Comissão Europeia critica carácter expansionista do Orçamento do Estado para 2024

Bruxelas está satisfeita com o “ponto de partida” de Portugal em termos orçamentais, mas pede maior prudência.

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António Costa, Fernando Medina e Mariana Vieira da Silva no debate orçamental, no Parlamento Nuno Ferreira Santos
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A Comissão Europeia deixa críticas ao carácter expansionista da proposta de Orçamento do Estado para 2024, que não está em linha com as recomendações de Bruxelas para uma política orçamental mais prudente com a retirada das medidas de apoio no sector da energia e um maior foco na eficiência da despesa pública e na absorção dos fundos comunitários e do Plano de Recuperação e Resiliência.

Mas não há só críticas na avaliação das contas públicas de Portugal, que em 2024 deverá alcançar o objectivo de médio prazo para o saldo orçamental estrutural exigido por Bruxelas, graças ao excedente de 0,8% previsto para este ano e aos esforços de consolidação dos últimos últimos exercícios, que resultaram numa descida significativa do nível da dívida pública.

“O ponto de partida de Portugal em termos orçamentais é positivo”, assinalou uma fonte da Comissão Europeia, antes da divulgação das recomendações de política orçamental e da avaliação dos projectos de orçamento dos Estados-membros da União Europeia, no âmbito do pacote de Outono do Semestre Europeu.

Numa conferência de imprensa no Parlamento Europeu de Estrasburgo, o vice-presidente executivo da Comissão Europeia, Valdis Dombrosvkis, destacou o facto de o país cumprir o objectivo de médio prazo em 2024, de acordo com as previsões de Bruxelas. “Essa é uma mensagem positiva que convém sublinhar”, observou.

Dombrovskis também assinalou o compromisso de Portugal em “preservar o investimento financiado a nível nacional em 2024”, e em prosseguir os investimentos e reformas definidos no Plano de Recuperação e Resiliência. Trata-se de projectos que vão “impulsionar o crescimento a longo prazo, a produtividade e competitividade da economia, e também a coesão social”, considerou.

Ainda assim, a opinião da Comissão relativamente ao projecto orçamental apresentado pelo Governo é que “não está totalmente em linha com as recomendações”, por ainda estarem previstas medidas de apoio no sector da energia. “O plano [de Portugal] não está em linha porque as medidas de emergência no sector da energia só serão parcialmente retiradas”, justificou Valdis Dombrovskis.

“A nossa estimativa é que essas medidas representaram 1,3% do PIB em 2023, e apesar de caírem para 0,7% do PIB em 2024, não vão ser retiradas e poderão continuar em 2025”, referiu um responsável da Comissão, esclarecendo que, por isso, Portugal vai contra a recomendação de retirada dos apoios extraordinários, e do uso da poupança relacionada para a consolidação orçamental.

Segundo explicou Dombrovskis, a recomendação de prudência orçamental, e a “orientação globalmente restritiva para os países da zona euro”, resultam da necessidade de “baixar a inflação, melhorar a sustentabilidade da dívida pública e reconstituir os amortecedores após as despesas públicas de grande escala durante a pandemia e a crise energética”.

Com a desactivação do travão da cláusula geral de escape, e a retoma da aplicação das regras de disciplina orçamental, Portugal será novamente alvo de revisão aprofundada no âmbito do mecanismo de alerta por desequilíbrios excessivos macroeconómicos (excessivos), apesar da expectativa do Governo de conseguir trazer o valor da dívida para baixo da barreira dos 100% do PIB.

Na mesma conferência de imprensa em Estrasburgo, o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni, classificou a redução da dívida pública portuguesa como “um factor muito positivo” em termos da “avaliação das dinâmicas estruturais” feita por Bruxelas. O italiano voltou a apontar a ligeira divergência entre Bruxelas e Lisboa quanto à data em que a barreira dos 100% vai finalmente ser vencida — “se será já em 2024 ou só em 2025” —, mas salientou a “tendência muito positiva” de diminuição do endividamento.

Além de Portugal, a Comissão vai preparar análises aprofundadas aos desequilíbrios macroeconómicos da Alemanha, Chipre, Grécia, França, Hungria, Itália, Países Baixos, Roménia, Espanha e Suécia, no ciclo de 2023-2024 do Semestre Europeu.

Ao contrário de nove países da zona euro — Bélgica, Espanha, França, Itália, Letónia, Malta, Eslovénia, Eslováquia e Finlândia —, o défice das contas públicas portuguesas deverá manter-se abaixo do limite dos 3% do Produto Interno Bruto, no próximo ano.

Nesta terça-feira, Valdis Dombrovskis confirmou que “a Comissão recomendará ao Conselho da UE a abertura de procedimentos por défice excessivo na Primavera de 2024”.

Mercado laboral resiliente, mas com problemas

Pela primeira vez, a apresentação das prioridades políticas da Comissão Europeia no quadro do Semestre Europeu foi acompanhada de uma proposta de Relatório Conjunto sobre o Emprego, onde se comprova a resiliência do mercado laboral na UE, mas também os desafios com que se deparam trabalhadores e empregadores.

O comissário do Emprego e Direitos Sociais, Nicolas Schmit, chamou a atenção para a taxa de emprego da UE, que está actualmente nos 75,4% (cerca de 270 milhões de pessoas empregadas), ou seja, “no bom caminho para atingir a meta de 78%” que os Estados-membros estabeleceram para 2030. A taxa de desemprego de 6% “é uma das mais baixas de sempre”, assinalou o luxemburguês, que não escondeu alguma preocupação com a persistência de alguns fenómenos que sobressaem na análise mais fina dos números: a grande percentagem de trabalhadores com baixas qualificações, as disparidades de género e a categoria de jovens que não estudam nem trabalham.

Em termos de salários, o comissário lembrou que apesar da recomendação de Bruxelas aos Estados-membros ser de “continuar a apoiar a valorização salarial para mitigar a perda do poder de compra” dos trabalhadores, os salários reais não acompanharam o aumento da inflação, tendo caído 3,7% no ano passado. E a previsão é que em 2024 apenas recuperem 1,6% — para Nicolas Schmit, os baixos salários continuam a constituir um problema, que contribui para o insucesso dos esforços da UE para cumprir a meta de retirar 15 milhões de pessoas do risco de pobreza e exclusão social até ao fim da década.

Outra dificuldade identificada no relatório diz respeito à escassez de mão-de-obra, que se sente de forma mais aguda em alguns dos sectores de actividade considerados chave para a dupla transição verde e digital. “A falta de mão-de-obra duplicou desde 2016, e há dificuldades sérias de recrutamento em diversas áreas”, afirmou Schmit. Nesse aspecto, o relatório menciona dois desafios: a capacidade para atrair talento de fora da UE, e a melhoria das condições de trabalho.

Na conferência de imprensa, em Estrasburgo, Nicolas Schmit ainda referiu outro: a baixa taxa de trabalhadores abrangidos por acções de formação ou requalificação profissional. A meta anual de 60% da força de trabalho, em 2030, está muito distante. “E é um imperativo, porque este é um problema que está a afectar a competitividade da Europa e a capacidade de investimento das empresas”, vincou o comissário.

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