Educação com dificuldade em ver ao longe
Despende-se muita energia a pensar na melhor forma de emendar o passado. E as medidas que são urgentes para atacar a crise dos professores tardam.
O ano lectivo começa outra vez com esta dúvida premente. Há professores? Quantos “furos” vão ter os alunos nos seus horários? Com quantas semanas de atraso arrancam face ao colega da escola ao lado?
O país começa a habituar-se à contabilidade recorrente da falta de professores. É mau que se habitue, porque nenhum sistema educativo resiste à falta de professores qualificados.
Todos sabem isto. E, no entanto, todas as energias dos diferentes actores essenciais nesta discussão, do Governo ao Presidente da República, dos sindicatos aos docentes que todos os dias constroem a escola, foram consumidas no último ano à volta de outra questão: a recuperação do tempo de serviço que esteve anos congelado e os moldes em que ela deve, ou não, acontecer.
Em educação, quem pensa, quem gere, quem cria, quem faz passa muito mais tempo a tentar emendar o passado do que a preparar o futuro. Uns porque sentem que deram muito e receberam pouco, outros porque têm de gerir o impacto na opinião pública das opções que tomam, das greves e protestos que enfrentam.
Pelo meio, ao primeiro mês de aulas, ao segundo mês de aulas, ao terceiro mês de aulas, vão sendo feitas as contas a quantos alunos ainda não têm aulas de Matemática ou Inglês.
O Ministério da Educação diz que houve decisões que farão com que corra melhor este arranque de ano lectivo. É claro que vincular mais docentes e acelerar certas progressões torna a vida de muitos melhor. Que o diga uma professora que entrevistamos nesta edição: aos 68 anos, entrou, por fim, nos quadros. Outros protagonistas, como os sindicatos, dizem que estamos ainda pior do que no ano passado. Também não é original. As próximas semanas se encarregarão de o confirmar ou desmentir.
Num caso e noutro, e este é o ponto, nunca estaremos a discutir em conjunto um plano de ataque, estrutural, à necessidade de conseguir 34 mil novos professores (idealmente bons professores) até 2030. Há muitos estudos encomendados pelo ministério e já entregues com propostas. Todos foram apresentados como “urgentes”. Mas basta ver como, por exemplo, os apoios à habitação para docentes em zonas particularmente carenciadas, como Lisboa e Algarve, tardam a sair do papel.
Para acabar, uma nota positiva: fala-se tanto dos milhares de alunos sem professores, que, este ano, foram mais os jovens que escolheram um curso superior na área da docência. Estarão disponíveis daqui a uns tempos para engrossar uma nova geração docente... Ou não. Se quem está na escola continuar “morto por sair”, como diz um director escolar nesta edição, mudarão facilmente de ideias.