Condenação de Mamadou Ba gera campanha de solidariedade

Iniciativa foi subscrita por um conjunto variado de pessoas, entre as quais Dino d’Santiago, José Eduardo Agualusa, Daniel Oliveira, Isabel Moreira, Rita Rato, Mariana Mortágua e Rui Tavares.

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Mamadou Ba vê "com satisfação o carácter heterogéneo das pessoas envolvidas nesta campanha de solidariedade”. Daniel Rocha (arquivo)
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A condenação de Mamadou Ba por difamação de Mário Machado, por ter afirmado nas redes sociais que este era “uma das figuras principais do assassinato de Alcindo Monteiro”, gerou uma campanha de solidariedade que considera “intolerável que o Estado de direito seja usado por neonazis para silenciar a verdade e condenar a resistência ao racismo”.

Mamadou Não Segue Sozinho é uma iniciativa de solidariedade com o dirigente do SOS Racismo, porque, como é dito na explicação da campanha, “quando a justiça falha” e “contribui para a normalização do ódio e do racismo, servindo para branquear o passado e o presente de alguém que mantém ambições políticas, os cidadãos exigentes têm o dever de contribuir para que ela seja corrigida”.

A iniciativa foi subscrita por um conjunto variado de pessoas, desde Dino d’Santiago e José Eduardo Agualusa, Daniel Oliveira e Carmo Afonso, colunista do PÚBLICO, Isabel Moreira e Rita Rato, além de Mariana Mortágua e Rui Tavares, que recordam a conclusão do Supremo Tribunal de Justiça que condenou os envolvidos na noite de 12 de Junho de 1995: “Todos os arguidos intervenientes em cada uma das agressões a ofendidos acima descritas actuaram em comunhão de esforços, querendo atingir a integridade física e a vida dos ofendidos, por serem indivíduos de raça negra.”

Essa fatídica noite, recorde-se, terminou com a morte de Alcindo Monteiro e com o espancamento de vários afrodescendentes no Bairro Alto, em Lisboa, por um grupo organizado de neonazis. Mário Machado integrava este grupo. No local do homicídio, na Rua Garret, a Câmara de Lisboa colocou uma placa em homenagem a Alcindo Monteiro.

O militante neonazi foi condenado a dois anos e meio de cadeia pela prática de cinco crimes de ofensas corporais com dolo de perigo. Ficou igualmente provado que Mário Machado bateu na cabeça de uma das vítimas com “um pau semelhante a um taco de basebol”, até esta perder os sentidos. Embora tenha participado nas agressões, Machado não foi sentenciado pelo homicídio de Alcindo Monteiro.

A juíza Joana Ferrer considerou que Mamadou Ba não emitiu uma simples opinião, mas “um facto falso e indiscutivelmente lesivo da sua honra", ao chamar assassino a Mário Machado, sublinhado que, no julgamento, “não esteve em causa nem o empenhamento político” do activista nem “a homenagem devida” à vítima mortal dos neonazis.

“Falou em nosso nome”

Mamadou Ba foi assim condenado ao pagamento de uma multa de 2400 euros, sentença da qual já afirmou que iria recorrer, nomeadamente até ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. A campanha em curso tem também essa preocupação, uma vez que a mesma apela a contributos para um fundo destinado a “cobrir a totalidade das custas judiciais e despesas conexas do processo de Mamadou Ba, que falou em nosso nome”. O objectivo é utilizar a verba remanescente em casos similares em que esteja em causa a violência policial e o racismo.

O dirigente do SOS Racismo, que vive actualmente no Canadá, por razões de segurança, disse ao PÚBLICO ver “com satisfação o carácter heterogéneo das pessoas envolvidas nesta campanha de solidariedade” e que “esta diversidade de gente com percursos e filiações distintos pode contribuir para alargar horizontes sobre a luta contra o racismo”.

A morte de Alcindo Monteiro deve ser encarada como consequência de um contexto de grande actividade de movimentos neonazis e de grupos de skinheads violentos quer em Lisboa, quer no Porto, no final da década de 80 e princípio da década de 90, com alguma complacência policial. Um dos actos mais violentos culminou com a morte de um dirigente do PSR — um dos partidos que deram origem ao Bloco de Esquerda — por parte de grupo de skinheads: José Carvalho, que, na noite de 28 de Outubro de 1989, se encontrava à porta da sede do PSR, na Rua da Palma, em Lisboa, onde decorria mais uma noite de concertos.

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