Altice. Armando Pereira e Hernâni Vaz Antunes ficam em prisão domiciliária

MP suspeita que Armando Pereira e Hernâni Antunes estão envolvidos num alegado esquema fraudulento, que terá lesado o Estado em mais de 100 milhões de euros e desviado da Altice cerca de 250 milhões.

Foto
O co-fundador do grupo Altice, Armando Pereira, foi detido na quinta-feira dia 13 de Julho, no âmbito da Operação Picoas
Ouça este artigo
00:00
06:06

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

O juiz Carlos Alexandre decidiu aplicar a prisão domiciliária como medida de coacção a Armando Pereira e Hernâni Vaz Antunes. O Ministério Público (MP) tinha pedido que Armando Pereira ficasse em prisão domiciliária ou prestasse uma caução de 10 milhões de euros, mas o magistrado recusou a ideia de determinar um valor de caução. Já para Hernâni Vaz Antunes, o MP tinha pedido a prisão preventiva como medida de coacção.

O co-fundador do grupo Altice, Armando Pereira, e o empresário de Braga Hernâni Vaz Antunes são suspeitos de pelo menos 32 crimes no âmbito da Operação Picoas.

O MP imputa a Armando Pereira um total de 11 crimes, seis de corrupção activa no sector privado, um de corrupção passiva no sector privado e quatro de branqueamento de capitais. Ao empresário bracarense Hernâni Vaz Antunes, o MP atribui a prática de 21 crimes, oito de fraude fiscal qualificada, seis de branqueamento de capitais, sete de corrupção activa no sector privado.

Neste processo com o nome Operação Picoas investigam-se factos susceptíveis de constituir crimes de corrupção no sector privado, fraude fiscal agravada, falsificação e branqueamento.

O MP suspeita que Armando Pereira, juntamente com Hernâni Vaz Antunes, está envolvido num alegado esquema fraudulento, que terá lesado o Estado em mais de 100 milhões de euros e desviado da Altice cerca de 250 milhões de euros.

No âmbito desta investigação foram ainda detidos a filha de Hernâni Antunes, Jessica Antunes, e o economista Álvaro Gil Loureiro. Para Jéssica Antunes, o juiz de instrução decretou a prestação de uma caução de 500 mil euros, a obrigação de apresentações periódicas às autoridades, a proibição de se ausentar para o estrangeiro e a proibição de contactos com os outros arguidos. Para Álvaro Gil Loureiro foi determinada uma caução de 250 mil euros, a obrigação de apresentações periódicas às autoridades, a proibição de se ausentar para o estrangeiro e a proibição de contactos com outros arguidos, tal como tinha pedido o MP.

Em declarações aos jornalistas que estão à porta do tribunal, no Campus de Justiça, em Lisboa, o procurador Rosário Teixeira disse que "necessariamente tem de haver perigo de fuga” para justificar o pedido de medidas privativas de liberdade. Rosário Teixeira revelou ainda que o interrogatório "foi bastante produtivo e interessante" do ponto de vista de obter a verdade sobre os factos e que os próprios arguidos admitiram, "em parte" que "há coisas que não deveriam ter ocorrido".

Esta investigação parece, no entanto, estar longe de acabar e ainda poderão ser constituídos mais arguidos.

Armando Pereira e Hernâni Antunes são suspeitos de corromper outras seis pessoas

Se Armando Pereira se deixou alegadamente corromper por Hernâni Vaz Antunes, seu amigo desde o final da década de 90, houve, na óptica dos investigadores, outras seis pessoas que terão sido corrompidas por ambos. Duas delas na Altice Portugal: o ex-presidente Alexandre Fonseca e o antigo responsável de tecnologia, Luís Alveirinho.

O MP está a ver à lupa alegadas interacções entre estes empresários e o antigo presidente da Altice Portugal, Alexandre Fonseca, durante cujo mandato esta rede de fornecedores de Braga e Zona Franca da Madeira, com ligações a Hernâni Antunes, foi conquistando peso a partir de 2017.

Alexandre Fonseca terá alegadamente recebido, segundo a investigação, 380 mil euros em 2018 e 110 mil euros em 2017, por acordo entre Hernâni Vaz Antunes e Armando Pereira, através de sociedades dos Emirados Árabes Unidos (EAU) e contra facturas falsas. A casa de Alexandre Fonseca, que é considerado suspeito de recebimento indevido de vantagem, mas ainda não é arguido, também foi alvo de buscas no dia 13 de Julho, quando a operação Picoas foi lançada.

No dia 17 de Julho, a Altice Portugal anunciou que Alexandre Fonseca suspendeu por “sua decisão” todas as funções no grupo (é presidente do conselho de administração em Portugal e nos EUA, e presidente executivo ao nível do grupo, em co-gestão com Malo Corbin e David Drahi).

No caso de Luís Alveirinho, o MP acredita que (à semelhança de Fonseca) produziu facturação forjada para receber as vantagens indevidas conferidas pelos dois principais arguidos.

Neste caso, as facturas eram emitidas através da sociedade Luís Alveirinho Unipessoal, para a empresa Braga System INC, registada nos EUA e controlada por Hernâni, no valor mensal de dez mil euros. Isto para permitir que a Altice assinasse contratos com intermediárias do empresário bracarense (que assim ganhavam uma percentagem) em fornecimentos de empresas chinesas como a Huawei e a Xiaomi.

Além destes dois portugueses, houve outras figuras em lugares chave no grupo Altice que os investigadores acreditam terem beneficiado dos pagamentos de Armando Pereira e Hernâni Vaz Antunes. Um destes, Yossef Benchetrit, genro de Armando Pereira, casado com a sua filha, Gaëlle Pereira Benchetrit, era director de compras da Altice USA e abriu caminho a intermediárias como a Holbox e Southport, sendo alegadamente remunerado por esta colaboração a partir das sociedades de Hernâni nos EAU. Além disso, os investigadores também acreditam que Armando Pereira pediu a David Benchetrit, pai de Yossef, que agisse como testa-de-ferro para ocultar a sua participação em várias empresas.

Hakim Boubazine, que foi presidente da Altice USA até ao final de 2021 e já tinha desempenhado as mesmas funções na Altice Dominicana, é outro dos alegados corrompidos e terá recebido pelo menos 1,2 milhões de dólares, em Abril de 2022, da Jana General Trading, do Dubai, para deixar entrar as empresas da dupla Vaz Antunes/Armando Pereira no circuito de fornecedoras e intermediárias da Altice nos Estados Unidos.

Outro quadro do grupo Altice sob suspeita de estar envolvido nestes alegados esquemas terá sido Olivier Sausané, responsável pela aquisição de aparelhos terminais e cartões SIM para o grupo liderado por Patrick Drahi. Instalado em Genebra, Suíça, onde fica o quartel-general da Altice, Sausané terá recebido como contrapartida pela sua colaboração com os aparentes esquemas ilícitos um imóvel de 620 mil euros em Leça da Palmeira e um alegado empréstimo de dois milhões de euros sem reembolso conhecido.

Finalmente, Olivier Duquesne, quadro da norte-americana Cisco, é suspeito de ter garantido que os fornecimentos dessa multinacional ao grupo fossem intermediados por empresas de Hernâni Vaz Antunes, recebendo em troca várias vantagens, incluindo os pagamentos de viagens ou a injecção de fundos, na ordem dos 3,8 milhões de euros, em sociedades do ramo imobiliário criadas em Portugal.

Sugerir correcção
Ler 31 comentários