Milhares de arménios fogem do medo de limpeza étnica em Nagorno-Karabakh

Até ao início da tarde desta segunda-feira, 6650 pessoas chegaram à Arménia em fuga de um território agora controlado pelo Azerbaijão. Governo arménio acusa Rússia de não respeitar acordos.

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Habitantes da região separatista partem em direcção à Arménia Reuters/DAVID GHAHRAMANYAN
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Com pouco mais do que alguma comida e a roupa que levam vestida, milhares de habitantes arménios da região de Nagorno-Karabakh deram início, na noite de domingo, a um êxodo em direcção à Arménia, receando serem alvos de perseguição e de limpeza étnica no território separatista incrustado no Azerbaijão.

Segundo o Governo da Arménia, pelo menos 6650 pessoas entraram no país até ao início da tarde desta segunda-feira, quase uma semana depois de o Exército do Azerbaijão ter derrotado os arménios que estavam há três décadas no poder em Nagorno-Karabakh, numa intervenção que durou apenas 24 horas e que terminou com a rendição incondicional dos separatistas.

O cenário mais provável, segundo as autoridades arménias e as organizações internacionais de defesa dos direitos humanos, é que o fluxo não pare de aumentar nos próximos dias, até que a quase totalidade dos arménios que vivem em Nagorno-Karabakh — mais de 120 mil pessoas, ou 95% da população — tenha abandonado o território.

Em declarações ao jornal britânico Guardian, Olesya Vartanyan, investigadora no International Crisis Group e conhecedora da região do Cáucaso do Sul, sublinhou que a fuga acontece ao fim de dez meses de um bloqueio das forças do Azerbaijão ao único corredor que liga o território à Arménia.

"As pessoas com quem eu falei disseram-me que não esperam regressar", disse Vartanyan, para quem o êxodo "indica que a intenção declarada do Azerbaijão de integrar estas pessoas é uma política morta à nascença".

"Nos três anos desde a guerra de 2020, o Azerbaijão nunca clarificou o que quer dizer com 'integração'", notou a investigadora.

Apelo à ONU

A região de Nagorno-Karabakh, situada no Sudoeste do Azerbaijão e sem ligação física à Arménia, é há muito disputada entre os dois países.

Reconhecida internacionalmente como parte do Azerbaijão, mas com uma população constituída quase na totalidade por arménios, a região passou a ser controlada pelos separatistas arménios após a guerra de 1988-1994.

Em 2020, o Azerbaijão recuperou grande parte do território, e em 2022 aumentou a pressão sobre a população local ao bloquear o corredor de Lachin — a via que permitia a passagem entre Nagorno-Karabakh e a Arménia, e cujo bloqueio provocou uma escassez de comida e de apoio médico no território nos últimos meses.

No domingo, o Governo da Arménia pediu às Nações Unidas que mobilizem para a região uma força de monitorização dos direitos humanos, perante o receio de que o regime autoritário do Azerbaijão tente eliminar as marcas da maioria arménia.

Numa comunicação ao país, o primeiro-ministro da Arménia, Nikol Pashinyan, disse que o seu Governo "irá receber de braços abertos os irmãos e as irmãs de Nagorno-Karabach", e reafirmou que os arménios da região "correm o risco de limpeza étnica".

Guerra de influências

A rápida vitória militar do Azerbaijão endureceu os protestos contra Pashinyan na Arménia, com milhares de pessoas a exigirem a sua demissão nas ruas da capital, Erevan, acusando-o de ter abandonado os arménios de Nagorno-Karabakh. O primeiro-ministro da Arménia acusa o Governo russo de não ter respeitado os acordos de segurança entre os dois países.

"Alguns dos nossos parceiros estão a expor cada vez mais as nossas vulnerabilidades em termos de segurança, pondo em risco a nossa estabilidade externa e interna e violando todas as normas de etiqueta e de correcção nas relações diplomáticas entre Estados, incluindo obrigações assumidas em tratados", disse Pashinyan.

Em resposta, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, disse que a acusação do primeiro-ministro arménio é "ridícula", e afirmou que "chegou a hora de os dois países desenvolverem uma confiança mútua".

Sobre este assunto, a responsável no Parlamento Europeu pelas relações com os países do Cáucaso do Sul (Arménia, Geórgia e Azerbaijão), a eurodeputada estónia Marina Kaljurand, disse que a fuga de arménios de Nagorno-Karabakh e os protestos contra o Governo da Arménia são "duas tendências perturbadoras".

Segundo Kaljurand, a Arménia "tem deixado claro que não vê o futuro do seu país ao lado da Rússia", e o primeiro-ministro do país "quer receber uma orientação do Ocidente".

Nesta segunda-feira, a agência Reuters noticiou a chegada a Erevan da directora da agência norte-americana de ajuda ao desenvolvimento, Samantha Power, e do responsável pelos assuntos europeus e euroasiáticos no Departamento de Estado dos EUA, Yuri Kim.

Segundo Power, os dois responsáveis vão reafirmar a parceria dos EUA com a Arménia "e discutir medidas para enfrentar a crise humanitária em Nagorno-Karabakh".

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