Um ano para ver, ouvir, ler Mário Cesariny

Calendário das celebrações em torno do autor de Pena Capital, cujo centenário de nascimento se assinala esta quarta-feira.

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Artista e poeta Mário Cesariny eduardo tomé/cortesia fundação cupertino de miranda
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Agosto

Inaugurada no passado sábado, dia 5, a exposição Mário Cesariny: Em todas as ruas te encontro é a primeira grande iniciativa do centenário, e irá atravessar, em diferentes formatos e locais, todo o ano de comemorações, até Setembro de 2024.

A Fundação Cupertino de Miranda (FCM), casa do Centro Português do Surrealismo, acolhe o essencial do espólio de Cesariny, incluindo mais de 200 obras de arte, milhares de documentos, fotografias e objectos variados, e ainda a sua biblioteca pessoal, em cujos livros o poeta gostava de intervir, dando-lhes novas capas, desfigurando outras, ou comentando os temas mais díspares numa criativa e proliferante marginália. Foi assim possível reunir nesta exposição, cujo título recupera o primeiro verso de um poema de Pena Capital (1957), muitas das obras mais representativas da criação plástica de Cesariny, desde os seus pioneiros trabalhos dos anos 40 até às suas últimas obras, e juntar-lhes papéis, objectos, e ainda alguns livros intervencionados. Algumas destas peças irão em Outubro para o MAAT, em Lisboa, onde integrarão a exposição O Castelo Surrealista, e uma parte delas será depois mostrada em Amarante e Coimbra. Mas manter-se-á sempre aberta na FCM, incorporando novas peças para substituir as emprestadas. Para acompanhar (e perpetuar) a exposição –que tem curadoria de Marlene Oliveira, directora artística da FCM, Perfecto Cuadrado, coordenador do centro Português do Surrealismo, e João Pinharanda, director artístico do MAAT​, a FCM editou um volumoso catálogo.

Nesta quarta-feira há visita guiada à exposição e uma leitura de poemas de Mário Cesariny pelo diseur Isaque Ferreira. E o visitante pode aproveitar para visitar também o espaço permanente que a fundação dedica a Cesariny, onde encontra uma espécie de altar surrealista montado com os objectos que este tinha em casa, e que reproduz fielmente o seu ambiente doméstico, como se pode constatar nas fotografias de Duarte Belo expostas no mesmo local.

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Fundação Cupertino de Miranda acolhe o essencial do espólio de Cesariny, incluindo a sua biblioteca pessoal, em cujos livros o poeta gostava de intervir, dando-lhes novas capas, desfigurando outras cortesia fundação cupertino de miranda

Em Lisboa, a Casa da Liberdade – Mário Cesariny (CL-MC) e a vizinha galeria Perve, em Alfama, celebram nesta quarta-feira o dia em que Cesariny faria cem anos com a inauguração, pelas 18h00, de duas exposições, com curadoria de Carlos Cabral Nunes, que dirige ambas as instituições. Primeira Pessoa, na CL-MC, mostra pinturas, esculturas e outras obras visuais do artista, mas também fotografias, poemas e correspondência, como a que o poeta manteve com a escultora e poeta surrealista Isabel Meyrelles, ou a que trocou com a compositora e artista plástica Yoko Ono, que lhe encomendou uma peça para uma homenagem a John Lennon em Nova Iorque. Já na Perve Galeria, a mostra … E os Seus Contemporâneos aborda as relações de Cesariny com surrealistas portugueses e estrangeiros, expondo mais de uma centena de obras, incluindo trabalhos de artistas africanos de língua portuguesa que “denotam afinidades” com a produção artística do homenageado, como o cabo-verdiano Manuel Figueira ou os moçambicanos Ernesto Shikhani, Inácio Matsinhe, Malangatana Ngwenya e Reinata Sadimba.

No âmbito destas exposições será mostrado pela primeira vez, anuncia a Casa da Liberdade, um núcleo de obras e documentos das décadas de 1940 e 1950 que integram o recém-doado acervo de João Artur da Silva, que participou em 1949 na primeira exposição do grupo surrealista dissidente de Cesariny, Cruzeiro Seixas, António Maria Lisboa ou Mário-Henrique Leiria, e que vive há muito no Canadá.

Rádio

Há mais de um mês que o programa O Impérios dos Sentidos, de Paulo Alves Guerra, na Antena 2, vem emitindo diariamente (às 8h00 e 9h00) um poema de Cesariny dito na sua própria voz. O ciclo termina esta quarta-feira com um último poema, mas Cesariny voltará a ser evocado pelas 18h00, numa entrevista ao coordenador do Centro Português do Surrealismo, o crítico e tradutor espanhol Perfecto E. Cuadrado.

Poesia e música

Antecipando o lançamento, sexta-feira, do disco Os Poetas – O Homem em Eclipse, com gravações de poemas de Cesariny na sua própria voz ou ditos pelo actor Miguel Borges, e acompanhamento musical dos sintetizadores de Rodrigo Leão e do acordeão de Gabriel Gomes (acordeão), os responsáveis do projecto apresentam esta quarta-feira à tarde um espectáculo na Cinemateca de Lisboa, pelas 18h00.

Outubro

No MAAT – Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia, em Lisboa, é inaugurada no dia 3 a exposição O Castelo Surrealista, a segunda grande exposição do programa oficial de comemorações, novamente com curadoria partilhada do MAAT e da Fundação Cupertino de Miranda, aqui com a colaboração de Afonso Dias Ramos, co-curador da exposição e que coordena o catálogo que será lançado na ocasião. Juntando obras de Cesariny, muitas delas vindas da FCM, com peças de artistas portugueses e estrangeiros de várias épocas, esta mostra Castelo Surrealista – título do livro que Cesariny dedicou a Vieira da Silva e Arpad Szenes – propõe-se mostrar afinidades e reconstituir influências. Trabalhos de Vieira da Silva ou Cruzeiro Seixas convivem com peças de André Breton, Jean Dubuffet, Edouard Jaguer, Viktor Brauner, ou mesmo da romancista francesa Georges Sand, representada com uma das suas pinturas proto-automáticas de paisagens imaginárias. Sem que se cristalize demasiado expressamente, subjaz a esta exposição a ideia de castelo, com as suas salas do trono e da guarda, as masmorras ou a tradicional galeria com os retratos dos antepassados.

No dia 5 estreia-se no MAAT Corpo Visível, espectáculo da Boca Associação Cultural, que parte do livro de estreia de Mário Cesariny para propor uma criação transdisciplinar que associa poesia, pintura e música.

Novembro

Ainda sem data marcada, estão previstas duas sessões de Conversas em torno de Mário Cesariny na Fundação Cupertino de Miranda, a primeira com o investigador e poeta António Cândido Franco, autor de uma recente biografia de Cesariny editada pela Quetzal – O Triângulo Mágico –, e a segunda com o historiador e crítico de arte Bernardo Pinto de Almeida.

Dos vários projectos de edição de antologias de Cesariny no estrangeiro – designadamente em Espanha, Itália e Estados Unidos –, o lançamento no dia 19 de Mário Cesariny, Devoir de Parole​, antologia bilingue, publicada pelas edições Chandeigne, com traduções de Bernardo Haumont e prefácio de Emília Almeida, tem já data marcada para o icónico Théâtre de la Ville, em Paris, dirigido pelo encenador Emmanuel Demarcy-Mota.

Entre os dias 23 e 26, dois momentos habituais na agenda da FCM, os Encontros Mário Cesariny – que começaram a ser organizados logo após a sua morte e chegam agora à 17.ª edição – e o programa bienal Carmina, dedicado à poesia, confluem agora nas mesmas datas para homenagear o poeta de Pena Capital. Ambos coordenados por Fernando Cabral Martins, o programa Carmina propõe cinco mesas-redondas, respectivamente dedicadas aos temas Imagem, Arte, Poesia, Poética e Fernando Pessoa. Rosa Maria Martelo, Perfecto Cuadrado, Ilda David, João Pinharanda, José Manuel dos Santos, Manuel Rosa, António Gonçalves, Afonso Dias Ramos, Joana Matos Frias, Emília Pinto de Almeida, Golgona Anghel, Gustavo Rubim, Tania Martuscelli, Rui Sousa, Pedro Eiras, Mariana Pinto dos Santos, António Feijó e Richard Zenith são, por ordem de entrada em cena, os oradores previstos.

Com uma programação diversificada, que inclui oficinas de expressão plástica e leituras de poesia, os Encontros terão o seu ponto alto no lançamento de três livros organizados por Fernando Cabral Martins: uma grande antologia da poesia de Cesariny, A Paixão da Imagem, a edição de uma espécie de peculiaríssima antologia da literatura portuguesa que o poeta organizou logo após o 25 de Abril de 1974, e que quis, sem sucesso, materializar numa peça de teatro, e depois em programas de televisão – chamar-se-á Poetas do Amor, da Revolta e da Náusea –, e um volume com as cartas de Cesariny para o escritor italiano Antonio Tabucchi, pioneiro no estudo e divulgação dos poetas surrealistas portugueses. Apoiadas pela Fundação Cupertino de Miranda, as duas antologias terão a chancela da Assírio, e a correspondência sairá na Documenta.

Estreia-se no dia 25 a peça de teatro Herói É o Meu Nome, da Fértil – Associação Cultural, companhia famalicense que cruza o teatro e a antropologia. A peça, com direcção artística de Rui Leitão, parte do verso inicial do poema Herói – “Herói e o meu nome” –, originalmente publicado no livro Discurso sobre a Reabilitação do Real Quotidiano (1952).

A 26, dia em que se cumprem 17 anos sobre a morte do poeta, Rodrigo Leão e Gomes, acompanhados no palco por outros músicos, apresentam Os Poetas, um concerto inteiramente dedicado à poesia de Cesariny, na Fundação Cupertino de Miranda.

2024

Em Março, ainda sem data precisa, inaugura no Museu Municipal Amadeo Souza-Cardoso, em Amarante, uma exposição com obras de Mário Cesariny da colecção da Fundação Cupertino de Miranda. E em Junho, a mesma exposição transita para o Centro de Arte Contemporânea de Coimbra.

Também em 2024, possivelmente no Verão, o livro Louvor e Simplificação de Mário Cesariny, de José Manuel dos Santos e Perfecto Cuadrado, vai ser lançado pela Documenta e pela Fundação Cupertino de Miranda. Uma fotobiografia que promete ser tão pouco convencional como o foto-biografado.

Notícia corrigida com nome completo de Afonso Dias Ramos. E com correcção de nome de Bernardo Haumont.

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