Habitantes de Jenin protestam contra a Autoridade Palestiniana

No dia seguinte à operação de dois dias de Israel no campo de refugiados, havia uma atitude de desafio perante Israel e ira contra a liderança palestiniana

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Os estragos em Jenin após a operação militar israelita RANEEN SAWAFTA/Reuters
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Depois de dois dias em que o campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia, foi alvo de uma grande operação militar israelita, com ataques por ar e bulldozers a abrir caminho, os habitantes enterraram os doze palestinianos mortos, começaram o trabalho para reconstruir o que foi destruído, e manifestaram uma atitude de desafio para com Israel.

Mas, sobretudo, protestaram contra a sua própria liderança: uma multidão em fúria, incluindo dezenas de homens armados, expulsou três altos responsáveis da Autoridade Palestiniana (AP) de um cortejo fúnebre para dez dos mortos, relata a agência Reuters. “Fora daqui! Fora daqui!”, gritaram.

Antes, vídeos circulavam com centenas de pessoas a atirar pedras contra o muro de cinco metros que protege o gabinete do governador da AP em Jenin.

A Autoridade Palestiniana foi criada em 1994, após os Acordos de Oslo para permitir um governo palestiniano, que seria limitado no tempo até um acordo entre as duas partes que nunca chegou a acontecer.

Muitos palestinianos apontam a corrupção e a cooperação com Israel – a AP prende muitas vezes combatentes e até jornalistas. No ano passado, um palestiniano morreu num raide em Nablus para deter combatentes, um caso que levou a grandes protestos.

Recentemente, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, tinha sido citado dizendo a deputados, numa comissão à porta fechada, que interessava a Israel manter a Autoridade Palestiniana e não deixar que se desmoronasse.

Desde a vitória do Hamas nas eleições de 2006 – que levou a uma série de acontecimentos que culminaram em confrontos que acabaram com o Hamas no poder na Faixa de Gaza e a Fatah (do presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas) na Cisjordânia – não há eleições. A par da falta de um processo de paz com Israel, a falta de acordo para eleições leva a uma falta de perspectivas de futuro para muitos palestinianos.

Já no dia anterior o Hamas tinha pedido que a Autoridade Palestiniana tomasse uma acção firme, apelando ao “corte das relações com os líderes da ocupação [israelita], o fim da cooperação de segurança e a rescisão de todos os acordos assinados”, citava a emissora pan-árabe Al-Jazeera.

A Autoridade Palestiniana afirmou, ainda segundo a Al-Jazeera, que tinha acabado a coordenação de segurança com Israel, mas críticos apontam que a organização já fez afirmações destas antes em altura de escalada de violência mas que nunca a terminou de facto.

A agência Reuters descreve uma disposição de desafio entre os residentes e os líderes dos movimentos de combatentes estabelecidos (Jenin e Nablus têm-se destacado também pelo surgimento de novos movimentos fora dos tradicionais ligados às facções palestinianas). “Não conseguiram o que queriam”, disse Mutasem Estatia, residente no campo que esteve uma noite detido, citado pela agência noticiosa britânica. “Houve doze mártires [como são chamados os palestinianos mortos por Israel] e temos orgulho neles, mas prevíamos mais dano dada a escala do raide”, disse.

Israel disse que deteve 150 suspeitos, apreendeu armas e destruiu explosivos, e destruiu também um centro de comando, afirmando ainda que todos os mortos eram combatentes palestinianos, apesar de a Jihad Islâmica e o Hamas dizerem que morreram apenas cinco membros de ambos os movimentos. Um soldado israelita morreu, suspeitando-se inicialmente que pode ter sido atingido por um outro militar israelita.

Mas mesmo antes de as autoridades israelitas terem anunciado o fim da operação, na terça-feira à noite, Netanyahu afirmou que esta não deveria ser uma operação isolada, levantando o espectro de além das operações cíclicas que têm vindo a acontecer desde há mais de ano e meio em Jenin e Nablus, este tipo de incursões maiores possa repetir-se.

Foi considerada a maior operação desde a Segunda Intifada, a revolta palestiniana entre 2000 e 2005, marcada por grandes incursões militares israelitas na Cisjordânia e atentados suicidas palestinianos em Israel. Nestes dois dias, os bulldozers deixaram ruas intransitáveis, o que levou a dificuldades em socorrer feridos, cortaram ligações eléctricas de de água. Nesta quarta-feira, residentes começaram a avaliar danos e remover escombros.

Marwan Bishara, analista da Al-Jazeera, argumentou que os objectivos de Israel “não foram cumpridos”, já que, se fosse o caso, “não falariam de voltar a ir”.

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