Os segredos para saber envelhecer (e viver)

Em japonês existe o termo “ikigai” que pode ser resumido como “força motriz de viver”. Portugal é o quarto país mais envelhecido da Europa. Poderá ser importante reflectir sobre alguns pontos.

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Megafone P3: Os segredos para saber envelhecer (e viver) RDNE Stock project/Pexels
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Na semana em que se estreia nas plataformas de streaming uma série sobre a longevidade e os supostos segredos para saber envelhecer - Viver até aos 100: Os Segredos das Zonas Azuis -, poderá ser importante a reflexão. Portugal ocupa o segundo lugar entre os países mais envelhecidos da Europa. Somos quase 2,5 milhões de pessoas com mais de 65 anos, um aumento de 20,6% desde os censos de 2011. Actualmente, a média de esperança de vida à nascença são 81 anos de idade.

Na série de que vos falo surge o termo "ikigai", que em japonês tem inúmeros sentidos, mas que poderá ser resumido por "força motriz de viver" ou "sentido da vida". Este termo levou-me à leitura da última obra do neurocientista japonês Ken Mogi, onde se explica e teoriza sobre a importância de se viver com "ikigai".

Um cozinheiro pode ter como "ikigai" alcançar uma estrela Michelin. Poderá nunca a alcançar, mas lutará por ela todos os dias, aperfeiçoando minuciosamente a sua forma de trabalhar, retirando desta entrega um sabor de concretização tão ou mais importante do que a estrela: viver com intensidade e alegria, melhorar a cada dia, sentir-se realizado por atingir novas etapas, ser capaz de ultrapassar inúmeras dificuldades e atingir um patamar de excelência e reconhecimento.

Mas o "ikigai" também poderá resumir-se ao avô que tem prazer e orgulho em levar o seu neto à escola, vê-lo crescer, adivinhar-lhe parecenças físicas, transmitir-lhe conhecimento ou simplesmente fazê-lo rir com uma patetice.

Todos nós alimentamos um certo fascínio pela ideia do elixir da eterna juventude e desejamos envelhecer da melhor forma possível. Este é o ponto mais interessante de todos. Podemos, a partir de hoje, decidir de que forma vamos envelhecer. Podemos e devemos conseguir imaginar-nos com 70 e 80 anos, e começar já a construir um quotidiano que nos permita alcançar a pessoa que desejamos ser no futuro.

Olhar o amanhã como uma abertura de inúmeras hipóteses em vez de um afunilamento do que nos será possível fazer (porque já sabemos que perderemos agilidade, destreza, força, e seremos condicionados por problemas de saúde) é mais uma razão para contrariarmos a tendência enquanto o conseguimos.

Somos cruéis quando olhamos determinadas actividades como sendo destinadas apenas a pessoas de determinada idade. Isto é preconceituoso, chama-se idadismo, e tem de ser combatido (até porque o idadismo não é apenas exercido em pessoas de idade avançada).

Sabiam que existem cerca de 370 universidades seniores no nosso país? E 720 bandas filarmónicas onde se poderá aprender um instrumento com preços bastante acessíveis? Bibliotecas públicas e piscinas municipais, que devem ser usadas e dinamizadas. Um simples encontro de leitores poderá transfigurar toda a dinâmica da nossa vida. Talvez o problema não seja a falta de oferta, mas apenas a forma como olhamos determinadas actividades. Fazer o exercício de descobrir se o maior impedimento não estará apenas na nossa cabeça.

Não julgar quem, com 40 anos, decide escrever um livro ou aprender um instrumento, ou alguém que, com 50 anos, decide tirar a sua licenciatura de sonho, porque já não precisa dela para o emprego que cumpriu durante toda a sua vida. Não podemos olhar de soslaio homens e mulheres que, com 60 anos, frequentam a hidroginástica, compram uma bicicleta, praticam aulas de yoga, ou se mudam da cidade para o campo.

Nem das senhoras de 75 anos que passam as manhãs nos cafés com as amigas a falarem das actividades do bairro. Não esquecer que estes momentos são de uma importância social imensa, principalmente no combate da solidão, do isolamento, da depressão e prevenção de doenças mentais.

Há dias, ao jogar snooker com o meu filho num salão de jogos, pude ouvir a conversa de dois sexagenários da mesa do lado. Um deles repetia várias vezes: “Deixa, eu tenho de aprender por mim”. Entendi que se tratavam de dois amigos em que um deles decidira dar aulas ao outro, incentivando-o a cada tacada a melhorar.

Quando terminaram, o que aprendia, talvez em modo de agradecimento pela aula, perguntou ao seu amigo se já tinha o passe "que dava para ir até Setúbal, se quisessem". O outro respondeu-lhe que não, mas que se ele lhe explicasse tudo, poderia tratar disso. É preciso apenas isto.

Artigo editado às 17h15 do dia 14 de Setembro para rectificar a informação sobre o lugar ocupado por Portugal entre os países da Europa mais envelhecidos.

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