Pedida patente para terapia de precisão do cancro da mama metastático
Como flechas, agentes anticancerígenos inteligentes atuam com precisão somente no alvo, as células cancerosas, de forma a erradicar o tumor primário e as metástases com o menor impacto para o doente.
Encontrar um medicamento que cure o cancro é um dos maiores desafios do nosso século. Somente em 2022 esta doença provocou mais de dez milhões de mortes em todo o mundo e teve um custo de 1200 milhões de euros para os serviços de saúde. Apesar dos contínuos esforços no diagnóstico precoce e no desenvolvimento de terapias que prolongam a vida dos doentes, quando o cancro se espalha para o resto do corpo, formando metástases, os doentes acabam por falecer.
Mais de 60% das mortes por cancro são provocadas por metástases e, no cancro da mama, este número ascende aos 95%. Os medicamentos atuais não são capazes de prevenir nem atuar eficazmente nas metástases de cancro da mama e provocam efeitos adversos graves, porque também atuam nos órgãos saudáveis.
Para responder a esta necessidade, no meu doutoramento estamos a desenvolver uma nova abordagem terapêutica que atua no tumor mamário e nas metástases, sem afetar o resto do corpo humano. Esta abordagem baseia-se na utilização de um sistema inteligente que reconhece as pequenas diferenças existentes entre as células do cancro da mama e as células saudáveis, de modo a entregar um metalofármaco de ruténio apenas no local de ação.
Concretamente, são duas as diferenças que permitem que o sistema reconheça e seja ativado apenas nas células de cancro. A primeira é a existência de uma proteína designada por “recetor do fator de crescimento fibroblástico” (FGFR) em maior quantidade na superfície das células de cancro da mama do que nas células saudáveis. A segunda é o facto de o tecido tumoral possuir um pH mais ácido do que os tecidos saudáveis e a corrente sanguínea.
Novos metalofármacos para o cancro da mama
Tendo em consideração estas diferenças, os sistemas são constituídos por três unidades: um metalofármaco de ruténio que elimina o tumor e previne o aparecimento das metástases; um péptido que reconhece a proteína FGFR e conduz o metalofármaco até às células de cancro; e uma unidade que responde ao pH ácido do tumor e permite a ativação controlada do metalofármaco somente no alvo. Deste modo, estes sistemas são pró-fármacos inertes que não causam dano ao organismo humano quando são administrados, mas após a sua ativação controlada no tumor e nas metástases erradicam o cancro sem afetar nenhum tecido saudável.
Já conseguimos desenvolver um metalofármaco de ruténio muito promissor. Em modelos in vitro de cancro da mama metastático, este metalofármaco atuou preferencialmente sobre as células cancerosas que possuem a proteína FGFR, poupando as células saudáveis, como resposta a uma distribuição e ativação seletiva. No entanto, são necessários mais estudos para validar esta abordagem terapêutica. Assim, a próxima etapa envolve estudos in vivo em modelos animais.
Este trabalho insere-se no Projeto Arrows2Cancer, coordenado por Tânia Morais, e serviu de base à submissão de uma patente internacional. Esperamos que este seja o primeiro passo para a obtenção de um novo medicamento que dê uma luz de esperança aos doentes com cancro da mama metastático.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
Farmacêutico, estudante de doutoramento em Química na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa