Morreu Gianni Vattimo (1936-2023), o filósofo do “pensamento fraco”

Influenciado por Heidegger e Nietzsche, é lembrado como um dos grandes filósofos da pós-modernidade.

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Gianni Vattimo Leonardo Cendamo/Getty Images
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O filósofo italiano Gianni Vattimo morreu na terça-feira, aos 87 anos, num hospital em Turim, onde estava internado em estado grave desde meados do mês passado. A notícia foi confirmada na rede social Facebook por Simone Caminada, assistente do veterano pensador há quase 15 anos.

“Exaltado como o grande filósofo do pós-modernismo”, recorda o jornal espanhol El País, Gianni Vattimo notabilizou-se pela sua teoria do “pensamento fraco”. Uma crítica à metafísica tradicional, defendia o afastamento das verdades absolutas e universais, em detrimento de uma visão mais aberta e modesta da filosofia, resume a publicação Italy 24 Press News.

Uma proposta que, segundo o italiano, nasceu em parte da sua experiência enquanto homem simultaneamente homossexual e católico. “Se não fosse gay, nunca teria levado a cabo esta reflexão profunda sobre a não-normatividade das essências naturais, que constitui a alma do ‘pensamento fraco’. Portanto, embora não seja uma ‘filosofia gay’, acho que há conexões importantes”, disse uma vez, em declarações que a Italy 24 Press News agora recupera.

Influenciado por Martin Heidegger, sobre quem escreveu Introdução a Heidegger (Edições 70, 1989), e sobretudo por Friedrich Nietzsche — em As Aventuras da Diferença (Edições 70, 1988) analisa a forma como cada um deles definiu o conceito de “diferença” —, o filósofo nascido em Turim em 1936 expôs o seu pensamento sobre a mudança dos tempos em obras como O Fim da Modernidade: Niilismo e Hermenêutica na Cultura Pós-Moderna (Presença, 1987). Em Para Além da Interpretação (Tempo Brasileiro, 1999), debruçou-se sobre a sua ideia de “pensamento fraco”, frisando, conforme recorda o El País, o “papel central da interpretação na filosofia contemporânea”.

Também escreveu bastante sobre religião, em títulos como O Futuro da Religião, este em colaboração com o autor Richard Rorty (Angelus Novus, 2008).

Activo não só na academia (foi professor na Universidade de Turim) como na arena política, associou-se a diferentes partidos de esquerda ao longo da vida, tendo abraçado também o comunismo italiano. Chegou a ser, no início do milénio, membro do Parlamento Europeu. “Foi, também, fundamental na divulgação da filosofia em Itália, tendo apresentado programas culturais televisivos na estação pública nacional RAI e também trabalhado como colunista nos jornais La Stampa, La Repubblica e L’Espresso”, aponta o El País.

Em 2014, em declarações à emissora italiana Radio 24 sobre os conflitos entre Israel e a Palestina na Faixa de Gaza, o filósofo defendeu que a Europa devia comprar e oferecer ao Hamas “melhores armas”. “Questionado sobre se gostaria de ver mais israelitas a morrer no decurso do braço-de-ferro, Vattimo respondeu: ‘Claro que sim!’”, citado pela publicação The Local Italy. Pouco tempo depois, pediu desculpa por alguns dos comentários, dizendo que havia sido “provocado” pelos anfitriões do programa onde fizera essas declarações — mas manteve algumas críticas a Israel, que continuou a descrever como “um Estado desonesto”.

A sua relação com Simone Caminada, que com os anos foi passando de apenas assistente a companheiro, gerou muita polémica no último capítulo da vida do filósofo. Em Fevereiro passado, o brasileiro, hoje com 38 anos, foi condenado a dois anos de prisão pelo crime de manipulação de pessoa incapaz. Na sua sentença, relembra o El País, o juiz considerou que Caminada estaria a aproveitar-se da fragilidade do filósofo, receoso de ficar sozinho e ciente de que não já não era capaz de cuidar de si mesmo, para se apoderar da sua herança. Vattimo não se considerava vítima de qualquer crime e os “especialistas que o examinaram ao longo do tempo deram opiniões contraditórias sobre o seu estado psicológico”, sublinha o jornal espanhol.

Notícia corrigida esta quarta-feira às 13h45

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