Por que têm os líderes da UE de defender o alargamento da UE

A UE é a única hipótese da Ucrânia. Se esta oportunidade for perdida, a UE terá não só a responsabilidade, mas também o ónus de lidar com o enorme impacto geopolítico deste fracasso.

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A próxima reunião do Conselho Europeu poderá ser a mais importante da história recente do bloco e é o momento em que se realiza que a torna tão crucial. A contra-ofensiva ucraniana estagnou. Pela primeira vez desde o início da guerra, está a enraizar-se a sensação de que a Rússia pode estar a ganhar. Por outro lado, a determinação do Ocidente em apoiar a Ucrânia, que fora muito aplaudida, está a esmorecer. Os Balcãs Ocidentais estão a ferver. E, nos Estados Unidos, as eleições presidenciais do próximo ano não se afiguram como bom presságio para a Europa.

Para os líderes da UE, que se encontrarão em Bruxelas no final desta semana, existe pressão para abrir negociações de adesão à UE com a Ucrânia e a Moldova, bem como acordar um pacote de 50 mil milhões de euros de ajuda financeira a Kiev – seria, pois, bom que não subestimassem a seriedade destas duas decisões. É essencial que se envie uma mensagem robusta a Putin de que as esperanças que este tem de inverter o rumo da guerra a seu favor são manifestamente prematuras. Os líderes não devem deixar dúvidas quanto à posição da Europa relativamente à Ucrânia nem quanto ao facto de a UE estar empenhada em trazer o país para o bloco europeu. Além disso, de um modo mais geral, devem transmitir aos europeus a razão pela qual os esforços de integração da Ucrânia e de outros países constituem o investimento certo para o futuro da União Europeia.

Mais do que nunca, é necessária uma acção decisiva. Como mostra uma nova sondagem de opinião levada a cabo pelo European Council on Foreign Relations (ECFR) em seis Estados-membros da UE (Alemanha, França, Dinamarca, Polónia, Roménia e Áustria), um grande número de cidadãos europeus acredita que a adesão da Ucrânia ao bloco prejudicaria (45%, em média), em vez de reforçar (25%), a segurança da Europa. Quando questionados sobre o impacto no seu próprio país, apenas 15% dos franceses e 20% dos alemães esperam que essa medida seja positiva para a segurança do seu país (39% e 47%, respectivamente, acreditam que o resultado será negativo). Apenas na Polónia há uma clara prevalência de opinião positiva a este respeito (41% contra 30%).

No que diz respeito aos países dos Balcãs Ocidentais, as opiniões são igualmente sombrias, com poucos europeus a considerarem que uma possível adesão destes trará benefícios para a segurança da UE (23% contra 33% que pensam o contrário). Estes resultados são preocupantes – e são um aviso. Os políticos europeus reafirmam continuamente que o alargamento da UE é necessário por razões geopolíticas. No entanto, ainda não conseguiram convencer as sociedades europeias a apoiar este ponto de vista. A preocupação de que a inclusão de novos membros possa arrastar a UE para conflitos parece ser maior do que a convicção de que a sua adesão protegeria a Europa das influências russas ou chinesas.

Ainda assim, o debate continua em aberto. Uma percentagem significativa (37%, em média) dos cidadãos dos seis países inquiridos pelo ECFR acredita que a Ucrânia deve poder aderir à UE – e esta visão é frequentemente corroborada por pessoas que estão conscientes das consequências negativas desse acontecimento. Parece que o apoio emocional aos ucranianos continua a ser forte e ultrapassa as considerações racionais. No entanto, o entusiasmo em relação aos países dos Balcãs Ocidentais é menor. Apenas entre 20 a 30% dos europeus gostariam de os ver como futuros membros do bloco. As diferenças de atitude que se fazem sentir em diferentes países da UE são significativas. Na Dinamarca e na Polónia, cerca de metade da população (50 e 47%, respectivamente) apoia a adesão da Ucrânia. Na Áustria, apenas 28% são a favor, enquanto 52% são contra. Mas, na maioria dos países, 20 a 40% dos inquiridos não têm opinião ou são indiferentes à perspectiva da adesão da Ucrânia, bem como do alargamento em geral. Isto sugere que existe um grande número de europeus que ainda podem ser convencidos de que o seu próprio futuro depende – mais do que nunca – da determinação da UE em utilizar o seu principal trunfo: a integração dos seus vizinhos europeus na esfera da paz e da prosperidade económica.

A urgência de dar passos significativos em direcção a este objectivo não podia ser mais óbvia. Se a Ucrânia perder não só uma parte do seu território, mas também a crença na credibilidade da oferta da UE, haverá consequências dramáticas para a Europa. Para se tornar um país estável e previsível, a Ucrânia precisa de ganhar a guerra. Mas o que poderá medir, acima de tudo, a sua vitória não será tanto o restabelecimento do controlo total do seu território, mas sim a conquista do controlo do seu futuro como país europeu, próspero e democrático. A UE é a única hipótese da Ucrânia. Se esta oportunidade for perdida, a UE terá não só a responsabilidade, mas também o ónus de lidar com o enorme impacto geopolítico deste fracasso. O mesmo se aplica aos Balcãs Ocidentais. Talvez este seja o último momento para impedir que estes países se desviem para as órbitas russa ou chinesa.

Nem a opinião pública europeia nem muitos dos próprios líderes da UE parecem compreender plenamente a gravidade desta situação. Parecem acreditar que a manutenção do status quo é possível e que o debate sobre a reforma institucional constitui a resposta adequada aos desafios geopolíticos. Esta percepção é errada e perigosa. Na cimeira desta semana, é imperativo que os líderes não se coíbam de utilizar uma linguagem alarmista e de tomar decisões difíceis. Devem abrir negociações com a Ucrânia e a Moldova, comprometer-se com o apoio militar necessário para 2024 e declarar que a UE preparará o próximo orçamento comunitário tendo em vista o alargamento. Devem também acordar que os litígios bilaterais entre os Estados-membros da UE e os países candidatos serão tratados fora do quadro da política de alargamento. Essa medida ajudaria a garantir que, até 2028, os países candidatos que tenham cumprido os critérios exigidos pela UE e aceitado uma forte condicionalidade relativa ao Estado de direito usufruam, no mínimo, dos benefícios financeiros e económicos da integração.

Não há outra forma de sublinhar o compromisso da UE no alargamento como uma opção geopolítica fundamental senão adoptando uma abordagem corajosa, que assuma compromissos claros para com a Ucrânia e com outros países candidatos. Do mesmo modo, também é necessária uma mensagem clara para os cidadãos da actual UE-27 e para os muitos que ainda não estão convencidos da necessidade do alargamento. Estes têm de compreender que a sua própria segurança e estabilidade estão em risco. As elites políticas não ganharão esta batalha com discursos inócuos que apelem à razão ou à emoção – precisam é de dar o exemplo com acções concretas.

Piotr Buras é director do gabinete do European Council on Foreign Relations (ECFR); Engjellushe Morina é investigadora principal do ECFR

Tradução de Nelson Filipe

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