Jovens a sair mais cedo de casa dos pais: um número, muitas dúvidas
Os números nunca contam a história toda e não dizem, por exemplo, por que razão os jovens estão a sair de casa dos pais mais cedo. Será que foram à procura de emprego (e o encontraram) fora do país?
Em 2022, os jovens portugueses já não saíram de casa dos pais aos 33,6 anos, em média, como acontecia um ano antes. Em escassos 12 meses, a idade recuou de forma vertiginosa para os 29,7 anos e Portugal deixou de encimar a lista dos países da União Europeia (UE) no que diz respeito à idade tardia em que os filhos deixam o domicílio familiar.
Nesse campeonato, fomos ultrapassados por Estados-membros como a Croácia (33,4 anos), a Eslováquia (30,8), a Grécia (30,7) e Espanha (30,3), entre outros. Apesar de estarmos agora na oitava posição do ranking, continuamos 40 meses acima da média europeia, que é de 26,4 anos.
Os dados são do Eurostat e parecem uma boa surpresa. Talvez demasiado boa num país em que as notícias sobre o preço incomportável das casas e o elevado valor das rendas se sucedem, em que há estudantes que não seguem para o ensino superior por causa do preço dos quartos e em que é a precariedade que sustenta a criação de emprego.
Acresce que, também em Portugal, os salários dos sub-30 continuam a não se distinguir pela positiva. De acordo com números revelados em Janeiro deste ano pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, mais de 50% dos trabalhadores portugueses receberam salários inferiores a 1000 euros em 2022, uma percentagem que sobe para 65% no caso dos jovens com menos de 30 anos. O salário médio declarado à Segurança Social era no ano passado de 1269,34 euros.
Ouvido pelo PÚBLICO, o sociólogo Pedro Góis desvaloriza o que acredita ser uma “oscilação de meses” e mostra-se pouco optimista com os dados do inquérito do Eurostat: “Não é difícil percebermos que, não se alterando questões estruturais [precarização do mercado de trabalho e preços da habitação], esta tendência não desaparecerá nos próximos anos.”
Os números nunca contam a história toda e não dizem, por exemplo, por que razão ou razões os jovens adultos estão a sair de casa dos pais quatro anos mais cedo. Será que foram à procura de emprego (e o encontraram) fora do país? Ajudará a emigração a explicar este fenómeno do Eurostat? Foi um episódio de meses cuja explicação está por apurar? Ou estará a aumentar o recurso à partilha de casas? Há obviamente dúvidas que importará esclarecer num segundo momento, cruzando estes dados com outros, à medida que forem sendo conhecidos.
O que pode ser interessante, como diz António Brito Guterres, também sociólogo, é tentar responder às questões que estes dados levantam.