Quando o Supremo Tribunal da Índia começou a julgar um caso para legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, no início deste ano, a casamenteira Kamakshi Madan recebeu, subitamente, um aumento de pedidos de pais que procuravam cônjuges para os seus filhos LGBTQ+. “As mães telefonaram-me à procura de maridos para os seus filhos”, lembra Madan por telefone. A casamenteira é especializada na comunidade LGBTQ+ em Pune, uma cidade no oeste da Índia.
Uma decisão que possibilite o casamento de casais do mesmo sexo seria um enorme impulso para a indústria dos casamentos LGBTQ+ num país que conta com uma população de 1,4 mil milhões de pessoas e onde é frequente as famílias gastarem o equivalente a dezenas de milhares de euros em cerimónias luxuosas, que podem durar vários dias.
De acordo com a empresa de empréstimos Reliance Money, os indianos gastam um quinto da riqueza total acumulada durante a sua vida nos seus casamentos, ou seja, esta é uma indústria de um trilião de rupias, ou seja, 11 mil milhões de dólares.
Alguns casais do mesmo sexo têm vindo a celebrar de forma não oficial desde que a Índia discriminalizou a homossexualidade em 2018, trocando votos perante familiares e amigos em cerimónias não reconhecidas.
Se, nos próximos meses, a Índia legalizar o casamento homossexual, tornar-se-á apenas o terceiro país da Ásia a fazê-lo, depois de Taiwan e do Nepal.
Na Índia, o Governo afirmou que se opõe em reconhecer o casamento entre pessoas do mesmo sexo e solicitou ao Supremo Tribunal que rejeite as contestações ao actual quadro jurídico, apresentadas por casais LGBTQ+. Espera-se uma decisão este ano, embora o Tribunal ainda não tenha anunciado uma data.
A questão do casamento homossexual é sensível pois para, muitos indianos, falar abertamente sobre a homossexualidade é um tabu. Mas as atitudes estão a mudar, já que 53% dos indianos adultos consideram que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser legal, segundo um relatório de Junho do Pew Research Center, uma organização de sondagens e investigação. Segundo sondagens anteriores da Ipsos, em 2015, 29% dos indianos apoiavam o casamento entre pessoas do mesmo sexo; e 44% em 2021.
Madan, cujos clientes a apelidam de “a tia LGBTQ+” em referência ao popular reality show da Netflix Indian Matchmaking, diz ter testemunhado em primeira mão a aprovação dos pais e famílias. “Um pai de origem conservadora ligou-me e disse: ‘Por favor, encontre uma noiva para a minha filha’”, testemunha a profissional que criou a Aarzoo, a sua empresa de aconselhamento matrimonial em 2018.
“Milhões de pessoas à espera”
Saurabh Bondre, um académico que celebra casamentos hindus tradicionais, não vinculativos, para casais gays, afirmou que a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo atenuaria os receios dos sacerdotes em relação a disputas legais ou protestos. “Muitos sacerdotes hindus não são, de facto, contra a realização deste tipo de casamentos. O que eles receiam é uma reacção negativa por parte da comunidade sacerdotal”, realça. E contextualiza: “Se realizar um casamento entre pessoas do mesmo sexo, poderá não ser convidado a realizar casamentos heterossexuais posteriormente, o que lhe custará o seu sustento.”
Bondre, que é membro da comunidade LGBTQ+, diz que muitos casais do mesmo sexo querem cerimónias de casamento religiosas tradicionais, de acordo com as normas culturais. "Vemos os nossos tios, tias, primos e amigos a declararem o seu amor um pelo outro. Também sonhamos em ter um compromisso semelhante”, justifica.
Sameer Sreejesh, fundador da aplicação de casamentos LGBTQ+ Umeed, sublinha que o facto de o Supremo Tribunal estar a analisar a questão, motivou uma multidão de homossexuais, em todo o país, a admitirem abertamente as suas identidades e procurarem parceiros para a vida. Desde o início das audiências, no passado dia 18 de Abril, que os downloads diários da aplicação duplicaram, refere.
“Estamos a adicionar mais de cem membros todos os dias, apesar de estarmos a gastar menos do que antes em anúncios”, afirma. Actualmente, a Umeed tem cerca de 20 mil membros registados e cinco a seis mil membros activos diariamente.
Embora a aplicação tenha um pequeno lucro de alguns milhares de rupias por mês com as adesões, Sreejesh prevê um enorme crescimento. “Se o veredicto nos for favorável, há milhões de pessoas à espera”, congratula-se.