectivos pragmáticos de alguém a partir do seu comportamento, nunca se tinha percebido que poderiam descobrir os objectivos epistémicos (ou seja, de aprendizagem sobre algo), indicam os investigadores no comunicado. O exemplo é simples: há uma diferença entre alguém pôr o pé na água da piscina porque vai mergulhar ou porque está a testar a temperatura da água – o primeiro é um objectivo pragmático, o segundo é epistémico.

O trabalho da equipa norte-americana mostra “aquilo que fazemos no dia-a-dia”, sintetiza o neurocientista Jorge Almeida, da Universidade de Coimbra, em declarações ao PÚBLICO. “Quando queremos cumprir uma intenção, vamos procurar no ambiente objectos que nos permitam realizar essa intenção através de uma acção.”

Ou seja, sublinha o investigador português, demonstra que somos capazes de compreender as acções de outra pessoa “sejam elas direccionadas a objectos ou com o intuito de provocar mudanças no ambiente, sejam elas comunicativas, sejam elas com o intuito de obter informação sobre o mundo para responder a questões (as tais acções epistémicas)”.

Há questões que ficam de fora desta análise e que o investigador português quer ver respondidas. Por exemplo: se esta capacidade é específica da acção epistémica ou se é global; ou se há pessoas com problemas em compreender estas acções e não outras, como acenos ou gestos para pedir boleia (e, também, o motivo para estas dificuldades).

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Os exemplos das pistas que descortinamos apenas com uma imagem DR

Esta “física do dia-a-dia”, como tem sido apelidado este campo de investigação dos processos cognitivos, é importante para desvendar como conseguimos captar estas subtilezas e depreender o que isso significa. “Por exemplo, quando olhamos para uma imagem [em que um computador está à beira da piscina], percebe-se imediatamente que o computador está em perigo”, ilustra Jorge Almeida. Ou, na imagem de mercearia, a retirada daquela lima alerta-nos por instinto para a derrocada que se seguirá. “Fazemos isto de forma quase automática, usando apenas uma imagem visual como estímulo.”

Ainda há muitas questões sobre a nossa curiosidade antecipada sobre os presentes, mas é caso para ficar atento durante este Natal ou, na verdade, em qualquer troca de prendas futura: será que há abanões e o que procuram os presenteados?

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