Autarca de Loures preocupado com atraso no plano de transportes para a JMJ
Ricardo Leão, autarca socialista de Loures, queixa-se de que Manuel Pizarro não “honrou o compromisso assumido” e deixou hospital perder competências e “credibilidade”.
Ricardo Leão é autarca eleito pelo PS mas não poupa nas críticas ao Governo tanto por causa da gestão do Hospital Beatriz Ângelo e como pelo atraso no planeamento do sistema de transportes durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) que decorre na primeira semana de Agosto nos concelhos de Lisboa e Loures. Pode ouvir a entrevista na íntegra na RR esta quinta-feira pelas 23 horas.
Em Março, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, comprometeu-se a dar, no prazo de um mês, uma resposta à situação do Hospital Beatriz Ângelo (HBA) através da abertura de um concurso para a contratação de mais profissionais de saúde. O ministro da Saúde cumpriu a palavra?
Não, não cumpriu com o compromisso que assumiu comigo e com todos os outros presidentes de câmara servidos pelo HBA, Mafra, Sobral de Monte Agraço e Odivelas. Nesse mês, o ministro da Saúde prontificou-se a arranjar uma solução temporária para que as urgências pediátricas do HBA pudessem reabrir no horário diurno ao fim-de-semana. O HBA serve mais de 300 mil pessoas. À época, o ministro da Saúde mostrou-se disponível para encontrar todas as soluções, mesmo que atípicas e temporárias, para que essa urgência pudesse reabrir. Os meses passaram, lamento e estou desiludido com o não-compromisso do ministro.
Que explicação lhe deu o ministério?
O ministério explicou que não há médicos para garantir essa reabertura. Volta tudo à questão salarial. Houve um concurso que abriu e fechou e tivemos poucas vagas preenchidas no concelho de Loures. De facto, não ficamos satisfeitos e estamos muito desiludidos neste caso em concreto porque houve um compromisso e temos que honrar os compromissos que assumimos. É o que eu faço todos os dias e, se não o faço, explico porquê. Não havia médicos, mas nós, municípios, estávamos disponíveis para sermos parceiros num projecto atípico.
Há três semanas, formámos uma comissão intermunicipal composta por estes quatro presidentes de câmaras para que possamos todos ter uma só voz e como forma de pressão. Fizemos já um pedido de reunião, que ainda não foi respondido, ao ministro, mas também passa por nos reunirmos com a ARS, ACES. O problema, infelizmente, não é só a urgência pediátrica, há outros problemas relacionados com a saúde que nos preocupam a nós, presidentes de câmara, relacionados com o Hospital Beatriz Ângelo. Neste caso em concreto, a palavra que mais descreve o meu sentimento relativamente ao ministro é desilusão pelo não honrar esse compromisso que assumiu connosco.
Acha que foi um erro o Governo ter acabado com a PPP?
Acompanhei de perto este processo com preocupação com o dia seguinte [ao fim da PPP] e todos os meus receios concretizaram-se. Mas devo dizer que não foi só por culpa do Governo que a PPP não se manteve. Depois da pandemia, a entidade privada não se mostrou disponível para continuar. Ao fim de ano e meio, dois anos, do HBA como empresa pública, os resultados são muito piores do que os dados que havia com a PPP.
O que tenho transmitido ao ministro é que se deve colocar acima de tudo os interesses da população. Se não se dá mais liberdade aos gestores hospitalares públicos na contratação e na autonomia financeira, pode vir o melhor gestor do mundo e não vai conseguir fazer rigorosamente nada. Ou se faz uma nova PPP ou dê-se mais liberdade às administrações hospitalares.
O ministro da Saúde disse-nos, numa reunião recente que tivemos, que vai optar pela criação das unidades locais de saúde (ULS). Vai deixar de haver conselho de administração e vai passar a haver uma ULS no Beatriz Ângelo. Querem fazer isto no início do próximo ano. Será na mesma estatal, mas com mais liberdade de actuação e autonomia orçamental.
Isso vai tornar o processo mais simples?
Não sei, mas se o caminho que o Governo quer seguir é dar mais liberdade e autonomia ao gestor hospitalar no HBA desta forma, eu agora quero ver para crer. O terreno onde foi construído o hospital foi cedido pela Câmara de Loures de forma gratuita. Estava avaliado, à época, em 40 milhões. É com redobrada insatisfação que vemos que o hospital não está a servir aquilo para que deveria servir. Espero que o HBA recupere a credibilidade que perdeu em diversas áreas. E espero que haja médicos para as novas USF que vamos abrir no concelho.
Loures é um dos concelhos que mais peregrinos vão receber durante a JMJ. O presidente da Câmara de Lisboa dizia na semana passada estar preocupado com o facto de ainda não haver plano de mobilidade, que é da responsabilidade do Governo. Partilha a preocupação com Carlos Moedas?
Tenho obviamente que partilhar dessa preocupação. Houve uma reunião há muito pouco tempo e [foi assumido que] o plano para a mobilidade só estará pronto em Julho.
Porquê?
Porque ainda há dificuldades de articulação com um conjunto de entidades.
O que é que está a ser mais difícil?
Não sei, não compete à Câmara de Loures coordenar esse trabalho. Se me pergunta se isso é uma preocupação, claro que é. O plano de segurança vai estar pronto até dia 15 de Julho, mas esse não me preocupa tanto.
A autarquia comprometeu-se com um investimento de 10 milhões na JMJ. Irão mais além?
Já estão comprometidos 7,5 milhões. Não acredito que ultrapasse os dez, ficaremos abaixo disso.
O que falta fazer, a um mês do evento?
Loures é o concelho por onde vão passar as pessoas da Amadora, de Mafra, Odivelas. Em Loures, vamos alojar cerca de 20 mil peregrinos em pavilhões desportivos, escolas, colectividade. Temos cerca de 200 famílias de acolhimento, que vão receber cerca de 400 peregrinos, mas o que nos preocupa mais é que estamos a falar de um espaço, de 50, 60 hectares, onde previsivelmente teremos 700, 800 mil pessoas. Como é que elas se vão deslocar entre os vários eventos? Isso preocupa-nos a nós, a qualquer presidente de câmara, à própria Fundação JMJ. Estou preocupado, mas não alarmado.
Mas o que preocupa mais é as deslocações [dos peregrinos entre os vários eventos], os pontos onde os autocarros vão ficar estacionados e como será a mobilidade das pessoas que trabalham nessa semana e que precisam de usar os transportes públicos ou a sua viatura. É essa compatibilização que está em discussão.
Marta Temido será um bom nome para devolver Lisboa ao PS nas próximas autárquicas?
O Carlos Moedas tem uma capacidade de rua grande. Desenganem-se se pensam que ele fica fechado no gabinete. Vai ser difícil com Marta Temido ou sem Marta Temido. Eu vejo-o agora com grande entusiasmo e isso é muito bom, é o principal. A Marta Temido teve e tem um papel muito importante neste país.
Estamos a chegar ao final da primeira sessão legislativa. Concorda com o presidente do PS, Carlos César, de que o primeiro-ministro devia remodelar o Governo depois das sucessivas polémicas?
O Governo tem tido virtudes e alguns erros.
Não aceitar a demissão de João Galamba foi um erro?
Conhecendo o primeiro-ministro como conheço, quando o colocam entre a espada e a parede normalmente ele vai sempre para a espada. Não é pessoa de ir para a parede. Eu acredito numa remodelação. Ela é necessária nalgumas áreas específicas, não por incompetência, mas por necessidade de refrescamento. Mas vai ser na altura em que António Costa entender que é a altura e na altura em que as pessoas ou o Presidente da República querem. Acredito que há-de acontecer no momento em que ele entender.
Como está a ver as notícias que dizem que há hipóteses de António Costa vir a ser presidente do Conselho Europeu se ele quiser?
Um misto de agridoce. Doce no sentido em que é bom para o país ver o reconhecimento, por parte da Europa, de um português. A mim orgulha-me. O “agri” tem que ver com o facto de não acreditar que vá. Ele faz falta. O Governo vai depender de muita coisa, mas em especial da execução do PRR. Temos que aproveitar esta oportunidade de solidariedade porque nunca mais vai haver mais nenhuma como esta.
Com Costa ou sem Costa, se acabarmos 2026 com uma baixa taxa de execução dos fundos europeus os portugueses não vão perdoar o PS pela incompetência. Aí, vai ser um processo muito complicado de perda de credibilidade do próprio PS.