Em Portugal, confia-se nas notícias, não se paga por elas
Conteúdos exclusivos e qualidade são os factores mais importantes para os consumidores. Preço é o que mais afasta.
Os consumidores em Portugal tendem a confiar nas notícias e o interesse por elas até aumentou ligeiramente. Mas, quando se trata de pagar por jornalismo, os utilizadores retraem-se e o país continua nos últimos lugares da tabela do Reuters Digital News Report, um relatório que anualmente traça o retrato do consumo noticioso em vários países e que é publicado nesta quarta-feira.
Em Portugal, apenas 11% dos inquiridos pelo estudo afirmaram ter pago por notícias, abaixo da média de 17% observada entre os 46 países analisados. O número representa também uma quebra face aos anos anteriores: tinham sido 17% em 2021 e 12% em 2022.
O acesso a conteúdo exclusivo e a maior qualidade são os dois principais motivos para abrir os cordões à bolsa, logo seguidos por promoções e descontos. Por outro lado, entre os que não pagam, o preço é a razão apontada com mais frequência.
Este comportamento contrasta com a confiança e importância atribuída aos conteúdos noticiosos.
Em Portugal, 58% dos inquiridos pelo estudo dizem ter confiança nas notícias – é, de longe, o valor mais elevado entre os países da Europa do Sul (em Espanha, por exemplo, são 33%; na Grécia, 19%) e o suficiente para colocar Portugal mais uma vez no pódio da confiança entre os países analisados, atrás apenas da Finlândia e do Quénia.
Também subiu ligeiramente o número de pessoas que dizem ter “interesse por notícias em geral”, que é agora de 52%, um ponto percentual acima do registado em 2022. Os valores destes últimos dois anos, porém, estão muito longe dos anos anteriores, numa mudança que parece ter ocorrido durante a pandemia de covid-19: entre 2015 e 2021, eram sempre mais de 60% os que afirmavam estar interessados, com vários destes anos a rondarem os 69%.
O nível de confiança, porém, varia consoante a idade: “Uma exploração detalhada dos indicadores de confiança em notícias indica que, não obstante os índices estruturalmente elevados de confiança em notícias, os portugueses mais velhos tendem a confiar mais em notícias do que os mais jovens”, escrevem os autores do capítulo português do estudo, os académicos Gustavo Cardoso, Miguel Paisana e Ana Pinto-Martinho, do Obercom, um observatório dos media.
Os números de 2023 mostram também que há menos pessoas a evitar activamente as notícias.
Evitar consumir notícias é um tipo de comportamento que tem vindo a ganhar expressão em muitos países, em parte devido a um cansaço com temas a que os utilizadores atribuem uma conotação negativa. Em Portugal, 34% dos inquiridos evita as notícias, abaixo dos 42% do ano passado (a média dos países analisados é de 36%). E esta tende a ser uma prática indiscriminada, sem selecção de temas.
“Quando evitam notícias, os portugueses tendem a recorrer a estratégias que se enquadram no contexto de um evitar indiscriminado de notícias, em detrimento de formas selectivas de o fazer”, refere o estudo. “A invasão da Ucrânia é o tema noticioso que os portugueses mais evitam – 37,6% declaram evitar este tema de forma activa.”
Portugal está também entre os países que mais importância dão ao serviço público de media. Com 59% dos inquiridos a considerarem o serviço público importante “em termos pessoais”, o país surge em quinto lugar na tabela, atrás de quatro países nórdicos.
TikTok e podcasts
O estudo mostra ainda um aumento da importância do TikTok, a rede social de vídeos que tem granjeado sucesso sobretudo entre os mais jovens, e dos podcasts, mesmo que parte dos consumos neste formato não seja relacionada com notícias.
Em Portugal, 38% dos inquiridos tinha ouvido um podcast no mês anterior (sexto lugar na tabela e acima da média global de 36%). É na faixa etária entre os 18 e os 24 anos que os podcasts são mais populares, com 61% destes inquiridos a consumirem neste formato.
Já no que diz respeito a plataformas sociais, o TikTok tem vindo a ganhar peso, muito embora ainda esteja longe dos lugares cimeiros, seja no geral, seja para o consumo de notícias.
“A análise histórica da utilização de redes sociais em Portugal, desde 2015 a 2023, demonstra a estagnação/diminuição da utilização geral do Facebook e do Facebook Messenger, bem como a ascensão do WhatsApp e Instagram no quadro das dietas de sociabilidade dos portugueses”, lê-se no estudo. “Fora do universo Meta, YouTube mantém a sua posição dominante ao nível do vídeo, e TikTok confirma-se cada vez mais uma rede em ascensão, sendo já usada por 25,9% dos portugueses.”