Caminhos da educação para o cinema
Além da atual instabilidade na classe docente, são frequentes as queixas sobre insuficiência de recursos, pouco tempo disponível e falta de formação docente para iniciativas ligadas ao cinema.
Existe um interesse crescente em integrar a expressão e a experiência cinematográficas em iniciativas educativas. No entanto, e apesar das muitas atividades em curso, há ainda problemas de inclusão e de capacidade de resposta por parte das escolas. Para minimizar esses constrangimentos, alguns projetos têm recorrido à tecnologia digital e à comunicação online como forma de chegar mais e melhor a todas as comunidades escolares.
Se a realidade se constrói cada vez mais a partir das suas mediações (ou simulações, segundo Baudrillard), as capacidades de codificação e descodificação audiovisual tornaram-se fundamentais para os processos de educação e desenvolvimento dos jovens. O cinema, arte-génese de toda a comunicação pelo som e imagem em movimento, oferece um método singular de criatividade, expressão, experiência e reflexão.
Se entendemos uma sociedade democrática pela sua defesa da pluralidade ou diversidade, o cinema, com a sua polissemia e irreverência, contribui para nos reconhecermos e construirmos, como indivíduos ou comunidades, a partir da distância ou da diferença.
O Observatório Permanente da Juventude (OPJ) publicou, em 2022, um relatório sobre educação para o cinema em Portugal, relevando as atividades de ver e experimentar fazer filmes como metodologia educativa ajustada à sociedade contemporânea e propícia para desenvolver conhecimentos e experiências criativas singulares. Atualmente, são múltiplos os eventos, as atividades e os projetos dinamizados em todo o país por centros e festivais de cinema (e respetivos serviços educativos), cineclubes, associações, universidades e demais entidades ativas no campo da educação para o cinema (muitos deles enquadrados em iniciativas internacionais). O relatório da OPJ destaca alguns deles.
Problema? Esta procura nem sempre tem sido acompanhada de condições, nas escolas, para o profícuo envolvimento de estudantes e professores. Além da atual instabilidade na classe docente, são frequentes as queixas sobre a insuficiência de recursos (logísticos, técnicos ou humanos), o pouco tempo disponível e a falta de formação docente para dinamizar iniciativas ligadas ao cinema.
Além do mais, escolas afastadas de centros urbanos (onde grande parte dos projetos de cinema e educação ocorrem) veem-se frequentemente excluídas desse tipo de atividades. Por isso, urgem iniciativas que consigam resolver este problema de inclusão e permitam flexibilidade e autonomia às escolas no desenvolvimento de atividades devidamente adaptadas à sua realidade educativa, cultural ou social.
Solução? Uma das mais recorrentes tem sido o aproveitamento da tecnologia digital e da comunicação online (algo que o recente período pandémico reforçou no nosso quotidiano). O Plano Nacional de Cinema, por exemplo, tem vindo a proporcionar cada vez mais o acesso a esses recursos (plataforma online de filmes, dossiers pedagógicos digitais ou ações de formação online para professores). De modo complementar, o projeto Insert (recentemente apresentado no Encontro de Cinema e Educação) disponibiliza, gratuitamente, um conjunto articulado de recursos online (vídeo-tutoriais e caderno pedagógico) sobre teoria e prática de cinema.
Outros projetos de educação para o cinema — em Portugal e no estrangeiro — estão a seguir também essa via para facilitar a disseminação de materiais e alcançar mais comunidades escolares. Isso tem permitido mitigar, em muitos casos, o problema do isolamento das escolas e a inclusão de mais estudantes e docentes em iniciativas de educação para o cinema.
No entanto, valorizar esta solução digital e online não significa menosprezar ou substituir as oportunidades de contacto direto com espaços, profissionais ou educadores de cinema (o impacto dessas experiências é incomparável). Significa, isso sim, oferecer alternativas às escolas que não o podem fazer.
No fundo, todas as iniciativas e projetos neste âmbito — presenciais ou digitais, síncronos ou assíncronos — devem ser entendidos como movimentos complementares de uma mesma luta pelo cinema como experiência educativa plural, diversificada, inclusiva e democrática. São, acima de tudo, prova inequívoca de que o cinema como motor de educação é uma realidade desejada e até reclamada, com múltiplos caminhos por descobrir e explorar. Uma educação para o cinema com todos e para todos far-se-á, sempre, através de uma oferta abrangente e articulada, capaz de incluir, de adaptar-se e de transformar(-se).
O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990