Provedora de Justiça pede ao Tribunal Constitucional que avalie limites ao outsourcing

Maria Lúcia Amaral considera que as normas previstas na Agenda do Trabalho Digno são inconstitucionais porque restringem o direito da iniciativa privada.

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Maria Lúcia Amaral, Provedora de Justiça, considera que as normas põem em causa a iniciativa privada Rui Gaudêncio
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A Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, considera que as normas que limitam o recurso ao outsourcing após um despedimento colectivo e que permitem que um prestador de serviços (considerado economicamente dependente) se faça substituir por outra pessoa em determinadas circunstâncias, em vigor desde 1 de Maio de 2023, restringem o direito da iniciativa privada e pediu a intervenção do Tribunal Constitucional (TC).

No requerimento com data de 23 de Outubro, Maria Lúcia Amaral pede a fiscalização sucessiva de duas normas previstas na Lei n.º 13/2023, de 3 de Abril, que alterou o Código do Trabalho no âmbito da Agenda do Trabalho Digno.

“Entende-se que as normas em causa estabelecem restrições ao direito fundamental de iniciativa económica privada que não observam a exigência de proporcionalidade decorrente do artigo 18.º da Constituição”, lê-se no comunicado de imprensa divulgado nesta segunda-feira e que remete para o requerimento enviado na semana passada para o TC.

Em causa estão o n.º1 e o n.º2 do artigo 338.º-A, que proíbem e punem o recurso à terceirização de serviços para satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado nos 12 meses anteriores por despedimento colectivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho.

Estes limites foram muito contestados pelas confederações patronais, que agora vêem a Provedora de Justiça pedir a fiscalização sucessiva do artigo, depois de o Presidente da República ter recusado pedir a sua fiscalização preventiva antes de promulgar o diploma.

Maria Lúcia Amaral argumenta que “não se vê como é que a restrição (…) ao exercício da liberdade de iniciativa económica privada pode ser justificada, de acordo com as exigências de proporcionalidade decorrentes do n.º2 do artigo 18.º da Constituição, pela finalidade de protecção da segurança no emprego”.

O legislador, continua a Provedora, terá pretendido evitar a fraude e que o despedimento colectivo ou por extinção de posto de trabalho se "transmutassem" em instrumentos usados pelo empregador para dispor do emprego. Contudo, acrescenta, "haverá seguramente outros meios de evitação da fraude que se não mostrem tão onerosos quanto o é a proibição do recurso à terceirização", lembrando que a lei já tem mecanismos para identificar os procedimentos e os controlos a que estes tipos de despedimento devem estar sujeitos.

Assim, conclui, "a solução hoje contida no artigo 338.º-A apresenta-se inequivocamente como uma solução excessiva".

Outra das normas que suscita dúvidas a Maria Lúcia Amaral é o n.º3 do artigo 10.º do Código de Trabalho, que concede aos prestadores de serviços considerados economicamente dependentes a possibilidade de se fazerem temporariamente substituir por terceiros por si indicados. Essa possibilidade permite a substituição de um trabalhador independente em caso de nascimento, adopção ou assistência a filho ou neto, amamentação e aleitação, interrupção voluntária ou risco clínico durante a gravidez, “pelo período de tempo das correspondentes licenças ou dispensas previstas” na lei.

A Provedora de Justiça compreende a finalidade deste artigo, nomeadamente, garantir a conciliação entre a actividade profissional e a vida familiar dos trabalhadores. Já a forma como isso se materializa traduz-se "num intenso condicionamento da liberdade contratual do credor da prestação de trabalho, que se vê obrigado a aceitar, nas condições e durante o período de tempo aí previstos, que a referida prestação seja realizada não pela contraparte por si escolhida, mas por alguém por esta última livremente indicada".

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