Funcionamento da administração da Anacom “não é adequado”, diz candidata a reguladora
Sandra Maximiano reconhece “insatisfação” dos trabalhadores da Anacom, quer instituir pelouros e responsabilização dos administradores e “restabelecer confiança” que o Governo perdeu na entidade.
A economista Sandra Maximiano, escolhida pelo Governo para presidir à Anacom, diz estar “consciente” da “insatisfação” e “fragmentação” de que se queixam os trabalhadores da entidade reguladora e afirma que o funcionamento do actual conselho de administração presidido por João Cadete de Matos não é ideal.
A professora do ISEG, que foi ouvida nesta quinta-feira na comissão parlamentar de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação (CEOPPH), foi questionada pelo deputado do PSD Paulo Moniz (que será o autor do relatório desta audição) sobre a “relação hierárquica histórica” entre três membros do actual conselho e disse estar “consciente de que isso prejudica a colegialidade do órgão”.
Paulo Moniz referia-se ao facto de estarem na administração da Anacom dois vogais – Patrícia Gonçalves e João Miguel Coelho – que desempenharam ao longo da sua carreira funções sob chefia de Cadete de Matos, no Banco de Portugal e na Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO). O deputado considerou que esta “relação hierárquica histórica” enviesa a tomada de decisões.
“Contra factos, não há argumentos”, sublinhou a economista, que na sua intervenção inicial defendeu um conselho de administração “a funcionar em pleno e de forma colegial, com distribuição de pelouros [que deixaram de existir no mandato de Cadete de Matos]”, para existir “responsabilização” dos administradores.
Defendendo que na administração deve haver complementaridade de valências em três áreas específicas – economia, engenharia e direito –, Sandra Maximiano frisou que “o único requisito” que colocou para aceitar o convite do Governo foi que houvesse no conselho “alguém com capacidade jurídica”. Tal como está, “não acho que [o conselho] tenha um funcionamento adequado”, afirmou, em resposta a Paulo Moniz.
Acrescentou ainda que os referidos administradores, que continuarão nos cargos após a saída de Cadete de Matos, “vão estar conscientes de uma nova liderança e vão interagir de uma forma diferente”.
Além de Patrícia Gonçalves e João Miguel Coelho (que termina o mandato em Dezembro), a administração da Anacom conta ainda com Manuel Cabugueira, mantendo-se um lugar por preencher.
Sublinhando a necessidade de se criarem indicadores de avaliação do impacto regulatório nas várias actividades da Anacom, a economista também admitiu desconfiar de todas as informações sobre os preços das telecomunicações que são divulgados e defendeu um “estudo sério” sobre o assunto. “Se estamos numa situação de grande crispação e litigância”, o que há é “criação de desinformação dos dois lados”.
“Se um lado quer mostrar que temos os preços mais altos da Europa”, o outro lado terá o objectivo contrário, mas “os consumidores não sabem efectivamente o que estão a pagar”, sublinhou a economista.
Confiança e diálogo
Sandra Maximiano defendeu que “é preciso mais diálogo com os operadores” e que isso não significa perder independência em relação às empresas. E em resposta ao deputado do Chega, Filipe Melo, que elogiou o currículo da economista, mas que se escusou a fazer perguntas na audição por considerar que neste contexto o Governo já não devia fazer nomeações, a candidata a reguladora disse acreditar “profundamente que o cargo [de presidente da Anacom] tem de ser realmente dado a uma pessoa independente”. “Se estou aqui hoje, é porque me considero uma pessoa independente”, acrescentou.
Questionada igualmente sobre a retirada de funções da esfera da entidade reguladora, como a definição dos indicadores de qualidade de serviço dos CTT na prestação do serviço universal (cuja decisão passou a caber ao Governo, embora sob proposta da Anacom), Sandra Maximiano disse que nos casos em que se retiram competências pela “criação de desconfianças por decisões tomadas de forma não fundamentada”, isso é na prática “uma avaliação negativa” da actividade regulatória e que “a única coisa” que pode fazer, “é restabelecer confiança”.
A professora do ISEG quer mudar a relação entre regulador e regulados (há “um comportamento extremado de quase irracionalidade de ambas as partes”) e também dá prioridade à “situação de fragmentação” na Anacom, “onde há uma grande diversidade de colaboradores”, com idades e expectativas profissionais diferentes, dizendo que o “cerne da questão passa por dialogar e explicar os caminhos seguidos”.
O relatório sobre a audição de Sandra Maximiano (que não é vinculativo, mas é obrigatório por lei) será votado na próxima quinta-feira, numa reunião a realizar pelas 14h, segundo indicou o presidente da (CEOPPH), Afonso Oliveira.