Vitória da defesa

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Uma final de uma competição desportiva é isto: tensão, dramatismo, resultado indeciso até ao fim. E o título mundial de râguebi, conquistado pela quarta vez pela África do Sul em oito presenças (1995, 2007, 2019, 2023) - num 12-11 sufocante - mostrou resiliência, força mental e vontade de ganhar. Isto tornou os sul-africanos capazes de resistir aos ataques dos neozelandeses, que tiveram a posse da bola em 60% do tempo de jogo — mas jogaram 63 minutos com 14 jogadores por amarelo a Shannon Frizell (2’) e expulsão do capitão Sam Cane (27’), contra 17 minutos com 14 jogadores do lado dos sul-africanos por amarelos ao capitão Siya Kolisi (45’) e a Cheslin Kolbe (73’).

Quando o árbitro, Wayne Barnes - que esteve, com os seus assistentes, TMO e Bunker, longe de ter sido brilhante - deu o jogo por terminado, o meu pensamento foi directo para Nelson Mandela que, com a sua estratégia de inclusão em 1995, conseguiu a primeira conquista de um Mundial, estabeleceu os princípios - transformando uma equipa dominada pelo segregacionismo do pensamento africander numa equipa representativa e reconhecida por todo o povo sul-africano — que permitiram a presença efectiva de jogadores negros, chegando em 2019 a entregar o capitanato a Siya Kolisi. O Desporto, mesmo se de Alto Rendimento, é tão inclusivo que permite situações que noutros momentos parecem improváveis ou mesmo impossíveis como o facto de, no final do jogo, adversários em cavaqueiras de amizade a que juntavam a apresentação de filhos uns aos outros numa clara demonstração de que a ética desportiva se constrói e vive dentro dos terrenos desportivos.

Como se esperava esta final foi um excelente espectáculo demonstrativo de estratégias e tácticas diferentes, mas ambas altamente efectivas não fora a superdefesa que as duas equipas mostraram - a África do Sul realizou 209 placagens contra 92 dos neozelandeses. Com estilos diferentes - a África do Sul a defender com grande velocidade de saída (e alguns foras-de-jogo…), com muita intensidade e com a necessária interligação para cortar espaço e tempo aos neozelandeses que, até pela sua inferioridade numérica, defenderam com subida mais lenta, dando tempo ao movimento adversário, mas garantindo que podiam adaptar-se e deslizar em tempo para colmatar a falta de um jogador. E se houve, para os dois lados, possibilidades de ensaio, ambas as defesas foram capazes de resolver qualquer dos problemas criados. E nem os neozelandeses foram capazes de garantir, para além do ensaio de Beauden Barrett (58‘) a exploração eficaz que tinham demonstrado na marcação dos seus 49 ensaios mundiais. E isso aconteceu devido à forte presença da defesa sul-africana que, ao encurtar os espaços de manobra neozelandesa, obrigou a riscos, levando a assintonias e aos consequentes falhanços.

Do lado sul-africano viu-se o esperado: correndo um único risco no recurso à composição do banco em 7-1, o constante foi o uso do jogo ao pé na procura da ocupação do campo adversário com a consequente conquista de território que convidava os neozelandeses - sabendo que são confiantes para isso - a lançar o ataque desde a sua área de 22, permitindo assim uma mais fácil organização e eficácia defensiva. Os sul-africanos souberam, numa bem estudada táctica, colocar os seus pontapés sobre os menos aptos captadores de bola neozelandeses. Embora com um jogo mais agradável de ver - jogo atacante de movimento - os neozelandeses foram encurralados de tal maneira que não conseguiram tornar a sua posse e domínio territorial em vantagem numérica de resultado. E talvez tenham cometido um erro em não terem ido aos postes nas penalidades que chutaram para fora… No fundo, uma final com um vencedor meritório e com muito para analisar sob o ponto de vista estratégico e táctico.

Havendo um pé como o de Pollard, a defesa vence. Como aconteceu.

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