Macron diz que Depardieu está a ser alvo de uma “caça ao homem”; Hollande responde

Declarações do Presidente francês parecem descredibilizar a posição da ministra da Cultura, Rima Abdul Malak. O seu antecessor, François Hollande, diz: “Não estamos orgulhosos de Gérard Depardieu”.

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Actor Gérard Depardieu no Festival de Cannes em 2014 Eric Gaillard/ reuters
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Esta quarta-feira, na sequência de uma nova acusação de violação contra o actor Gérard Depardieu, o Presidente francês, Emmanuel Macron, disse ao canal de televisão France 5 que não iria “participar numa caça ao homem”.

O comentário veio em resposta à possibilidade de ser retirada a insígnia da Legião de Honra atribuída pelo Estado francês a Depardieu em 1996, questão colocada em cima da mesa pela ministra da Cultura, Rima Abdul Malak. Em declarações à France 5 no dia 15 de Dezembro, a ministra disse que se iria iniciar um processo disciplinar para decidir sobre a eventual suspensão ou retirada da distinção a Depardieu.

Agora, Macron parece desdizer, ou pelo menos descredibilizar, a tomada de posição de um membro do seu governo. “Às vezes há explosões por causa de comentários. Estou cauteloso com o contexto”, afirmou. “A Legião de Honra é uma Ordem da qual sou grão-mestre, que não existe para pregar moralidade. E, portanto, não é com base num relatório, ou isto ou aquilo, que tiramos a Legião de Honra a um artista, porque a esse preço teríamos tirado a Legião de Honra a muitos outros.”

O Presidente francês acrescentou ainda que Gérard Depardieu – acusado de assédio e violência sexual por 13 mulheres desde 2018 – “deixa a França orgulhosa” e que é “um grande admirador” daquele que considera ser “um actor enorme”. Disse ainda recear que a França se esteja a afundar “na era da suspeita”. “Pode acusar-se alguém, pode haver vítimas, mas também existe uma presunção de inocência”.

As reacções às declarações de Emmanuel Macron no meio da política francesa não demoraram a chegar. O seu antecessor, François Hollande, disse à rádio France Inter: “Não, não estamos orgulhosos de Gérard Depardieu”. Prefere falar “sobre as mulheres humilhadas e atacadas, sobre as mulheres que ficaram chateadas com as imagens que viram, sobre as mulheres que, através de Gérard Depardieu, vêem o que pode ser a violência, a dominação, o desprezo”. Era um discurso semelhante que Hollande “esperava” ter ouvido de Macron, assinalou, ao invés de este ter tecido elogios ao célebre actor francês.

Há duas semanas, veio a público uma nova acusação de assédio sexual contra Depardieu, pela actriz Hélène Darras, que diz ter sido assediada repetidamente durante a rodagem do filme Disco (2017). Pela mesma altura, o canal de televisão pública France 2 passou a reportagem Gérard Depardieu: La Chute de L’Ogre ("Gérard Depardieu: A Queda do Ogre", numa tradução livre), onde eram ouvidos testemunhos de assédio e se mostravam imagens, registadas a propósito de um documentário sobre a participação do actor nas comemorações dos 70 anos do regime norte-coreano, em que é visto a fazer comentários obscenos sobre mulheres, a assediar uma tradutora e a sexualizar uma criança.

Olivier Faure, dirigente do Partido Socialista francês, acusou Emmanuel Macron de trair na prática aquilo que propõe na teoria, dado a violência contra mulheres ser “uma das principais bandeiras” do actual mandato do presidente. “As palavras de Macron sobre o tema Depardieu são mais uma vez um insulto ao movimento pela liberdade de expressão das vítimas de violência sexual”, disse, por sua vez, a deputada ambientalista Sandrine Rousseau nas suas redes sociais.

“Não consigo fazer um tweet que seja suficiente para dizer o quão isto é ultrajante, anacrónico e abjecto para as vítimas”, afirmou também Anne-Cécile Mailfert, presidente da Fundação da Mulher, citada pelo jornal francês Le Figaro.

Na passada quinta-feira, o Museu Grévin, em Paris, retirou da sua exposição permanente a estátua de cera em tamanho real do actor, ali instalada em 1981. Segundo os responsáveis do museu, os visitantes tinham reacções negativas quando se deparavam com a estátua, além de se terem manifestado com críticas nas redes sociais.

Pela mesma altura, foi retirado a Depardieu o título de cavaleiro da Ordem Nacional do Quebeque, que lhe havia sido atribuído em 2002 pela sua contribuição para o cinema de expressão francesa. Foi também destituído do título de cidadão honorário de Estaimpuis, na Bélgica.

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