Milhares de condutores obrigados a entregar a carta vão ser amnistiados

Perdão da “sanção acessória” aplica-se independentemente da idade do condutor, desde que a infracção tenha sido praticada até 19 de Junho e o valor máximo da multa aplicável não supere os mil euros.

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Infractores vão continuar a perder pontos da carta e a pagar a multa, aspectos não abrangidos pela amnistia. PAULO PIMENTA
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A lei da amnistia aprovada pelo Parlamento devido à realização da Jornada Mundial da Juventude, no início deste mês em Portugal, vai beneficiar milhares de condutores que foram ou ainda vão ser sancionados com uma inibição de conduzir durante um certo período, por terem cometido uma infracção de trânsito grave ou muito grave.

O perdão da chamada “sanção acessória” aplica-se independentemente da idade do condutor, desde que a infracção tenha sido praticada até 19 de Junho passado e, em abstracto, o valor máximo da multa aplicável não supere os mil euros, confirmou ao PÚBLICO a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, responsável pela tramitação das infracções de trânsito.

Mas fique já claro: o montante a pagar devido à contra-ordenação não é abarcado pela amnistia. Daí que continua a ser obrigatório o pagamento das multas de trânsito, independentemente de serem infracções leves, graves ou muito graves.

Mas se para as leves a sanção é apenas um montante em dinheiro, no caso das graves e muito graves, além disso, pode significar ter que entregar a carta por um período que pode variar entre um mês e dois anos, consoante a gravidade da contra-ordenação. É esta sanção acessória que será perdoada pela lei publicada no passado dia 2 em Diário da República (Lei 38-A/2023).

Na primeira proposta que o Governo fez chegar ao Parlamento estava prevista a amnistia às “contra-ordenações cujo limite máximo de coima aplicável” não excedesse “os mil euros”. Essa versão incluía o pagamento das multas e as sanções acessórias. Mas acabou por não vingar.

O perdão efectivamente aprovado abarca apenas a sanção acessória associada a uma multiplicidade de infracções, como alguns excessos de velocidade; o desrespeito das regras relativas à distância entre veículos, da cedência de passagem, à mudança de direcção, à inversão do sentido de marcha; a paragem ou o estacionamento nas bermas das auto-estradas e o transporte de menores sem as cadeiras de protecção, entre muitas outras.

Destas, as inibições de conduzir aplicadas na sequência da prática de infracções graves por excesso de velocidade são das mais comuns. Aqui incluem-se as situações em que um automobilista é apanhado a guiar, fora de uma localidade, a uma velocidade que supera os limites legais entre os 31 e os 60 km/h. Ou é detectado a conduzir dentro de uma localidade a mais 21 km/h e até mais 40 km/h do que devia.

Não se sabe número de beneficiários

O último Relatório Anual de Segurança Interna permite perceber a dimensão deste tipo de infracções. Foram detectados o ano passado e em 2021, em média, 80 mil excessos de velocidade graves através do sistema de radares controlado pela ANSR (há ainda os radares das polícias). A ANSR não consegue precisar quantos condutores podem ser abrangidos por esta amnistia, mas indica que em 2021 foram aplicadas 302.378 sanções acessórias e o ano passado 284.814. Apesar de nem todas estas inibições de conduzir estarem abrangidas pela amnistia, o número de beneficiários será sempre na ordem dos milhares.

O perdão deixa de fora os excessos de velocidade classificados como muito graves, que são sancionados com uma coima mínima de 300 euros e uma máxima de 1500 euros, exemplifica a ANSR num texto enviado ao PÚBLICO. Isto porque o limite máximo da multa excede os mil euros. O mesmo acontece com quem for apanhado a conduzir enquanto fala ao telemóvel ou a ultrapassar pela direita, infracções punidas com um máximo que supera os mil euros.

O que releva para ser ou não beneficiário da amnistia é a moldura da multa e não o valor aplicado no caso concreto, que até pode ser inferior aos mil euros. Por exemplo, se um condutor for apanhado dentro de uma localidade a mais 42 km/h (uma infracção muito grave) do que os limites legais e nunca tiver cometido um contra-ordenação grave antes, até pode ser sancionado com a coima mínima de 300 euros, mas nem assim ficará isento de entregar a carta, se a sanção acessória for aplicada. Isto porque o máximo previsto é de 1500 euros e é este limite que determina se a amnistia se aplica ou não.

No esclarecimento enviado ao PÚBLICO, a ANSR alerta que o perdão, que entra em vigor a 1 de Setembro, “não isenta o pagamento da coima, o qual deve ocorrer sempre e no prazo estabelecido, nem isenta o registo da infracção no Registo de Infracções do Condutores nem a perda de pontos, a qual se continua a registar”.

O facto de a lei da amnistia entrar em vigor apenas a 1 de Setembro faz com que quem já entregou a sua carta e for abarcado pela amnistia possa ir levantá-la a partir desse dia, no local onde a entregou, mesmo que o período de inibição ainda não tenha terminado.

Quem tiver que entregar a carta a partir de 1 de Setembro e for abarcado pela amnistia já não terá que o fazer porque “o perdão será aplicado de forma automática”, precisa a ANSR. No entanto, a contra-ordenação ficará no Registo de Infracções do Condutor e terá efeitos a nível da perda de pontos.

Nos processos que estiverem pendentes de decisão, a autoridade continuará a ter de decidir se condena ou não o infractor numa inibição de conduzir e, se sim, durante quanto tempo. No entanto, nos casos abarcados pela amnistia os condutores não terão de entregar a carta, mas ficarão com a infracção registada e sem os pontos que ela implicar.

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