Dicas para os pais se prepararem para o “ninho vazio”
Os filhos são o centro das nossas vidas, sempre, e para sempre, mesmo quando já adultos, mas como diria o Marco Paulo podemos, e devemos, ter dois amores, ou mais.
Querida Mãe,
Temos falado muito sobre o difícil (ou o alívio!) que é deixar os miúdos na escola, mas no outro dia quando estava a guiar, percebi que um destes setembros, já não tão longínquos assim, uma das minhas filhas vai, muito provavelmente, estar a partir para um sítio mais longe.
Seja porque os filhos vão estudar para fora, viajar, fazer Erasmus, há tantos pais que estão nesta altura a despedirem-se deles para, depois de anos de casa sempre cheia, se terem de habituar a não os terem “perto do ninho”.
E nisto lembrei-me de si, e de como fomos deixar o Francisco ao aeroporto, tinha ele 16 anos, para ir para o Havai. Até para nós, irmãos, foi impactante e uma mudança grande — começámos a ter saudades dele e discutíamos muito menos (ver aqui um emoji a sorrir).
Tenho aprendido que o nosso coração de mães é muito mais resiliente às mudanças do que parece. Lembro-me de ficar a pensar nas minhas filhas das primeiras vezes que andaram de autocarro, ficava a fazer tarefas, mas com a preocupação em pano de fundo. Hoje em dia, às vezes, sinto-me culpada porque já nem me lembro, por isso, presumo que também seja possível adaptarmo-nos a termos esse lugar vazio, a substituir as conversas presenciais pelos whatsapps, mas podemos-nos ir preparando para o ninho vazio?
Quais são as suas dicas?
Ana,
Oh não, estás a tentar dizer-me alguma coisa? Alguma das minhas netinhas já expressou o mais ténue desejo de se afastar da avó? Da mãe, é como o outro, mas da avó?!
Mas pedes-me conselhos para os pais, sobretudo para aqueles que vão ver os filhos partir nos tempos mais próximos, e dou-os, com todo o prazer (não há nada que as pessoas mais gostem do que ser solicitadas a dar conselhos).
Ponto um, a síndrome do ninho vazio é real, e pode trazer consigo um vazio imenso, sobretudo em famílias — e são já a maioria — com um único filho. O antídoto tem de começar a ser fabricado desde a infância.
Em que consiste? Em ter vida própria. E vida de casal.
Eu sei que os filhos são o centro das nossas vidas, sempre, e para sempre, mesmo quando já adultos, mas como diria o Marco Paulo podemos, e devemos, ter dois amores, ou mais.
Muitas vezes estamos tão centrados nos miúdos, que nos esquecemos de cultivar as coisas que nos fazem felizes e realizam, pomo-los sempre à frente dos nossos interesses, mesmo profissionais. E, quando eles (felizmente) exigem mais espaço e autonomia, ficamos meios perdidos, como se nos tivessem remetido para o fundo de desemprego. Aí podemos batalhar contra eles, o que vai ser mau para todos, ou batalharmos por encontrar novas formas de equilibrar os pratos da balança, e geralmente chegamos lá, mas é muito mais doloroso quando nos apanha de surpresa.
Por outro lado, recompensados pela atenção dos nossos filhos, esquecemos, igualmente, a relação com a nossa cara-metade, e quando, finalmente, temos o tempo e o espaço para concretizar os projectos tantas vezes adiados, afinal o outro já não está ao nosso lado, ou tornou-se um desconhecido.
E é uma pena porque, digo-te por experiência própria, se ao princípio custa muito a casa vazia — e arrumada! —, depois torna-se mesmo bom não ter jantares para fazer todos os dias, sair porta fora, se nos apetecer, ler um livro sem interrupções e não passar o tempo todo a apanhar roupa do chão.
E sim, tens toda a razão, as mensagens, as videochamadas, o “ir às compras” virtual com a nossa filha que está do outro lado do mundo, as cartas/e-mails — e, claro, as Birras de Mãe — fazem milagres. Mas, o melhor de tudo, é ver-vos felizes (pelo menos grande parte do tempo).
Mas que bom, é dizer “até já” em lugar de “adeus”, e ter-vos por perto.
PS: Há dias em que teria, com gosto, mandado cada um de vocês para uma ilha diferente. O teu irmão depois de ter vivido numa escola de windsurf, com uns pais adoptivos durante quase um ano, voltou grato pela mãe que tinha — é claro que esqueceu depressa, mas enquanto durou, foi muito bom.
O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.