CoLAB Vines&Wines salta as fronteiras do Douro e abre primeiro pólo no Dão

A ADVID / CoLAB Vines&Wines, de âmbito nacional mas desde sempre sediada em Vila Real, foi desafiada a pensar e a executar uma “agenda de investigação e desenvolvimento” no Dão. Pólo fica em Nelas.

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O novo Pólo do CoLAB Vines&Wines e o Pólo de Inovação de Nelas estão a funcionar no mesmo local e a trabalhar em conjunto para dar resposta aos desafios da região vitivinícola Nelson Garrido

“A Associação para o Desenvolvimento de Viticultura Duriense​ (ADVID) inaugurou, na última Primavera, um pólo do CoLAB Vines&Wines em Nelas, que começou por auscultar a região para definir necessidades e já segue um plano de actividades desenhado à medida. O novo Pólo do CoLAB Vines&Wines no Dão tem para já apenas uma investigadora directamente alocada, mas a equipa abrange investigadores de entidades parceiras e crescerá em breve.

O pólo é uma parceria com a Comissão Vitivinícola Regional (CVR) do Dão, o Instituto Politécnico de Viseu e a Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Centro (DRAP Centro). E acontece naturalmente na vida de uma associação técnica que, estando sediada em Vila Real, há muito que tem âmbito nacional. Com mais de 40 anos de experiência, a ADVID tem associados noutras regiões, nomeadamente no Alentejo, no Dão e nos Vinhos Verdes — em grande parte, fruto de algumas empresas produtoras do Douro terem expandido as suas operações a outros terroirs —, e ​em 2018 foi reconhecida como laboratório colaborativo da vinha e do vinho, precisamente pelo seu âmbito nacional e pelo seu papel na promoção e transferência de conhecimento.

O novo pólo funciona a partir do Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão (CEVD), onde em 2023 nasceu também o Pólo de Inovação de Nelas, um dos 24 (cinco no sector do vinho) que o Governo se propôs criar em 2020 quando apresentou a Rede de Inovação. Sendo distintos, os dois pólos partilharão recursos e trabalharão em conjunto para “criar uma rede que permita responder aos desafios da região”, que, de resto, “estão em linha com a actividade do CoLAB”, explicou ao Terroir o director-geral da ADVID.

Luís Marcos sublinha que a implementação do novo pólo só foi possível por existir “uma parceria com actores locais”, fruto de um protocolo assinado faz este mês um ano e que ditou a criação de um conselho de coordenação com representantes das quatro entidades parceiras e que está responsável pela sua agenda de actividades.

Ana Rodrigues, a investigadora sénior do novo pólo e representante da ADVID / CoLAB Vines & Wines, explica que o plano está focado em três áreas e exige “um trabalho extremamente focado”: primeiro, “investigação e desenvolvimento puro e duro, que depois tem de se passar para o sector”; segundo, o desenvolvimento de “serviços baseados em ciência”; terceiro, “capacitação das empresas — pôr as empresas a falar umas com as outras, sobre as melhores práticas, quer em viticultura, quer em enologia”.

Na área de investigação e desenvolvimento (I&D), os diversos actores auscultados nos últimos meses no Dão mostraram vontade de ter uma “caracterização da região numa vertente mais agronómica, portanto ao nível de clima, solo, biodiversidade”, ou seja, “mais focada na produção de uva”, e uma “segunda caracterização mais relacionada com o perfil de vinhos da região”, explicou ao Terroir a investigadora, química aplicada de formação e doutorada em engenharia alimentar, na área de enologia.

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A "caracterização do perfil de vinhos da região” é um dos objectivos de novo Pólo do CoLAB Vines & Wines no Dão Nelson Garrido

Ainda no que respeita a I&D, são também desafios a “adaptação da viticultura às alterações climáticas” e “um levantamento do que é a história e o património da região” (de forma a ajudar os produtores a promoverem não só os seus vinhos, mas também outras actividades em torno deles no Dão).

Gerir a água e pôr a região a falar

Os “tais serviços assentes em ciência”, continua Ana Rodrigues, passarão muito por oferecer “formações específica para o sector”; abrir o laboratório do pólo em Nelas a pedidos de “análises físico-químicas” por parte das empresas; dar “apoio em sustentabilidade — ainda há muito trabalho a fazer” na região — e “na experimentação, quer na vinha, quer na adega”; informar “sobre fenologia e desenvolvimento de doenças e pragas”; e apoiar projectos de instalação de rega na vinha.

Sobre este último desafio, explica: “Temos noção de que há produções que num futuro próximo, mais próximo do que gostaríamos, vão precisar de regar. Mas gosto mais de falar de gestão de água do que de rega, falamos de projectos de gestão de água. Nesta fase, o que é preciso é medir e caracterizar a região”.

“A área da capacitação é uma área diferente”, explica Ana Rodrigues, que vem precisamente do ‘outro lado’ (trabalhou durante vários anos na Global Wines). “O nosso objectivo é trabalhar em duas frentes: uma mais informal, em que queremos promover reuniões a que chamamos tertúlias, para pôr os produtores a falar uns com os outros, e outra, a parte da divulgação do estado da arte da tecnologia que já existe ao nível da mecanização e agricultura de precisão.”

O horizonte do “ambicioso” plano de actividades do Pólo do Dão do CoLAB Vines&Wines é “Dezembro de 2025”, partilha a investigadora, que ressalva contudo que “há projectos que já estão a acontecer [promovidos e coordenados pelas entidades que agora se unem no novo pólo], e que arrancaram ainda antes da implementação do pólo”.

“As áreas dos serviços e da capacitação só vão arrancar agora, mas na parte de I&D já há três projectos que vão ao encontro das linhas que queremos abordar. Dois destes projectos estão assentes na DRCP Centro — o ​Wine4Cast e outro, que se chama Recursos Genéticos, e que procura fazer prospecção de castas na região, cruzando [isso] com o trabalho da Porvid [Associação Portuguesa para a Diversidade da Videira]. O BioGrape Sustain, cujo objectivo é caracterizar castas autóctones do Dão, dez brancas e dez tintas, é do Politécnico [de Viseu] e da CVR do Dão.” Três projectos com entidades promotoras diferentes, mas que estão a ser desenvolvidos pelos recursos dos dois pólos sediados no CEVD, em sinergia.

Em 2024, para além chegar mais um elemento ao pólo do CoLAB (a ADVID já abriu concurso para contratar mais um investigador), arrancarão os projectos Retina, com financiamento do Horizonte Europa e cujo objectivo é “desenvolver tecnologia baseada na fotónica para detectar doenças do lenho e ajudar na gestão hídrica da vinha”, e Fileira, este para ajudar “a caracterizar a região”, melhorar a “monitorização de parcelas de referência de Touriga Nacional e Encruzado” e contribuir para a “avaliação de perfis de vinho do Dão”.

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O Centro de Estudos Vitícolas do Dão alberga agora, numa lógica colaborativa, não um mas dois pólos de investigação em torno da vinha e do vinho; na fotografia (de arquivo) Vanda Pedroso, técnica em Nelas há mais de 40 anos e uma das coordenadoras do plano de actividades do novo pólo Anna Costa

A necessidade aguça o engenho

Contactado pelo PÚBLICO, o presidente da CVR do Dão explicou o desafio que esta entidade estendeu ao CoLAB. Lembrando que “o Ministério da Agricultura já teve uma fabulosa rede de centros de experimentação”, em diversos domínios, incluindo o vinho, Arlindo Cunha notou que muitos desses pólos fecharam e outros “ficaram muito debilitados”. “O do Dão [o CEVD] só conseguiu sobreviver porque começou a fazer um programa de trabalhos conjuntos com o Politécnico e a Escola Superior Agrária de Viseu. Muitos dos trabalhos que foram ali feitos foi no âmbito de mestrados do Politécnico.” E, já agora, orientados pela investigadora Vanda Pedroso, técnica há mais de 40 anos naquele centro-escola e uma das coordenadoras da actividade do novo pólo. Assim como Pedro Rodrigues, investigador do Politécnico de Viseu e colaborador há já vários anos do CEVD.

Como, para a rede de pólos de inovação, a Terra Futura (a agenda de inovação para a agricultura, criada no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência português) financia “essencialmente a reabilitação de instalações”, o Dão sentiu necessidade de “conseguir aceder aos vários projectos de investigação”, justifica Arlindo Cunha. “Através do CoLAB”, isso fica resolvido.

“Somos a entidade responsável pelo interface e pela transferência de conhecimento. [Na prática] o nosso objectivo é desenvolver actividades de experimentação, desenvolvimento e transferência de conhecimento, em estreita colaboração com estes parceiros, com os vitivinicultores e com as empresas ligadas ao sector do vinho”, resume Luís Marcos, deixando no ar a possibilidade de abertura de outros pólos no futuro. “Encaramos isto como um piloto, como uma reorganização da estrutura do CoLAB que permita dar resposta a problemas de outras regiões que não aquela onde está.”

Artigo corrigido no dia 6/12/2023, às 15h15: a coordenação do plano de actividades do Pólo do CoLAB Vines & Wines no Dão é partilhada por representantes das quatro entidades que se juntaram para o criar.

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