A Symington Family Estates é a primeira empresa certificada pelo Sustainable Winegrowing Portugal, o nome 'de exportação' do novo Referencial Nacional de Certificação de Sustentabilidade do Sector Vitivinícola (RNCSSV), apresentado em Novembro. O novo selo surgirá, logo que possível, nas garrafas dos vinhos produzidos nas quintas da empresa no Douro — ficam de fora as propriedades da Prats & Symington na região, assim como as operações do grupo no Alentejo e nos Vinhos Verdes. A certificação é, contudo, à condição, uma vez que a Symington tem agora três anos para conseguir que os seus fornecedores de uva cumpram "os mínimos" no que à sustentabilidade diz respeito.
É uma espécie de moratória naquele que já se adivinhava ser o mais difícil dos 86 critérios da certificação nacional, uma iniciativa do Instituto da Vinha e do Vinho que está a ser gerida pela ViniPortugal e que, sendo também para o mercado interno, vem responder a uma exigência crescente de vários mercados de exportação, nomeadamente os do Norte da Europa. O 'indicador KO', um dos que têm obrigatoriamente de ser cumpridos para obter a certificação, do controlo dos fornecedores "obriga a que pelo menos 50% — este é o ponto de partida, até aos 100% — das uvas transformadas pela empresa candidata sejam certificadas", explica Marta Mendes, que tem o pelouro da Sustentabilidade na Symington.
Três anos é o "tempo limite" dado pelo RNCSSV para as empresas conseguirem cumprir esse objectivo. Porquê a "flexibilidade" introduzida neste ponto da nova norma? O presidente da ViniPortugal justifica "uma certa abertura nesta fase inicial" com o facto de "o critério 1.5.4 ser um dos mais difíceis para as grandes empresas", que dependem de uva comprada fora.
Mas nota Frederico Falcão: "[As empresas] têm de apresentar um plano para que no espaço dos três anos – um ciclo de certificação dura três anos – atinjam o cumprimento dos 50%. Se não atingirem, cai a certificação". O responsável refere ainda que, apesar de "não estar ainda definido", o RNCSSV sofrerá sempre "melhorias contínuas" e "é natural que, à medida que as empresas adiram ao referencial, esta abertura caia".
No caso da Symington, que está certificada no nível máximo do RNCSSV (teve 89 pontos, acima dos 85 exigidos no nível A), explica Marta Mendes, para atingir os 50% de uvas sustentáveis, numa conjugação de uvas próprias e uvas de lavradores — e no Douro, o universo que aqui nos interessa, a empresa compra uva a 1000 viticultores —, o trabalho será feito junto de 70 parceiros, que asseguram "40% das uvas adquiridas a lavradores".
"A primeira etapa deste processo vai abranger cerca de 70 lavradores e ficará resolvida antes dos três anos, pois a maioria desses lavradores são certificados em Produção Integrada e em Modo de Produção Biológica. Nos anos seguintes, iremos avaliar os restantes, até que todos consigam demonstrar que as suas práticas vitícolas estão de acordo com a certificação."
Trata-se sobretudo de fazer com que consigam provar o trabalho que já fazem, acredita a responsável, enóloga de formação e na Symington há 17 anos, já "que a maioria apenas precisa de apoio ao nível dos registos e de organização das evidências". Fruto, contextualiza Marta Mendes, de um trabalho que tem vindo "a ser desenvolvido pelas equipas de viticultura e sustentabilidade da empresa" há já alguns anos. "A sustentabilidade na Symington não começou ontem nem nunca termina. Já se falava de sustentabilidade antes de eu chegar, e havia já trabalho desenvolvido ao nível da gestão das nossas relações com as nossas comunidades e um relacionamento muito próximo com a gestão ambiental – e foi por aí que eu comecei."
Abrangidos pela certificação do Sustainable Winegrowing Portugal, concedida há cerca de duas semanas, estão cerca de 800 hectares de vinha (não inclui vinhas particulares da família Symington) e sete adegas no Douro. Fora desta região, a Symington tem uma adega na Quinta da Fonte Souto (Portalegre, Alentejo), mas essa operação, "por ser uma empresa distinta, será certificada à parte". "Da mesma forma estão as propriedades Quinta de Roriz e Quinta da Perdiz que, embora situadas no Douro, pertencem à empresa Prats & Symington e, por isso, terão em breve certificação própria."
Foco na descarbonização
Nos últimos anos, a Symington adeiriu à rede International Wineries for Climate Action (IWCA) e à iniciativa Act4Nature do Business Council for Sustainable Development (BCSD), associação de empresas comprometidas com a transição para a sustentabilidade. E mesmo antes da pandemia criou um departamento dedicado que tem trabalhado "nos princípios basilares da sustentabilidade: descarbonização da indústria; uma viticultura de menor impacto possível, alicerçada na promoção da biodiversidade e dos serviços do ecossistema; e as pessoas" e o seu bem-estar.
Elegendo a descarbonização como principal desafio, Marta Mendes partilha que nos últimos anos foi possível reduzir a pegada de carbono da Symington "de 1,78 kgCO2e/L engarrafado" para "1,71 kgCO2e/L engarrafado" (2022). "O cálculo foi iniciado em 2018, incidiu nos anos 2015 2016 e 2017. Desde essa altura que anualmente calculamos as nossas emissões de gases com efeito de estufa de acordo com o GHG protocol."
Contribuiu para essa melhoria uma "estratégia de aligeiramento de garrafas", iniciada em 2020 e focada nos oito modelos mais pesados e que são produzidos em maior número. Nos vinhos tranquilos, a garrafa usada pela Symington passou de 500 para 420 gramas, e essa redução de "80 gramas de vidro por garrafa resultou numa redução anual de cerca de 200 toneladas de vidro". "Em termos de emissões, estamos a falar de cerca de 163 toneladas de CO2 [dióxido de carbono] evitadas por ano", sublinha a responsável. Já as garrafas de vinho do Porto passaram a pesar 450 gramas, menos 100 gramas do que anteriormente, resultando "igualmente em reduções muito significativas das emissões".
Ao nível da biodiversidade, a empresa começou recentemente a fazer um trabalho de "identificação da fauna e da flora" nas suas quintas. Esse trabalho, "com biólogos da Rewilding Portugal", será "feito quinta a quinta" e decorre agora na Quinta do Vesúvio. O objectivo é estabelecer "uma baseline" antes de intervir nesses ecossistemas.
Voltando à certificação nacional em sustentabilidade, Frederico Falcão espera ter até ao final do ano "uma meia dúzia" de empresas já certificadas, a julgar pelos contactos que a ViniPortugal tem recebido desde o início do ano. Desde Janeiro que esta entidade tem andado na estrada em acções de formação sobre o novo referencial, contando com o apoio das várias comissões vitivinícolas regionais, do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto e do Instituto do Vinho e do Bordado e do Artesanato da Madeira.
"Em praticamente todas, apareceram alguns produtores e pessoas de associações que queriam saber mais sobre o referencial, para depois dar apoio a lavradores e produtores", partilha o presidente da ViniPortugal.
A notícia da primeira empresa certificada poderá dar um empurrão ao Sustainable Winegrowing Portugal. Partilhem todos da ambição da Symington e de Marta Mendes: "Só vamos descansar quando demonstramos que todos estamos a fazer um bom trabalho no sector do vinho em Portugal".