Deter activistas por prevenção é legal? Penalistas dizem que “há fundamento”

Advogados ouvidos pelo PÚBLICO defendem que a PSP pode deter activistas se houver evidência de que estão na “iminência” de cometer uma prática ilícita.

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Activistas do Climáximo estilhaçaram vidro da sede da REN este sábado Climáximo/DR
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Um grupo de 12 activistas do Climáximo, que ia fazer um novo protesto não comunicado à polícia em Cascais, foi detido pela PSP e constituído arguido este domingo, ainda antes de iniciar a manifestação. Os activistas alegam que a acção da polícia foi "ilegal", mas a PSP justifica que agiu para "prevenir" um "acto ilícito". Os penalistas ouvidos pelo PÚBLICO admitem que a polícia pode ter "fundamento legal".

O Climáximo tem feito protestos todos os dias esta semana: bloqueou a Segunda Circular, a Rua de São Bento e a Avenida de Roma, atirou tinta para a sede da REN e estilhaçou o vidro da fachada dessa empresa. Alguns dos activistas que foram levados pela PSP este sábado já tinham sido identificados e detidos por participarem nesses protestos.

Desta vez, 12 activistas foram revistados, identificados e detidos pela PSP junto à maratona da EDP, que arrancou no Hipódromo de Cascais, alegando que estavam "simplesmente a conversar", quando foram abordados pelos agentes na posse dos materiais do protesto (faixas e T-shirts com mensagens políticas e tintas) guardados nas malas. A PSP explica que reconheceu os activistas devido ao seu "mediatismo" e que os deteve para "prevenir" que cometessem "qualquer acto ilícito", sublinhando que "se faziam acompanhar" dos materiais.

Ouvido pelo PÚBLICO, Carlos Melo Alves, advogado especialista em direito penal, alerta que "a polícia não pode prender as pessoas se não estiverem a cometer um crime" porque o "direito penal não permite acções de prevenção". Contudo, o penalista admite que podemos estar perante um caso de "flagrante delito".

Para Melo Alves, se os activistas "estão no local já com faixas, mesmo que guardadas, e se as regras da experiência dizem que estavam já preparados para cometer aqueles factos, pode-se entender que aí há tentativa" de crime e, nesse caso, "há flagrante delito e está justificada a detenção".

E se a PSP só tomou conhecimento dos materiais porque revistou os activistas? Num "local onde é susceptível a prática de crimes", os agentes da PSP "podem fazer acções de prevenção e revistar as pessoas", justifica.

A própria porta-voz da acção, Maria Mesquita, indicou ao PÚBLICO que "certamente" os agentes da PSP "estariam atentos a um evento da EDP, que é uma das principais responsáveis pelo genocídio que estamos a viver" depois de os activistas terem estado a "interromper a normalidade durante uma semana".

Na mesma linha, Cristina Borges de Pinho, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, sinaliza que a revista "poderá ser efectuada" enquanto "medida cautelar" se estivermos na "iminência de eventuais ilícitos". Por norma, "a revista tem de ser autorizada", explica a especialista, mas se a PSP "sabia que aquele grupo normalmente pratica ilícitos pode ser posteriormente validada pela autoridade judiciária", isto é, o Ministério Público.

Quanto à detenção, a advogada considera ainda que, "se já estavam muito próximos do local e tinham todo esse material com dizeres de protesto", "podemos considerar que havia uma tentativa". Nesse caso, se existir uma prática de "ilícito típico, pode ser punível". Mas a especialista aponta que também se pode justificar a detenção apenas "para efeitos de identificação" na esquadra, uma vez que se tratava de um grupo de 12 pessoas.

Também o advogado Paulo de Sá e Cunha salienta que "há fundamento legal" se a polícia "entender" que se está "na iminência de vir a cometer um crime". "Há um estado temporal imediatamente anterior que legitima a intervenção", afirma.

Lembrando que a "manifestação não autorizada pode traduzir-se em prática de crime" e que os activistas já cometeram crimes de "dano" como partir o vidro da sede da REN, o advogado explica que, "se está iminente a execução, é previsível que logo a seguir venha a dar-se um crime". Nessa circunstância, os agentes da PSP "podem actuar", diz.

O penalista aponta, ainda assim, que num acto "puramente interventivo é difícil ir para além da identificação e da ordem para sair do local", apontando que "pode ser isso que está em causa" se os activistas foram constituídos arguidos por "desobediência qualificada".

Os activistas adiantaram ao PÚBLICO que estão a ser investigados por essa razão, mas a PSP diz que existem "outras situações". Além disso, a porta-voz do Climáximo para este protesto garante que não houve qualquer ordem por parte da PSP para abandonarem o local e que não resistiram aos agentes.

Quanto à revista, Sá e Cunha admite que "não se pode parar pessoas e submeter a buscas sem justificação forte", mas sublinha novamente que "há uma excepção que é ditada por razões de urgência" se eram "pessoas suspeitas que davam sinais de que podiam estar na iminência" da prática de crimes.

"Não me parece que se esteja a violar a legalidade", conclui. Resta saber o que vai decidir o Ministério Público.

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