“Já viu um OVNI?” Roo Lewis encontrou vida “extraterrestre” em Gales

O fotolivro Port Talbot UFO Investigation Club, de Roo Lewis, expõe a cidade que o actor Michael Sheen apelidou de “Área 51” galesa.

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©Roo Lewis
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À beira-mar plantada, a cidade de Port Talbot, em Gales, é conhecida por muitos motivos. Para além de ser o local onde nasceram ou cresceram os conhecidos actores Richard Burton, Anthony Hopkins ou Michael Sheen, é, graças ao último, também uma cidade famosa pelo número de avistamentos de OVNIs.

Michael Sheen afirmou, em 2019, numa entrevista a um podcast, que Port Talbot é uma espécie de “área 51” galesa. “Acredito que esteja marcada num mapa alienígena estranho”, afirmou o actor que fez parte do elenco dos filmes como A Rainha, de Stephen Frears, ou Meia-noite em Paris, de Woody Allen.

“É uma espécie de zona de paragem”, conjecturou, recordando o dia em que, há muitos anos, ao chegar a casa, vindo da escola, viu uma formação de pontos de luz no céu que se dirigiu até ao mar e desapareceu abruptamente. O actor contou também que o pai avistou um OVNI na cidade, em 2014. “Ele não iria inventar isto”, garantiu.

O fotógrafo britânico Roo Lewis tem, desde criança, uma ligação a Port Talbot. “Costumava passar pela cidade de carro porque o meu avô é galês e nós íamos visitá-lo numa cidade vizinha”, contou ao P3, em videochamada a partir de Londres. “Com os narizes colados ao vidro do carro, eu e o meu irmão víamos a enorme paisagem industrial de Port Talbot e pensávamos que era uma estação espacial. E o meu avô confirmava que sim, que era mesmo uma estação espacial.”

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"Blue Steel". "Quando está em funcionamento, sentes-te vivo - consegue-se sentir a energia a atravessar o corpo todo. Com alguma sorte, podes estar lá quando ligam as luzes. O Sol põe-se rapidamente no sul de Gales, e mesmo antes de se pôr, brilha mais." ©Roo Lewis

Durante anos, Roo manteve-se afastado destas paragens. No entanto, graças a um projecto fotográfico que desenvolvia nas proximidades, acabou por ter de ficar alojado em Port Talbot. “Assim que visitei pensei ‘uau, tenho de regressar’.” Não é como ir a Paris, adverte, mas vale a pena visitar. “Existe uma certa energia no ar” e “pessoas muitíssimo amáveis”. “É uma cidade muito pequena [com menos de 150 mil habitantes], mas dela saíram muitos actores, músicos, personalidades televisivas e do mundo do desporto que alcançaram a fama”, observa. “Assim sendo, o que terá a cidade de especial para produzir tantos ícones?”

"Washing Line". A poeira da siderurgia cobre as roupas que estão estendidas quando é libertada. Há três sirenes que soam antes da fornalha ser aberta. ©Roo Lewis
Jonny Lovejet está nas dunas a usar o seu fato de protecção contra a radiação parecido com aquele que se usa no interior da siderurgia. A fotografia foi feita quando as areias do deserto Sara invadiram os céus do Reino Unido, conferindo ao céu uma tonalidade alaranjada ou rosada. No Verão de 1988, Jonny Lovejet teve um avistamento de OVNI. ©Roo Lewis
"Reservoir". Natalie boia no reservatório que tem vista para a cidade. Natalie viu um OVNI numa noite de Verão de 1996, em Port Talbot. "Em segundos, uma espécie de nave flutuou sobre as nossas cabeças, cobrindo todo o céu, antes de sair disparado à velocidade da luz. Penso nessa noite com regularidade, mesmo 27 anos após o sucedido." ©Roo Lewis
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"Washing Line". A poeira da siderurgia cobre as roupas que estão estendidas quando é libertada. Há três sirenes que soam antes da fornalha ser aberta. ©Roo Lewis

A criação de Port Talbot UFO Investigation Club

Partiu à descoberta da resposta em Fevereiro de 2021. Para contactar os membros da comunidade, Roo Lewis precisava de um gancho, algo que captasse a sua atenção e abrisse uma porta para as suas vidas e mentes. “É difícil conhecer pessoas ali”, conta. “Numa cidade como Londres, é possível usar as redes sociais e conhecer gente, mas em Port Talbot as redes não se usam dessa forma.” Decidiu colar nas ruas anúncios com a inscrição “Já viu um OVNI? Queremos ouvir a sua história”, acompanhado de um contacto telefónico e de e-mail. E foi assim que quebrou o gelo e começou a receber os primeiros contactos.

“Acho que toda a gente tem uma atracção quase inata pelo tema”, conta, “e eu acho que abordá-lo provoca sempre uma reacção genuína”. “Algumas pessoas pensam imediatamente em extraterrestres, outras vão para as teorias em torno dos segredos dos governos, outros para a ideia de Deus.” Há também quem seja simplesmente céptico e não acredite em nada. “As respostas que obtenho são sempre inofensivas”, observa. “O tema provoca uma forte reacção, mas sem agenda política, sem viés, sem que implique a divisão que ultimamente se instala numa mesa redonda.”

Roo, que é formado em Filosofia, acredita que o tema dos objectos voadores não-identificados toca algo de metafísico. “Diz muito sobre alguém aquilo que pensa sobre o assunto, torna-se possível conhecer melhor uma pessoa a partir deste tema”, justifica. Para o britânico, conhecer bem as pessoas que retrata é algo muito importante. “Fazer um retrato é um processo colaborativo. Eu quero que a pessoa se reveja no retrato que eu faço e que queira pendurá-lo na parede da sala. Para que isso aconteça, ela precisa de tempo para brilhar na minha presença, de tempo para contar a sua história.”

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Vista sobre a cidade às 8 da noite, a partir de Mynydd Dinas ©Roo Lewis

Embora existam relatos de avistamentos de OVNI das pessoas que retratou nas legendas das imagens do fotolivro, Roo afirma que este se debruça mais sobre “a história de uma cidade, do seu folclore e das pessoas que nela vivem” do que sobre o fenómeno extraterrestre. O clube que dá nome ao fotolivro editado pela Gost, Port Talbot UFO Investigation Club, a ser lançado em Setembro de 2023, é usado, sobretudo, como um pretexto para mergulhar e conhecer a comunidade e os mitos que a sustentam.

Há vida extraterrestre em Gales?

“Os galeses são grandes contadores de histórias”, enuncia Roo Lewis. “E eu ouvi muitas histórias, algumas verdadeiras e outras não. Numa delas, o George Lucas, o criador da Guerra das Estrelas, tinha visitado Port Talbot – o que já soa duvidoso – e viu as gruas nas docas e criou os walkers”, conta, com um sorriso. “Quase de certeza que isto não é verdade, mas gosto da história e da forma como simplesmente se acrescenta algo a uma história verdadeira. Sim, porque muitos modelos da Guerra das Estrelas foram construídos em Pembrokeshire, em Gales.”

Marinheira. Holly durante a semana do desfile da Marinha. ©Roo Lewis
Sir Terry Allen, nascido em 1949. Depois de ter vivido na rua por mais de 30 anos, Terry mudou-se, recentemente, para a sua casa camarária, algo organizado pela comunidade. Terry é uma face conhecida de todos. Usa normalmente um chapéu de cowboy e um kilt. Ele ajudou a construir a auto-estrada e dormiu debaixo dela durante muitos anos, assistindo ao desenvolvimento da cidade ao longo dos anos e, mais tarde, o seu declínio. Quando lhe perguntei se já tinha visto um OVNI, respondeu: "eu já vi tudo". ©Roo Lewis
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Marinheira. Holly durante a semana do desfile da Marinha. ©Roo Lewis

A verdade e o valor de uma história são duas coisas completamente diferentes, no entanto. “Esta história com o George Lucas não é verdadeira, muito provavelmente, mas eu gosto dela. Quero saber da história, não da verdade.” Na opinião do fotógrafo, a condição humana está muito associada à capacidade de formular narrativas, “o que não faz de nós contadores de verdades, necessariamente”. “Gostamos de contar histórias, de as ouvir, de mergulhar nelas. E todos temos histórias para contar, para partilhar.”

Recorda, com nostalgia, alguns dos encontros que teve em Port Talbot, como o retrato que fez, no topo da montanha, dos homens “duros” do grupo coral da cidade. “Os coros masculinos são importantes, em Gales”, explica. “Há muito orgulho envolvido.” O de Port Talbot é um dos mais antigos em Gales. “Estes rapazes de classe operária são duros. Eles trabalharam toda a vida na indústria metalúrgica e vestem um fato e uma gravata para cantar no coro. E cantam canções muito bonitas. Há algo de muito terno nisso.”

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Retrato de grupo do Port Talbot Cymric Choir, um dos mais antigos de Gales ©Roo Lewis

Roo conseguiu convencê-los, mais de quarenta homens com idades a rondar os 60 anos, a subir uma montanha para o retrato. Embora tenha feito dezenas de disparos, Roo escolheu aquele em os homens pareciam mais desatentos, desprevenidos. Mais vulneráveis. “Eles são todos amigos, todos gostam uns dos outros e conhecem-se há mais de 50 anos”, justifica. Isso deveria notar-se.

Roo recorda também o encontro com Captain Beany, o famoso dono do único museu dos feijões enlatados da Heinz, Baked Bean Museum of Excellence. “Em 1991, ele mudou oficialmente o seu nome para Captain Beanie. É esse o seu nome. É uma personagem única e quase me escapava. Fotografei-o porque ele tem um espírito… As pessoas são maravilhosamente estranhas, não é?”

Captain Beany, dono do Museum of Baked Beans ©Roo Lewis
Mike "Pancho" Locke, personalidade televisiva natural de Port Talbot que participou no programa Dirty Sanchez, uma espécie de Jackass de produção galesa. ©Roo Lewis
Miss Wales 2019/2020. Gabriella Jukes no topo de Mynydd Dinas com a central eléctrica Baglan Bay ao fundo. ©Roo Lewis
Meyrick Sheen, pai do actor Micael Sheen, retratado junto da praça art-deco reabilitada da cidade. "Conheci o Meyrick depois de saber que tinha uma carreira como sósia de Jack Nicholson." ©Roo Lewis
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Captain Beany, dono do Museum of Baked Beans ©Roo Lewis

Para além de Captain, fotografou também Meyrick Sheen, pai do actor Michael Sheen, sósia e imitador de Jack Nicholson, a miss Gales, e Pancho, uma personalidade televisiva que participava, nos anos 1990, num programa de partidas galês em tudo parecido com Jackass. “Acabei por fotografar Pancho num barco a remos, com a siderurgia a ver-se ao fundo. Subitamente, um arco-íris surgiu e foi um momento estranho.”

Roo Lewis confessa "adorar pessoas". "Acho muito importante retratá-las sob uma luz positiva.” Embora admita que existe algo de bem-humorado nas fotografias que produziu em Port Talbot, Roo recusa e repudia o retrato escarninho, trocista, que considera negativo. “Acho que em Gales todos se sentem muito à vontade com as suas identidades. Celebra-se muito mais a individualidade em Port Talbot do que em Londres, por exemplo.” É um cliché, adverte o britânico, “mas este fotolivro é uma carta de amor à cidade”. “Não significa que ela seja perfeita. Mas o que é perfeito?”

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