EUA aceitam declaração do G20 para resguardar protagonismo de Modi
Recuo na linguagem sobre a invasão da Ucrânia em relação ao texto final da cimeira de 2022 é visto na Rússia como “um sucesso incondicional”.
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A maratona de negociações que levou os países do G20 a deixarem de fora uma condenação directa da invasão da Ucrânia pela Rússia na cimeira de líderes deste fim-de-semana em Nova Deli, na Índia, foi enquadrada, nos Estados Unidos e na Europa, como um mal menor para poupar o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, a um fracasso que poderia comprometer o seu papel agregador nas tensões entre o Ocidente e as potências emergentes na Ásia, África e América Latina.
"Washington fez os possíveis e os impossíveis para garantir que a Índia, seu parceiro cada vez mais próximo, não ficasse ligado à primeira cimeira do G20 sem uma declaração final conjunta", disse Sarang Shidore, director do instituto norte-americano Quincy, ao Financial Times.
Segundo o jornal, a Casa Branca e os seus aliados europeus "aceitaram o facto de não conseguirem fazer recuar Putin sozinhos", e "esforçaram-se" por acertar uma posição comum sobre a Ucrânia com as economias emergentes mais poderosas do mundo.
Neste domingo, altos representantes da Administração Biden e vários líderes europeus, incluindo o Presidente francês, Emmanuel Macron, procuraram desvalorizar o significado da declaração final da cimeira de Nova Deli, que se limita a condenar a ameaça ou o uso da força para a conquista de território "contra a integridade territorial e a soberania ou independência política de qualquer Estado" — uma redacção muito diferente daquela que foi incluída na declaração de 2022, em que "a agressão da Federação Russa contra a Ucrânia" foi alvo de uma condenação "muito forte", e em que foi exigida "uma retirada completa e incondicional da Rússia do território da Ucrânia".
Na altura, o chanceler alemão, Olaf Scholz, disse que a união demonstrada na cimeira de Bali reforçava o isolamento do Presidente russo, Vladimir Putin. No mesmo sentido, Macron disse neste domingo que a declaração da cimeira de Nova Deli "confirma, mais uma vez, o isolamento da Rússia".
"Hoje, uma maioria esmagadora dos membros do G20 condenaram a guerra na Ucrânia e o seu impacto", disse Macron numa conferência de imprensa após o final da reunião de líderes. Ao mesmo tempo, o Presidente francês disse que o G20 "não é um grupo talhado para discussões políticas, mas sim para debater questões económicas e as alterações climáticas".
Na Ucrânia, a declaração final foi recebida com natural desagrado, ainda que porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros do país, Oleg Nikolenko, tenha agradecido "aos parceiros que tentaram incluir uma linguagem mais forte no texto".
"O G20 não tem nada para se orgulhar na parte sobre a agressão russa contra a Ucrânia", disse Nikolenko. "A participação de uma delegação ucraniana teria permitido que os participantes percebessem melhor a situação."
E se o recuo em Nova Deli na condenação explícita da Rússia é vista, no Ocidente, como um exemplo de pragmatismo e um sinal de que é possível impedir a desagregação de grupos internacionais como o G20 sem deixar de condenar a invasão da Ucrânia, a narrativa em Moscovo vai no sentido oposto.
Segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, o texto final da cimeira de Nova Deli representa "um sucesso incondicional" para a Rússia. "Sim, a crise na Ucrânia foi mencionada, mas apenas no contexto da necessidade de solucionar todos os conflitos que existem no mundo", disse Lavrov.