O bom sabor da multiculturalidade
Como se promove o gosto pela descoberta do outro que é bem diferente de mim? Como se sente que o maior desafio na minha sala de aula, que não é de Português, é a língua portuguesa?
Um destes dias li uma coluna sobre educação, num jornal semanal, que falava sobre os números de alunos há uns anos e as previsões que eram feitas para o futuro. Eram números que pouco entusiasmavam e previsões nada animadoras: com a população portuguesa a envelhecer e a natalidade a diminuir.
O que também essa mesma coluna referia era o número crescente de alunos nas nossas escolas, devido à imigração oriunda dos quatro cantos do mundo, para ser concreta, de dois cantos do mundo: o Brasil e o Bangladesh, e outros do Sul da Ásia.
A vida é realmente uma surpresa e merece ser vivida à medida que vai acontecendo e não antecipadamente. O desafio da multiculturalidade reclama a integração, a flexibilidade, a aculturação, a abertura e, sobretudo, o descobrir o que é melhor para cada um.
É neste contexto que já vivem muitas escolas públicas portuguesas. Um destes dias do mês passado, a propósito de um projecto Erasmus+ estive à conversa com um director de uma escola pública TEIP que me dizia que o seu maior desafio não era a indisciplina, era a multiculturalidade, onde as prioridades eram a integração social e, em termos de aprendizagens, a aprendizagem da língua portuguesa, pois sem essa aquisição feita, nada do resto iria funcionar.
Como se ensina a apreciar a diferença? Como se promove o gosto pela descoberta do outro que é bem diferente de mim? Como se sente que o maior desafio na minha sala de aula, que não é de Português, é a língua portuguesa?
A multiculturalidade é uma das facetas da educação para a paz, no sentido em que é visto com bons olhos a criação de espaços onde a cultura das minorias possa ser plenamente vivida no país de acolhimento. Não tem a ver com tolerância, mas com reconhecimento, apreciação e respeito.
As diferenças completam-nos mais do que normalmente pensamos. Temos tendência para procurar aqueles que são iguais a nós, que pensam como nós e que são do mesmo estrato social e económico que nós. Ou seja, aqueles que em nada nos acrescentam e que apenas irão abanar a cabeça a tudo o que dissermos e vice-versa. Quando isto acontece deixamos de aprender e quando deixamos de aprender, deixamos de crescer.
O desafio de conviver com aqueles que são diferentes, faz-nos questionar as nossas crenças inabaláveis do ‘ter que fazer’ e do ‘tem que ser assim, pois sempre foi assim’. É como que se nos desresponsabilizássemos das nossas acções com a justificação de hábitos da nossa cultura, mas que não tem a ver com a minha própria vontade. Quando perante outras formas de vida, de hábitos, aprendemos que podemos viver de outras maneiras; o mesmo acontecendo com aqueles que se querem integrar na nossa sociedade.
Na altura da escola, as amizades que se fazem crescem e formam-se ao mesmo tempo que a personalidade vai tomando maturidade e definição. Há amizades de escola que ficam para a vida, todos sabemos. Algumas delas podem não ser de encontros frequentes, mas sabemos por onde andam e que estão lá para o que for preciso. Outras acompanham praticamente o nosso dia-a-dia.
Na vida adulta, o nosso pensamento, o nosso coração, a nossa empatia terá expandido de tal forma que a diferença possa fazer parte da nossa simples realidade. Será difícil fazer guerra com aqueles com quem crescemos ou com seus irmãos e que consideramos como irmãos também.
A educação para a paz começa em casa, na escola, em pequeno grupo e círculos restritos. Começa mesmo no nosso coração.
Neste aspeto da escola, do aumento do número de alunos e da subida da natalidade, a multiculturalidade e a imigração em si mesma é um bem que nos está a acontecer. E um desafio constante aos professores, educadores e pais, que convivem e trabalham com toda esta diversidade. O acolhimento da diversidade torna-nos mais unidos e coesos. A unidade na diversidade tem mais sentido.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990