Viu uma ave a chocar contra uma janela? Já há um formulário para registar isso
A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) criou um formulário para cidadãos registarem colisões de aves com superfícies transparentes. O objectivo é identificar locais de risco e soluções.
Viu uma ave a voar contra uma janela? Encontrou um pássaro atordoado no chão? A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) quer agora registar a ocorrência de colisões com superfícies transparentes ou espelhadas, disponibilizando a partir desta terça-feira um formulário através do qual os cidadãos podem comunicar episódios desta natureza.
Colisões de pássaros com edifícios matam mais de mil milhões de aves por ano no mundo, mas em Portugal não há dados que permitam quantificar o problema.
“Em Portugal temos pouquíssimos dados concretos, mas na SPEA temos notado que nos últimos 2 ou 3 anos temos tido muito mais gente a contactar-nos a esse respeito, à medida que têm surgido mais estruturas com barreiras transparentes, como os campos de padel, nos espaços verdes das cidades” diz Hany Alonso, técnico da SPEA, citado numa nota de imprensa.
O objectivo da iniciativa é não só “medir a dimensão desta ameaça em Portugal”, mas também “identificar as espécies de aves mais afectadas e os locais e alturas do ano mais críticos”, refere a SPEA. Só assim, acredita a entidade, será possível desenvolver, divulgar e colocar em prática soluções.
“Suspeitamos que o problema seja grave — como já se sabe que é noutros países — mas queremos perceber melhor o que se passa em Portugal: que tipos de aves são mais afectadas, se há períodos mais críticos, quais estruturas são mais perigosas. Porque essa informação é crucial para se aplicarem soluções eficazes”, refere o especialista da SPEA.
Do campo de padel às auto-estradas
A SPEA observa que, nos espaços urbanos, há cada vez mais estruturas transparentes que podem ser trágicas para as aves. Além das superfícies espelhadas dos edifícios, existem barreiras translúcidas emoldurando estradas, ferrovias, pontes, espaços desportivos e até jardins.
Todas estas estruturas podem constituir “armadilhas letais” para as aves uma vez que, por serem translúcidas, não são identificadas pelos animais como um obstáculo. Acresce que, como muitas vezes estas superfícies espelham o céu e a paisagem circundante, as aves podem ter dificuldade em reconhecer a existência de uma barreira.
As aves possuem uma boa acuidade visual – podem ver até melhor que os humanos –, mas apresentam grandes dificuldades em interpretar superfícies translúcidas como uma barreira intransponível. Nós, humanos, tendemos a prestar atenção a pistas visuais como puxadores, molduras, toldos e estruturas de engenharia. E, por isso, ao contrário das aves, deduzimos a existência de um vidro.
Há ainda outro factor a considerar: a velocidade do voo. Mesmo que haja uma identificação do obstáculo físico, talvez a ave já não tenha tempo para reagir se estiver a deslocar-se rapidamente.
“Com base em dados de países como Espanha, sabemos que estas barreiras põem em risco uma série de espécies, como gaviões e açores, que fazem voos muito rápidos, muitas vezes na periferia de parques florestais, por exemplo, ou melros e toutinegras que são comuns nas zonas urbanas e por isso têm maior probabilidade de se deparar com estas barreiras. Também sabemos que é uma ameaça para aves migradoras, que não conhecem bem estas zonas onde estão só de passagem, e por isso mais facilmente são “enganadas” por estas barreiras”, diz Hany Alonso.
“Até para as aves nocturnas como mochos e noitibós estas superfícies espelhadas criam uma armadilha visual, muitas vezes aumentada pela iluminação artificial”, acrescenta o ornitólogo, especialista da SPEA.
Quais soluções?
A SPEA quer identificar locais e situações de perigo para a avifauna para, depois, poder facultar informação e propostas de soluções às entidades ou aos responsáveis que gerem tais espaços. A aplicação de uma película com um padrão de pontos em janelas, por exemplo, pode ajudar estes animais a identificar o vidro como um obstáculo. Os adesivos em forma de aves de rapina não são tão eficazes como se pensava, de acordo com estudos recentes, refere a de imprensa da SPEA.
Um estudo publicado este ano na revista científica PeerJ mostra ainda que colar o adesivo na parte interior da janela é inútil. Os autocolantes, quando aplicados do lado de dentro da janela, não são visíveis para os pássaros uma vez que não só o reflexo, mas também o brilho do vidro ofuscam os adesivos e tornam-os menos perceptíveis para a avifauna.
“Se deseja reduzir as colisões entre pássaros e janelas, certifique-se que aplica os adesivos ou as películas à superfície externa das janelas. Colocar estes dispositivos na parte interna não adianta, infelizmente”, explicou ao PÚBLICO John Swaddle, co-autor do estudo e director do Instituto para a Conversação Integrativa da Universidade William & Mary, nos Estados Unidos.