Portugal aposta no hidrogénio para acelerar a transição energética

O hidrogénio verde é uma das maiores promessas para o mundo dar passos mais firmes no combate às alterações climáticas. Portugal procura estar na linha da frente e somam-se os investimentos previstos.

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Atingir emissões líquidas de gases com efeito de estufa (GEE) nulas em 2050 é um desígnio global que corre o risco de não ser atingido se o mundo não acelerar a transição energética. Para uma descarbonização mais rápida é urgente reforçar a utilização de energias renováveis e o hidrogénio verde tem vindo a ganhar relevância neste processo.

A Europa está na linha de frente, motivada também pela necessidade de substituir o gás natural que importava da Rússia, tendo definido como meta o consumo de 20 milhões de toneladas de hidrogénio por ano em 2030, com metade deste montante produzido em solo europeu.

Um estudo da Deloitte dá conta que, para ser atingido o objectivo de emissões poluentes neutras em termos líquido (“net-zero”) até 2050, empresas e países terão de investir um total de 9 biliões de dólares no hidrogénio verde (8,52 biliões de euros), com cerca de um terço em economias em desenvolvimento. Ainda assim, um valor anual inferior ao que foi gasto em 2022 na produção de petróleo e gás natural (147 mil milhões de dólares - cerca de 139,2 mil milhões de euros).

Na recente actualização do Plano Nacional de Energia e Clima 2030, Portugal também renovou a aposta na massificação do hidrogénio verde, visando potenciar a sua utilização em larga escala e resolver o problema do transporte e armazenamento deste combustível.

O objectivo passa por duplicar a capacidade prevista de electrolisadores até 2030, passando de 2,5 GW para 5,5 GW. Uma oportunidade para reduzir o recurso a energias poluentes, substituindo o gás natural, aproveitando as condições muito favoráveis para a instalação de uma nova fileira industrial com potencial exportador e gerador de riqueza.

Nova fileira industrial com potencial exportador

Produzido através de um processo químico conhecido por electrólise (separação das moléculas da água entre oxigénio e hidrogénio) caso seja utilizada electricidade produzida por fontes renováveis, o hidrogénio verde permite ainda a produção de amónia verde, um biocombustível que resulta da combinação entre hidrogénio e nitrogénio.

A instalação da cadeia de valor da economia do hidrogénio verde e outros gases renováveis – produção, transporte, armazenamento e consumo - está ainda numa fase inicial, mas tem potencial para colocar Portugal com liberdade energética enquanto país e na posição de exportador de gases renováveis. Pode ser fundamental para descarbonizar vários sectores da economia, como a indústria e os transportes, bem como o próprio sector eléctrico.

Os anúncios mais relevantes

Agosto de 2020 - Portugal aprova a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, que contempla entre sete mil a nove mil milhões de euros de investimento, a redução da importação de gás natural entre 380 a 740 milhões de euros e a criação de até 12.000 novos empregos.

Maio de 2021 - Primeiro concurso com apoios a fundo perdido para investimentos no hidrogénio recebe 14 projectos com investimento total de 108 milhões de euros.

Dezembro de 2021 – Início do projecto GreenH2Atlantic, liderado pela Galp e EDP, que prevê investimento de 300 milhões de euros na antiga central a carvão da EDP em Sines. A decisão final de investimento deverá ser adoptada este ano e a operação arrancar em 2026.

Abril de 2022 – Anúncio do projecto MadoquaPower2X , que representa um investimento de cerca de mil milhões de euros para instalar 500 MW de capacidade de produção de hidrogénio verde e 500 mil toneladas de amónia verde por ano em Sines.

Outubro de 2022 - Os governos de Espanha, França e Portugal firmaram um compromisso para a criação de um corredor verde para 100% de hidrogénio (“H2Med”) com vista a interligar a Península Ibérica ao resto da Europa. A infra-estrutura entre Barcelona e Marselha representa um investimento de 2.500 milhões de euros.

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Novembro de 2022 – A Neogreen Hydrogen assinou um contrato com a Aicep Global Parques para ocupar um terreno de mais de dez hectares em Sines onde pretende investir 285 milhões de euros numa fase inicial (60 MW), podendo chegar aos três mil milhões de euros e 2.500 empregos directos e indirectos.

Fevereiro de 2023 - O Fundo Ambiental aprovou a distribuição de 102 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a 21 projectos de hidrogénio verde e a quatro de biometano em diversos pontos do país, que contemplam investimentos de 234 milhões de euros.

Março de 2023 – Portugal e Espanha reiteraram o compromisso de concretização do projecto de infra-estrutura CelZa (entre Celorico da Beira e Zamora) que liga os dois países, com o objectivo de fazer da Península Ibérica uma região exportadora líquida de hidrogénio renovável. Está previsto um investimento de 350 milhões de euros. Ligar a Figueira da Foz a Celorico da Beira custa mais 120 milhões de euros.

Março de 2023 - Hidrogénio verde foi pela primeira vez injectado na rede de gás natural portuguesa, no concelho do Seixal. Tratou-se de um momento simbólico do projecto Green Pipeline Project, que foi lançado em Outubro de 2021 e que é liderado pela Floene (antiga Galp Gás Natural Distribuição). Dentro de dois anos o objectivo passa por incorporar 20% de hidrogénio na rede.

Junho de 2023 – Portugal actualizou o Plano Nacional de Energia e Clima 2030, com metas mais ambiciosas para a transição energética, chegando a 2026 com 80% da energia produzida através de fontes renováveis. A aposta no hidrogénio mais do que duplica, colocando o país mais perto de atingir a neutralidade climática em 2045. O conteúdo da Estratégia Nacional para o Hidrogénio, aprovada em 2020, será actualizado.

Agosto de 2023 - O Governo lançou um segundo aviso para subsidiar projectos de produção de gases renováveis, tendo recebido 39 candidaturas para projectos de hidrogénio verde e nove para biometano. Os projectos representam 906 milhões de euros em investimentos, com incentivos de 353 milhões de euros.

Setembro de 2023 – A Galp Energia adoptou a decisão final de investimento na construção, em Sines, de uma unidade de hidrogénio verde com a capacidade de 100 MW de eletrolise que produzirá até 15 mil toneladas de hidrogénio renovável por ano. O investimento total ascende a 250 milhões de euros, sendo que a empresa anunciou ainda outro investimento de 400 milhões de euros numa unidade de biocombustíveis avançados no mesmo local. Em termos globais e no longo prazo, a petrolífera portuguesa admite explorar até 700 MW de eletrólise em Sines.

Passar do papel à acção

A chuva de investimentos privados a que se tem assistido no hidrogénio verde deve ser encarada com uma cautela redobrada. A tecnologia ainda não está madura, muitos projectos não vão sair do papel, outros não serão desenvolvidos na sua plenitude e os resultados vão demorar tempo a dar frutos. Vão passar anos desde a tomada de decisão de avançar com os investimentos, até à construção dos projectos e início da produção.

É previsível que só na próxima década a fileira do hidrogénio em Portugal esteja operacional, sendo que ao Estado cabe também um papel decisivo no desenvolvimento desta indústria. Em termos de licenciamento, regulação e atribuição de apoios, mas também no investimento em infraestruturas. Parece, contudo, consensual que Portugal tem condições privilegiadas e deve aproveitar esta vaga de investimento para acelerar na transição energética, acabar com o défice estrutural da sua balança comercial na energia e desenvolver uma nova indústria com potencial para criar emprego.


Este conteúdo está inserido no projecto "Hidrogénio: que caminho para Portugal?", que inclui ainda um podcast, case studies de empresas nacionais e uma conferência dedicada ao tema do hidrogénio em Portugal. Saiba mais aqui.

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