Susana Esteban criou um clube a partir de uma vinha velha de Portalegre

Um clube de vinhos raros aumenta a literacia vínica dos seus sócios. Não praticamos muito esse exercício, mas a enóloga galega acha que é tempo de mudar as coisas.

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A enóloga Susana Esteban e o amigo António Menano criaram o clube Alegrete 1375, para oferecer e gerir aquilo que é raro, escasso e inimitável Fabrice Demoulin / Direitos Reservados
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Os produtores portugueses gostam de copiar tendências estrangeiras (já o Eça dizia que a modernidade chegava de Paris e de comboio), mas há uma que teima em pegar por cá: o conceito de clube de vinho. Atenção, não falamos desse clube de vinho assente na lógica dos descontos para os sócios, que isso é o que mais há por aí, mas um clube que nasça para oferecer e gerir aquilo que é raro, escasso e inimitável. E que, de caminho, faça com que os sócios se sintam uns tipos finórios e privilegiados. Nos EUA — que chegaram ontem ao mundo do vinho — há clubes destes com fartura, mas, por cá, contam-se pelos dedos de uma mão.

Conhecedora do microcosmo vitícola que é Portalegre, a enóloga Susana Esteban e o amigo António Menano pegaram num hectare de vinha bastante velha, abandonada, com castas conhecidas e outras nem tanto e fizeram 1.375 garrafas de branco e 1.375 garrafas de tinto, que serão vendidas a quem se inscrever — sem jóias ou outros custos — no clube criado para o efeito e que se chama Alegrete 1375 (Alegrete é o nome da freguesia onde está a vinha e 1.375 é o número de garrafas produzidas).

Claro que, na boa cultura de um clube, quem se associar e comprar garrafas terá certos mimos, assim como poderá, ao longo dos anos, acompanhar a evolução dos vinhos e educar-se para esse mundo dos vinhos com idade, que é coisa que precisamos como pão para a boca.

Alguns leitores que olham para estas coisas com um pé à frente e outro atrás já estão a pensar que isto é uma jogada para a enóloga e o seu sócio pedirem bom dinheiro pelos vinhos, visto que uma compra mínima fica por 720 euros. Mas, calma, são 12 garrafas (seis de tinto e seis de branco), pelo que cada uma fica a 60 euros. Além do mais, cada garrafa tem uma imagem exclusiva concebida por Rita Rivotti a partir de numerações que usam como grafismo cepas velhas.

Dir-se-á que, mesmo assim, 60 euros por garrafa é bom dinheiro, certo, mas a verdade é que não só estamos perante grandes vinhos, feitos com cuidados redobrados, como estamos perante um projecto que tem por objectivo defender e proteger do arranque uma vinha velhíssima e com falhas, e que, por cepa, produz um quantitativo de uvas capaz de levar um jovem financeiro acabado de sair da universidade à loucura. Como sabemos, um vinho de vinhas velhas nunca pode ser barato.

Mais, se não houver consumidores que percebam a cultura das vinhas velhas e não estejam dispostos a pagar mais, o resultado é o arranque das cepas e a substituição destas por castas que são mais do mesmo. Uma vinha velha é um capricho, é um património que se traduz em vinhos com carácter diferenciador, tenha o enólogo/a o bom senso de respeitar as uvas e não aplicar protocolos enológicos para fazer os vinhos copy e paste (ou “vinhos pesadelo, em linguagem dirkeana”).

De facto, Susana Esteban, com a marca Alegrete 1375, soube respeitar muito bem a pureza das uvas, criando vinhos que, quanto a nós, nem sequer se comparam com outros vinhos de Portalegre (e muito menos com vinhos das planícies alentejanas). Se tivéssemos provado estes vinhos às cegas juraríamos que tinham nascido em solos graníticos do Dão. E isso, na nossa cabeça, diz muito sobre os vinhos.

Claro que são o terroir e a vinha velha que estão por detrás da matriz destes Alegretes, mas também a experiência de uma enóloga que se diverte a fazer vinhos em diferentes regiões (cá e fora). Num almoço que serviu para apresentação do branco e do tinto (ambos de 2020), Susana Esteban fez uma afirmação que deveria ser um capítulo num manual de enologia. ”É um crime usar barrica nova com vinhos nascidos de uma vinha com 100 anos.” Pensando bem, vamos meter esta frase numa t-shirt e passear com ela por certas adegas que visitamos. A ver no que dá.

Entretanto, quem quiser tornar-se sócio do Clube Alegrete 1375 tem até ao próximo dia 15 de Novembro para fazer as encomendas. É pegar ou largar.

Nome Alegrete 1375 Branco 2020

Produtor Susana Esteban

Castas Castas misturadas

Região Alentejo (IG)

Grau alcoólico 13%

Preço (euros) 720 euros para 12 garrafas (seis de branco e seis de tinto; compra mínima)

Pontuação 96

Autor Edgardo Pacheco

Notas de prova Podem escrever 500 tratados a dizer que a mineralidade não é descritor de vinho, que isso não nos consome. E este é um branco marcado, no nariz e na boca, por essas sensações (aromas e sabores) minerais, à mistura com algumas notas florais ligeiras. Na boca, a acidez bem viva é o melhor indicador de longevidade do vinho.

Nome Alegrete 1375 Tinto 2020

Produtor Susana Esteban

Castas Castas misturadas

Região Alentejo (IG)

Grau alcoólico 13,5%

Preço (euros) 720 euros para 12 garrafas (seis de tinto e seis de branco; compra mínima)

Pontuação 95

Autor Edgardo Pacheco

Notas de prova Notas vegetais e florais num perfil de vinho contemporâneo, que procura mais a elegância e a frescura e muito menos a extração, os taninos e o álcool. Numa primeira sensação parece-nos que a casta Alicante Bouschet está mais presente, mas, tratando-se de uma vinha velha que é tudo ao molho e fé em Deus isso é muito difícil de avaliar, embora seja propósito de Susana Esteban conhecer cada uma das variedades que estão neste hectare de terra de Alegrete.

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