A Semana de Design de Milão transforma a cidade. Mesmo em vésperas de abertura ao público, são muitos os curiosos que deambulam por perto dos espaços, que ocupam toda a capital da Lombardia, cruzando o estilo do melhor que se faz em termos de design com o habitual caos da cidade, com as obras de expansão do metro de superfície a marcarem o passo.
Durante cinco dias (decorreu entre 18 e 23 de Abril), o grande chamariz é o Salão do Móvel e os espaços de decoração, reflectindo a tradição italiana, mas também acolhendo ideias vindas um pouco de toda a parte. Mas, entre os destaques, cada vez mais surgem automóveis, numa altura em que as prestações, só por si, já não chegam para marcar pela diferença.
É o caso do hiperdesportivo com que a Peugeot anda a querer dar cartas no Campeonato do Mundo de Resistência (WEC, na sigla original) e que foi a Milão para mostrar que a arte e o design também se fazem às pistas. Tal acontece já no próximo fim-de-semana, com a marca do leão a marcar o seu regresso às míticas 24 Horas de Le Mans com o 9x8 Hypercar intervencionado pelo artista espanhol J. Demsky. Mesmo que não chegue aos lugares do pódio, a sua passagem promete dar espectáculo.
J. Demsky, 44 anos, começou o seu percurso criativo durante o boom do graffiti no início dos anos 90 do século passado.
Talvez haja quem veja algumas reminiscências no seu trabalho actual, mas o artista natural de Elche, Alicante, recusa a ideia, preferindo descrever as suas intervenções como “uma simbiose entre uma visão nostálgica do futuro e o sonho arquitectónico dos espelhos que reflectem a natureza do mundo”.
O mundo automóvel não estava entre os seus planos – “Nunca o teria imaginado”, confessou em declarações à Ímpar –, mas depressa o contexto passou a atraí-lo: “Sinto-me entusiasmado com a experiência de misturar a velocidade das minhas obras com a velocidade dos carros desportivos.” A velocidade era precisamente uma das mensagens que o artista pretendia transmitir. Outras, discrimina, passaram pelas ideias de “futuro”, “infinito” e “espaço”.
O Peugeot 9X8, que se estreou em Monza há quase um ano, conta com um motor V6 twin-turbo de 2,6 litros com 700cv a alimentar o eixo traseiro e dois engenhos eléctricos de 200 kW (268cv) a fornecerem energia às rodas dianteiras. E já não se confundia facilmente com os restantes hiperdesportivos, uma vez que a marca abdicou da asa traseira, encontrando outras formas criativas para exercer forças descendentes sobre o carro.
Mas agora, como destaca Mathias Hossan, responsável pelo design da marca francesa, o hipercarro prima também pela “luminosidade e o optimismo” que sobressaem do design.
Ao imaginar a nova pintura do 9X8, J. Demsky optou por uma tela em branco sobre a qual realizou uma intervenção de cariz digital e pixelizada, cheia de cor, com linhas que criam um efeito tridimensional. O resultado é um art car como há algum tempo não se via. “É incrível ligar [a arte] a outros universos”, avalia o artista espanhol à Ímpar, ressalvando que não é por isso que gosta menos dos suportes tradicionais.
Ainda assim, o universo automobilístico parece tê-lo conquistado e já pensa no que poderá concretizar no futuro: “O próximo desafio seria abordar o design e a aerodinâmica de um automóvel com materiais e formas que parecem ficção científica antiga.”
O PÚBLICO esteve na Semana de Design de Milão a convite da Peugeot