IVA de 0% nos alimentos reflectiu-se na descida dos preços, confirma Banco de Portugal
Sem a isenção temporária, os preços dos bens alimentares não tinham baixado tanto, mesmo que a pressão inflacionista já estivesse a recuar em Abril quando a alteração arrancou.
A isenção temporária do IVA em 46 tipos de bens alimentares, em vigor desde Abril, ajudou à descida dos preços dos produtos abrangidos pela redução do imposto. Embora a pressão da inflação já estivesse em sentido descendente, houve uma “clara descolagem” dos custos dos bens isentos a partir de Maio e essa quebra “evidencia” que a medida se reflectiu nos preços finais, conclui o Banco de Portugal (BdP) no boletim económico divulgado nesta quarta-feira.
Para verificar o grau de repercussão do IVA de 0% e “destrinçar se as variações de preço observadas” a partir do mês imediatamente a seguir à alteração reflectiam o facto de as pressões inflacionistas já estarem a reduzir-se naquela altura, ou se resultavam da própria redução do IVA, os economistas do banco central compararam a variação do preço dos produtos isentos em Maio com a de bens alimentares não afectados pela redução do IVA e compararam ainda as variações na área do euro e em Espanha em bens alimentares idênticos aos afectados pela redução em Portugal.
“Apesar de ter existido uma alteração do IVA de alguns produtos em Espanha em Janeiro de 2023, a sua utilização como referência justifica-se devido à semelhança de condições meteorológicas, que influenciam os preços de algumas das rubricas consideradas”, pontua o BdP.
E se a “evolução dos índices de preços agregados dos bens alimentares isentos e dos não abrangidos em Portugal nos meses que antecederam a alteração do imposto foi relativamente semelhante”, o preço médio do “grupo de bens afectados reduziu-se cerca de 6% na semana de 23 a 29 de Abril face à semana anterior à entrada em vigor da medida, enquanto o dos bens não afectados permaneceu quase inalterado”. Uma diferença que, diz o banco central, “persistia até ao final de Agosto”.
Ao mesmo tempo, os dados comparativos com o comportamento dos produtos semelhantes na zona euro e na economia vizinha corroboram que a medida em Portugal ajudou à redução dos preços no consumidor.
A esmagadora maioria dos produtos da lista da isenção diz respeito a bens que eram tributados com a taxa de IVA reduzida, de 6%, e que agora passaram para uma taxa de 0%, havendo o caso do óleo alimentar, que estava nos 23% e também passou para 0% temporariamente.
O BdP verificou “comportamentos diferenciados” nos preços — nove rubricas registaram uma redução “superior à que resultaria do impacto mecânico”, 14 uma quebra inferior e três um aumento —, podendo haver “múltiplas” razões “por detrás destas diferenças”. Por isso, vinca, é importante olhar para a evolução dos preços noutras economias. E, aí, concluiu a instituição liderada por Mário Centeno, verifica-se a tal “descolagem dos preços” em Portugal a partir de Maio.
A comparação dos bens isentos com Espanha e a zona euro “mostra uma evolução muito próxima antes da entrada em vigor” da descida em Portugal, o que permite ver como evoluíram os preços nestes territórios para comparar com o que aconteceu do lado português. Sem a medida, os preços não teriam descido tanto. “Partindo do pressuposto de que os preços destes produtos teriam continuado a evoluir de forma semelhante entre as três áreas económicas, se a taxa de IVA se tivesse mantido inalterada, estima-se que a variação dos preços em Maio das rubricas que anteriormente tinham IVA a 6% tenha sido inferior em quatro pontos percentuais face à de Espanha e 3,5 pontos percentuais face à área do euro”.
O banco central acrescenta que na comparação rubrica a rubrica com as outras economias “é visível que os preços dos bens afectados registaram quedas em Maio em Portugal que não tiveram paralelo em Espanha” e quando se compara a variação em cadeia, “excluindo o impacto mecânico da isenção do imposto em Portugal com as observadas em Espanha, a evolução é mais próxima para a maioria das rubricas”, acontecendo o mesmo na comparação com a zona euro.
Inicialmente, a isenção temporária estava prevista acabar a 31 de Outubro, mas o Governo propôs ao Parlamento prolongar a medida até ao final do ano, iniciativa que ainda não foi votada na generalidade.
A redução temporária avançou quando o Governo fez um acordo com representantes das empresas de retalho e com os produtos agrícolas — para que os agricultores baixassem os preços logo no ponto de partida da cadeia ou o mais cedo possível na cadeia comercial e, depois, para que os supermercados reflectissem a descida no preço final.
Num relatório recente, o Observatório de Preços do sector agro-alimentar, criado pelos ministérios da Agricultura e Economia, já tinha concluído que os preços de alguns alimentos desceram (caso dos produtos hortícolas e dos peixes) e que outros se agravaram (como carnes, azeite e frutas).