ICOMOS questiona se obras preservam autenticidade da ponte Luiz I

O organismo da UNESCO diz não conhecer a dimensão da intervenção e questiona se “obedece a critérios de compatibilidade de materiais e de reversibilidade”.

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As obras de reforço estrutural da Ponte Luiz I terminaram no dia 14 de Abril Paulo Pimenta

O ICOMOS Portugal levantou esta quinta-feira dúvidas sobre a preservação da autenticidade da ponte Luiz I, entre Porto e Gaia, após as obras de reforço estrutural que terminaram em Abril.

Aquele organismo consultivo da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) voltou também a criticar a "adulteração desnecessária" da Estação de São Bento, no Porto, para lá instalar o mercado Time Out.

"Embora mantendo as funções originais, [a Ponte] foi sujeita a intervenção de reforço estrutural para resistir a acções substancialmente superiores àquelas para as quais foi concebida - desconhece-se a dimensão da intervenção e se esta obedeceu a critérios de compatibilidade de materiais e de reversibilidade", afirma, em resposta à Lusa, o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS, na sigla em inglês), classificando-a como "um exemplar conceptual e tecnológico raro".

Construída entre 1881 e 1886, a estrutura metálica com dois tabuleiros, projectada por Théophile Seyrig, colaborador de Gustave Eiffel, está classificada como Imóvel de Interesse Público desde 1982 e é um dos monumentos que integra a área classificada como Património Mundial da UNESCO em 1996.

Fechado para obras de reabilitação em Outubro de 2021, o tabuleiro inferior da ponte entre o Porto e Vila Nova de Gaia, reabriu a 14 de Abril, mas só para transportes públicos, bicicletas e peões, deixando de fora os automóveis, TVDE e transportes turísticos.

Segundo a Infra-estruturas de Portugal (IP), gestora daquela estrutura, a empreitada visou reparar um conjunto de anomalias, a maioria relacionada com a corrosão superficial de elementos metálicos, tendo o seu custo final ascendido aos 4,2 milhões de euros.

A Lusa tentou obter uma reacção junto da IP, mas até ao momento sem sucesso.

A intervenção na Ponte Luiz I é apenas um dos exemplos apontados pelo organismo consultivo da UNESCO para o património, que voltou hoje a alertar para o "inaceitável fachadismo" de que são exemplo as obras realizadas no edifício dos Fenianos, considerando que o risco para Centro Histórico do Porto, classificado como património mundial, é hoje ainda mais elevado perante a "ligeireza" de projectos que "dificilmente" se enquadram em critérios de conservação.

Na resposta à Lusa, o Conselho retoma ainda as críticas ao projecto do Mercado Time Out para a ala sul da Estação de São Bento, também ela gerida pela IP.

Para o ICOMOS, a intervenção neste "exemplo conceptual e tecnológico raro e em bom estado de conservação, é justificada pela introdução de funções que sobejam na envolvente e que promovem um desvio, uma distracção, uma adulteração desnecessária e que dificulta a interpretação e compreensão do próprio edifício e do espaço urbano que ajuda a configurar".

O projecto do Marcado Time Out Porto para a ala sul da estação de São Bento inclui espaços de restauração e bares e prevê ainda construção de uma torre de 21 metros, autoria de Souto Moura, considerada "intrusiva" pela UNESCO.

Criticam ainda o desinvestimento do Estado na ferrovia, salientam o quão raro é encontrar um equipamento classificado que mantém funções na rede ferroviária de ligação a sítios igualmente inscritos na lista da UNESCO, como são o Centro Histórico de Guimarães, o Parque Arqueológico do Côa, ou o Alto Douro Vinhateiro do qual o Porto "é indissociável".

"O desinvestimento do Estado na rede ferroviária concorre para a ruína do uso da estação", sustenta aquele organismo.

É ainda feita referência ao Convento da Serra do Pilar que, "ao albergar uma estrutura militar, viola o disposto na Convenção quanto à protecção do Património em caso de conflito armado".

Por serem património do Estado Português, estes exemplos, defende o Conselho, revelam a qualidade da gestão do Património Cultural.