Brilhante Dias: “As ordens profissionais parecem emanações do Estado Novo e do Estado corporativo”

Sobre metadados, outro tema pendente no Parlamento, o líder do grupo parlamentar socialista acredita que, antes da dissolução, “há espaço para uma solução, que teria de ser bastante criativa”.

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Em entrevista ao programa Hora da Verdade, do PÚBLICO/Renascença, o deputado socialista Eurico Brilhante Dias defende que "as ordens não são sindicatos" e que "o PS deve confirmar", no Parlamento, as alterações aos estatutos vetadas pelo Presidente da República.

O Parlamento funciona até 15 de Janeiro. Mas até lá ainda há decisões e votações importantes. Como é que o PS vai decidir sobre os metadados após o chumbo do Tribunal Constitucional?
O TC considera que uma das alíneas não respeita o quadro constitucional. Aquilo que estamos a fazer é uma análise cuidadosa ao acórdão do TC. O diploma aprovado era um texto de substituição conjunto, em particular com o PSD, e se for possível isso deve levar-nos a uma reflexão que permita votar um novo texto, corrigindo, eventualmente, o texto que aprovámos no Parlamento.

Articulando com o PSD?
O texto era conjunto.

Essa articulação está a acontecer?
Ainda estamos a analisar o acórdão. Mas, metodologicamente, o que faz sentido é olhar para o assunto e perceber se ainda o podemos resolver até 15 de Janeiro. Aliás, o último dia de plenário será a 11 de Janeiro.

É possível ainda antes da dissolução?
Faríamos um esforço para poder perceber como o faríamos. Porque o país precisa. Agora, o problema não é português. Temos um problema de jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia que tem vindo a colocar questões importantes sobre a conservação de metadados e sobre o período de conservação das comunicações electrónicas.

Como é possível dar a volta ao veto?
Não é fácil. O mais fácil seria termos uma boa solução europeia, ou seja, uma rectificação que permitisse, dentro do arco do ordenamento jurídico europeu, alguma coisa que colmatasse ou desse resposta à jurisprudência do Tribunal de Justiça. Mas ainda acho que, dentro do quadro constitucional em Portugal, considerando o acórdão, há espaço para olharmos para uma solução, que teria de ser bastante criativa e inventiva, para resolver este problema.

E quanto às ordens profissionais, o PS vai confirmar as alterações aos estatutos que foram vetadas pelo Presidente da República?
Temos um conjunto de obrigações no quadro do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e dentro desse quadro uma das obrigações é a diminuição dos actos reservados, dos actos próprios, das profissões reguladas. Isso é uma obrigação e essa obrigação deve ser cumprida.

Além desse compromisso, há um compromisso político do PS. Não podemos continuar a ter um conjunto de actividades em que o acesso é de tal forma condicionado que é como se tivéssemos uma espécie de lei de condicionamento profissional. E isso não é possível, mata o acesso dos mais jovens às profissões. Mata a liberdade de escolha de muitos dos consumidores perante alternativas. Isso não é aceitável.

Significa que vão confirmar?
Isso é uma luta que o PS tem, que mantém. Não quero avançar decisões que só posso afirmar depois de uma reunião do grupo parlamentar, porque há uma democracia interna que gosto de respeitar. E, já agora, com o secretário-geral em funções. Não acho razoável que o PS chegue às eleições de 10 de Março sem resolver este problema.

A única forma de resolver até 10 de Março é confirmando, não há outra.
A sua conclusão é clara como a água. Por isso, a minha perspectiva, tendencialmente, é dizer que o PS deve confirmar na Assembleia da República. Foi um tema apressado? Sim, perante o quadro do PRR. Foi um tema pouco pensado? Não. Os diplomas saíram da AR iguais ao que foi proposto pelo Governo na proposta de lei? Não, o grupo parlamentar do PS, e os outros, deu contributos muitíssimo relevantes para melhorar.

Não significa que rectificações depois não possam ocorrer. Há mais vida depois de Março. Agora, as ordens profissionais têm-se constituído como órgãos que parecem emanações do Estado Novo e do Estado corporativo. E isso não é razoável. As ordens não são sindicatos. As ordens têm atribuições públicas de defesa do interesse geral e por isso é preciso ordens onde entre ar fresco, afastando essa ideia de um Estado corporativo.

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