Número de prescrições e idas às urgências pode vir a ter impacto no pagamento a médicos de família
Com a generalização das unidades de saúde familiar B, médicos temem que a sua remuneração fique associada a variáveis que não dependem deles, de acordo com o Jornal de Notícias.
Quando, no final do mês de Junho, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, foi ao Parlamento, disse que, até ao final deste ano, com a passagem das unidades de saúde familiar (USF) modelo A para o modelo B, a remuneração dos seus profissionais passaria a estar associada ao desempenho. E que isso permitiria a 250 mil utentes ganharem médico de família.
Agora, e perante o que já é conhecido dessas alterações, o facto de a remuneração ter em conta variáveis que não dependem dos médicos está a criar apreensão entre os profissionais. Os médicos vêem nestas novas regras um risco de “insegurança remuneratória”, escreve o Jornal de Notícias (JN) na edição desta quinta-feira.
O jornal, que teve acesso a um anexo ao anteprojeto de decreto-lei que generaliza as USF-B e que está em discussão com os sindicatos, escreve que as idas dos utentes às urgências, os internamentos não-imprescindíveis e as prescrições em excesso de medicamentos e exames poderão influenciar de forma negativa a remuneração variável dos médicos.
Estes são indicadores que constam do diploma que vai generalizar o modelo B de USF, uma medida bem acolhida quando foi anunciada, no fim do mês de Junho, como recorda o JN. Mas que agora está a causar preocupação.
O jornal explica que, no caso dos médicos, as alterações nos indicadores de desempenho assistencial e integração de cuidados, com impacto na remuneração, são as que mais preocupam.
Entre outros indicadores enunciados estão a despesa média de medicamentos prescritos e comparticipados e a despesa média baseada no preço convencionado de exames prescritos, por exemplo. Mas também a taxa de internamentos que podiam ser evitados nos adultos e a taxa de resolução da USF para a doença aguda, que compara a resposta das consultas agendadas no próprio dia e as idas à urgência sem referenciação do médico de família.
Internamentos “não-imputáveis” a médicos
Para Hugo Cadavez, do Sindicato Independente dos Médicos, as regras previstas geram “insegurança remuneratória.” Também em declarações ao JN, Carla Silva, da Federação Nacional de Médicos, entende que “o ordenado do médico não pode depender dos medicamentos ou exames que prescreve” e que isso “é perverso”.
E justifica que, da mesma forma, “há muitos factores que levam ao internamento dos utentes”, tais como as dificuldades económicas, as más condições das casas, o isolamento, “que são responsabilidades do país e não podem ser imputadas aos médicos”.
Entre outros, também André Rosa Biscaia, presidente da Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiar (USF-AN), foi ouvido, e disse que, ao lançar o espectro de uma diminuição do rendimento, depois da diminuição de 25% do poder de compra das equipas de saúde familiar desde 2007, existe o risco de estas alterações reforçarem a saída de médicos para o estrangeiro, para o sector privado ou para a reforma.
A posição do ministério
Ouvido na Comissão Parlamentar da Saúde, a 28 de Junho, Manuel Pizarro, previu que as novas regras resultariam num aumento dos médicos “muito variável”, que, nalguns casos, podiam ultrapassar os 60%.
Ao JN, o Ministério da Saúde explicou agora que a actualização dos indicadores em vigor há 16 anos visa “garantir que o acesso, qualidade, eficiência e integração dos cuidados proporcionados às pessoas estão ajustados às necessidades presentes e futuras dos cidadãos”.