Não deixemos para amanhã os direitos que têm de ser protegidos hoje

É premente a criação do provedor da Criança, entidade autónoma a funcionar junto do provedor de Justiça e especializada na promoção e defesa dos direitos das crianças.

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As crianças são seres individuais, que pertencem a uma comunidade na qual têm direitos e responsabilidades compatíveis com a sua idade e respetiva fase de desenvolvimento. São, portanto, titulares de direitos que requerem uma especial proteção por parte da sociedade pela sua vulnerabilidade em razão da idade. O seu livre e saudável desenvolvimento é fundamental não só para garantir a sua dignidade em múltiplas dimensões, mas também para combater a pobreza infantil e a discrepância de oportunidades no acesso à saúde e à educação.

Portugal tem vindo, sucessivamente e há já vários anos, a ser interpelado para a criação de uma entidade que coordene e monitorize a aplicação da Convenção sobre os Direitos das Crianças, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 20 de novembro de 1989 e ratificada por Portugal em setembro de 1990.

A Convenção sobre os Direitos da Criança é mais do que uma de declaração de princípios gerais, trata-se de um documento legislativo fundamental da nossa contemporaneidade, um dos mais amplos tratados internacionais de direitos humanos já ratificado na história e que determina um vínculo jurídico para os estados que a ela aderem, os quais devem adequar as normas de Direito interno às explanadas na Convenção, com vista à promoção e proteção eficaz dos direitos, liberdades e garantias nela consagrados.

A 1 de junho celebramos o Dia da Criança, data em que se homenageia as crianças e que também funciona como alerta para os problemas que afetam todas elas.

A Iniciativa Liberal tem apresentado medidas que visam consagrar os direitos das crianças e o seu saudável desenvolvimento. Basta existir uma única criança desprotegida para que sejamos convocados a agir! E é precisamente isso que temos feito.

Logo no início da legislatura, em maio de 2022, a IL apresentou um projeto para autonomizar expressamente o crime de exposição de menor a violência doméstica, por considerarmos ser a melhor forma de proteger os interesses das crianças expostas a este crime. Foi chumbado na generalidade com os votos contra do PS, PSD e PCP; com a abstenção do Chega e votos favoráveis da IL, BE, PAN e Livre.

Em fevereiro deste ano, a IL apresentou outro projeto que modifica o processo de adoção, alargando a idade máxima do adotando para os 18 anos (atualmente está fixada nos 15 anos). Foi aprovado na generalidade e encontra-se em processo de especialidade na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República.

Mais recentemente, seguindo algumas recomendações da comissão no relatório “Dar Voz ao Silêncio”, a IL submeteu projetos para aumento do prazo de prescrição para os crimes de abusos sexuais, realização de um inquérito nacional sobre o abuso sexual de menores na sociedade portuguesa e ainda uma medida que já constava no nosso programa eleitoral de 2022, a criação do provedor da Criança.

Atualmente, existem duas estruturas cujo trabalho se aproxima de uma defesa institucional dos direitos das crianças: o provedor de Justiça e a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ). Contudo, nenhuma destas tem a configuração ideal para defender os direitos das crianças face ao Estado: a primeira não é uma entidade especializada nos direitos das crianças e a CNPDPCJ não é independente, apesar de autónoma, funcionando no âmbito do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Se há matérias em que o Estado deve ter intervenção na vida das pessoas, este é um dos exemplos, precisamente para assegurar e garantir os direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos, sobretudo das crianças, especialmente quando falamos de crianças em situações de especial vulnerabilidade.

A criação de uma estrutura autónoma, reconhecida pelas instâncias internacionais dedicadas a este assunto e inserida em contexto europeu, é um passo imprescindível na proteção das crianças e contribui para levar mais longe os atuais mecanismos, que são insuficientes, de promoção dos direitos das crianças.

Numa altura em que o país e o mundo saem de uma situação pandémica que colocou em causa os direitos, as liberdades e as garantias de todos os cidadãos, mas em particular os das crianças, entre os quais o direito ao ensino, torna-se premente a criação do provedor da Criança, entidade autónoma a funcionar junto do provedor de Justiça e especializada na promoção e defesa dos direitos das crianças e de lhe atribuir a competência de divulgar e promover os direitos das crianças e os respetivos meios de defesa disponíveis.

Referiu Gabriela Mistral, poetisa e educadora chilena agraciada com o prémio Nobel da Literatura em 1945: “O futuro das crianças é sempre hoje. Amanhã será tarde.” A Iniciativa Liberal não deixará para amanhã os direitos que têm de ser protegidos hoje.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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