Pela nona vez, Serralves enche-se (quase todo) de performance
Francesco Cavaliere, Jimmy Robert e André Guedes são alguns dos artistas que este fim-de-semana se mostram na nona edição de O Museu como Performance, em Serralves.
O trio de curadores Cristina Grande, Pedro Rocha e Ricardo Nicolau – este último prefere chamar-lhe “troika” – assume que nunca fez tanto sentido ter referências modernistas como nesta nona edição de O Museu como Performance, a decorrer este fim-de-semana em vários espaços do Museu de Serralves. Ricardo Nicolau explica que “estar a trabalhar num espaço que, apesar de inaugurado há quase 25 anos, é uma referência do modernismo” é também uma forma de homenagear o carácter transdisciplinar do Museu de Serralves, reforçando a atenção dada às artes vivas e levando o público a reflectir sobre o conceito de performance – no percurso expositivo não está incluída a recentemente inaugurada Ala Siza.
“Quanto temos um núcleo de artistas já escolhidos, começamos a perceber que afinal há uma coerência, há ligações entre os projectos”, diz Nicolau sobre as escolhas de artistas para esta edição de O Museu como Performance. “Este ano, por exemplo, isso deu-nos uma componente de instalação imensa, de facto, inédita”, acrescenta. O curador salvaguarda, no entanto, que as três instalações – A Large Inscription/ A Great Noise, Abyssal Creatures e Descendance du Nu – não retiram o propósito desta nona edição, visto que podem ser activadas como performances, não sendo, portanto, algo estático.
Uma das características do Museu como Performance é o facto de trabalhar com encomendas, logo obras inéditas. Canção Nova, do artista André Guedes e do compositor Diogo Alvim, é disso exemplo. A performance cantada de 20 minutos não é a primeira colaboração entre os dois artistas, mas é “a mais consistente, visto que a outra foi há mais de uma década”, justifica agora Guedes ao PÚBLICO. “Canção Nova vem desta ideia de encontrarmos uma canção vocalizando o trabalho de fábrica, da indústria. Tem na origem numa instalação que eu desenvolvi para o Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, em 2017, à volta da fábrica Cimpor, que escolhi pela ligação ao escritor neo-realista Soeiro Pereira Gomes.” Nesta obra, pretende-se invocar uma prática que desapareceu: o canto fabril. “Como é que a pessoa se entrega ao trabalho fabril sem o canto?”, questiona Alvim. “O canto é uma forma de motivar, criar energia para o trabalho e também fraternidade entre os colegas... e é muitas vezes silenciado pelos ruídos da fábrica”, remata. A performance musical será de quatro cantores acompanhados de outros tantos performers e decorre este domingo no auditório de Serralves.
Pensar sobre o tempo
Adam Basanta, artista experimental de Telavive, mas sediado no Canadá, traz, por sua vez, a Serralves duas instalações de uma mesma obra e uma performance que partilham um tema comum. “Formas de pensar sobre o tempo e ciclos de construção e destruição”, explica ao PÚBLICO. A Large Inscription mostra um microfone que se movimenta tal e qual um relógio, mas num círculo de gravilha. Com um olhar crítico sobre a era de comunicação em massa, mostra-nos “a perspectiva do tempo contínuo, sem início ou fim”, refere o artista ao pé de blocos de cimento, atarefado com os últimos arranjos da outra instalação da mesma obra, A Great Noise. Esta foi concebida com um conjunto de microfones – envolvidos, precisamente, em blocos de cimento – que, “de forma sisifiana”, diz, embatem entre si de dez em dez minutos. “Ambas as peças representam a forma como percepcionamos o tempo, especialmente na política. Um como uma espécie de guilhotina; o outro como quem carrega a estátua de um ditador quando ele morre. E voltamos sempre ao mesmo sítio”, comenta Basanta. Já a performance Small Movements pode ser vista este domingo na Biblioteca de Serralves.
O músico e artista italiano Francesco Cavaliere estreia Abyssal Creatures, esculturas de 1,40 metros feitas de vidro soprado de Murano, côncavas e ocas. A sua concepção, explica Cavaliere, “faz com que os sons ecoem dentro delas, como um sistema vascular transparente”. O artista adianta que na sua performance irá “pela primeira vez” tentar comunicar com as esculturas “através da [sua] língua, de sons, do toque”. A performance é este sábado às 15h30 e repete-se no domingo, às 18h, nas Galerias do Museu.
Mette Ingvartsen, Kunrad, Paulina Olowska, Jimmy Robert e Svenja Tiger são os restantes artistas convidados para esta nona edição de O Museu como Performance. A programação completa pode ser consultada no site de Serralves. O bilhete diário custa 13 euros e é descontado 25% do valor mediante a aquisição de bilhete para os dois dias.
Texto editado por Maria Paula Barreiros