Junta militar do Níger acusa França de violação do seu espaço aéreo

Golpistas denunciam um plano para desestabilizar o país. Antigo líder rebelde anuncia criação do Conselho de Resistência para a República com o fim de reinstaurar o Presidente deposto.

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As palavras de ordem contra a França, a antiga potêncial colonial, têm-se multiplicado nas manifestações favoráveis ao golpe Reuters/STRINGER
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A junta militar do Níger acusou, esta quarta-feira, a França de violar o seu espaço aéreo como parte de um plano mais amplo para desestabilizar o país, intensificando de tal forma a retórica que deixa pouca esperança de uma rápida resolução diplomática da crise.

A acusação foi feita em vídeo pelo oficial do Exército Amadou Abdramane, que, no entanto, não apresentou quaisquer provas e surge num momento de grande tensão, com os chefes de Estado da África Ocidental a prepararem-se para discutir as opções em cima da mesa, incluindo a intervenção militar, numa cimeira extraordinária da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), na quinta-feira.

"Aquilo a que estamos a assistir é a um plano para desestabilizar o nosso país", afirmou Abdramane na declaração, acusando a França de tentar minar a credibilidade da junta aos olhos do povo e de criar um clima de insegurança.

Não é a primeira vez que os líderes do golpe no Níger acusam a França de violar o seu espaço aéreo, algo que Paris tem sistematicamente negado. Não houve reacção imediata por parte da França a esta nova acusação.

Horas antes, surgiu a notícia de que um antigo líder rebelde tinha lançado um movimento contra a junta, que tomou o poder num golpe a 26 de Julho – o primeiro sinal de resistência interna ao domínio militar neste país de importância estratégica na região do Sahel.

O Níger é o sétimo maior produtor mundial de urânio, o combustível mais utilizado na energia nuclear. Também extrai 20.000 barris de petróleo por dia, na sua maioria em campos geridos por empresas chinesas, e espera um aumento significativo na produção através de um novo oleoduto de exportação para o Benim.

A retórica antifrancesa tem sido uma característica de outros golpes na região nos últimos dois anos, incluindo no Mali e no Burkina Faso, cujos líderes militares apoiam os generais agora no comando em Niamey.

A França tem militares no Níger, assim como Estados Unidos, Itália e Alemanha, como parte dos esforços internacionais para combater os insurgentes islamitas que devastam a região do Sahel, sob acordos com o agora deposto Governo civil.

A junta já revogou vários pactos militares com a França, mas Paris rejeitou essa decisão, afirmando que não foi tomada pelas autoridades legítimas do Níger.

Desafios

O golpe foi desencadeado por dinâmicas políticas internas, embora se tenha transformado rapidamente num drama internacional, com a CEDEAO, as Nações Unidas e países ocidentais a exercerem pressão sobre a junta para que recue, ao mesmo tempo que Mali e Burkina Faso prometeram defendê-la.

A política interna também se tornou mais complexa na quarta-feira, com o antigo rebelde Rhissa Ag Boula a anunciar a criação de um novo Conselho de Resistência para a República (CRR), com o objectivo de reinstaurar o Presidente deposto, Mohamed Bazoum, que tem estado detido na sua residência desde a tomada de poder pelos militares.

"A tragédia de que o Níger é vítima foi orquestrada por pessoas encarregadas de o proteger", afirmou Ag Boula, acrescentando que o CRR usará "todos os meios necessários" para impedir que os militares neguem ao povo do Níger a sua livre escolha.

O desafio de Ag Boula levanta o espectro de um conflito interno no Níger, que, até ao golpe, era um aliado importante do Ocidente numa região onde outros países se voltaram contra os aliados ocidentais, especialmente a França, e se aproximaram da Rússia.

As potências ocidentais receiam que a influência russa possa fortalecer-se se a junta no Níger seguir o exemplo do Mali ao expulsar tropas ocidentais e convidar mercenários do grupo Wagner da Rússia.

Até agora, a junta rejeitou avanços diplomáticos de enviados africanos, norte-americanos e das Nações Unidas.

Para quinta-feira, os chefes de estado da CEDEAO têm agendada uma reunião na capital nigeriana, Abuja, com o objectivo de discutir o Níger, incluindo o possível uso da força para restaurar a ordem constitucional.

O CRR apoia a CEDEAO e quaisquer outros actores internacionais que procurem pôr fim ao domínio militar no Níger, afirmou Ag Boula, acrescentando que o conselho se disponibilizaria para qualquer propósito útil para o bloco.

Ag Boula desempenhou um papel de liderança nos levantamentos dos tuaregues, um grupo étnico nómada presente no Norte desértico do Níger, nas décadas de 1990 e 2000. Tal como muitos ex-rebeldes, foi integrado no Governo sob Bazoum e o seu antecessor, Mahamadou Issoufou.

O golpe já levou ao encerramento das fronteiras e do espaço aéreo, o que cortou o fornecimento de medicamentos e alimentos, dificultando a ajuda humanitária num dos países mais pobres do mundo.

O Presidente da Nigéria e presidente da CEDEAO, Bola Tinubu, impôs mais sanções ao Níger na terça-feira, visando pressionar entidades e indivíduos envolvidos na tomada de poder, e disse que todas as opções continuavam em cima da mesa. Reuters

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