Medicamento para a Alzheimer abranda a progressão da doença em 35%

Em Portugal estima-se que vivam hoje 200 mil pessoas com demência, sendo a Alzheimer a principal. A empresa que desenvolveu o novo medicamento vai pedir em Junho aprovação de uso nos Estados Unidos.

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Médico aponta para exame ao cérebro de doente de Alzheimer Reuters
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Um medicamento experimental para a doença de Alzheimer desenvolvido pela empresa farmacêutica Eli Lilly abrandou a queda cognitiva em 35% na fase final de um ensaio clínico cujos resultados estão a gerar muita expectativa, segundo os dados da própria empresa, o que pode vir a traduzir-se na existência de um segundo tratamento com eficácia para esta doença neurodegenerativa.

O medicamento – o donanemab – cumpriu todos os objectivos do ensaio clínico. Atrasou a progressão da doença de Alzheimer em 35% a 36% em comparação com um placebo em 1182 pessoas diagnósticas com a doença em fase inicial segundo exames imagiológicos que mostram depósitos da proteína beta-amilóide e fases intermédias da proteína tau. Isto de acordo com a empresa farmacêutica Lilly. O ensaio a outros 552 doentes mostrou a presença de níveis elevados da proteína tau, o que sugere que é menos provável que respondam ao tratamento.

Na combinação dos dois grupos de pacientes, o donanemab mostrou que abrandava a progressão da doença em 22% (utilizando-se uma escala desenvolvida pela Lilly para medir a cognição e as actividades quotidianas) e em 29% (utilizando uma escala mais comummente aplicada para avaliar a progressão da doença).

“Estes são os dados mais robustos de ensaios de fase 3 sobre um tratamento da Alzheimer até ao momento”, disse Maria Carrillo, a responsável científica da Associação de Alzheimer, nos Estados Unidos.

Utilizando a escala de uso mais comum, os resultados de ensaios publicados no ano passado mostraram que o fármaco lecanemab, com o nome comercial Leqembi, das empresas Eisai e Biogen, reduziu a taxa de declínio cognitivo em 27% em doentes de Alzheimer em fase inicial.

No grupo tratamento do donanemab, a Lilly disse que houve inchaço do cérebro em 24% dos participantes – um efeito secundário deste tipo de medicamentos –, com 6,1% dos doentes a manifestarem sintomas. Ocorreram hemorragias ao cérebro em 31,4% do grupo de participantes que recebeu o donanemab e em 13,6% no grupo que tomou um placebo.

No ensaio de fase 3 do ensaio do Leqembi, o medicamento foi associado a inchaço do cérebro em quase 13% dos participantes do estudo. A Lilly diz que a incidência de inchaço cerebral grave no estudo do donanemab foi de 1,6%, incluindo duas mortes atribuídas à doença, e uma terceira, depois de um incidente grave de inchaço cerebral.

Eric Reiman, director executivo do Instituto Banner de Alzheimer (Estados Unidos), que está a realizar um estudo sobre a prevenção da doença de Alzheimer em pacientes pré-sintomáticos que tomam donanemab, disse que estava “muito entusiasmado” com os resultados. “Claramente, vimos benefícios aqui, mas há algum risco que deve ser tido em consideração.”

A Lilly planeia submeter o pedido de aprovação do medicamento às autoridades dos Estados Unidos no final de Junho, e pouco depois às entidades de regulação na área da saúde de outros países.

“Em medicina, há riscos, mas penso que, quando olhamos para estes resultados no contexto de uma doença fatal que ameaça a vida, eles são bastante importantes”, disse em entrevista à agência Reuters Anne White, responsável na área das neurociências na Lilly.

Os participantes no estudo receberam uma infusão intravenosa por mês de donanemab. Quando os exames de imagiologia ao cérebro revelavam que a proteína amilóide tinha sido removida, interrompia-se o tratamento e os voluntários passavam para o grupo dos voluntários que recebiam um placebo. Metade dos participantes no ensaio não apresentaram sinais de placas de beta-amilóide ao fim de 12 meses, disse ainda a empresa farmacêutica.

A empresa referiu ainda que 47% dos doentes que tomaram donanemab no ensaio de 18 meses não apresentavam uma progressão na doença ao fim de 12 meses, em comparação com 29% dos participantes no grupo do placebo.

Três medicamentos para a Alzheimer

É provável que o medicamento da Lilly se torne o terceiro na sua classe a ser aprovado no mercado dos Estados Unidos, seguindo-se a dois fármacos similares desenvolvidos pela Eisai e a Biogen – o Leqembi e o Aduhelm, que não tiveram grande sucesso junto de médicos e seguradoras depois de terem mostrado que tinham efeito pequeno no declínio cognitivo.

Ambos foram aprovados pela Food and Drug Admnistration (FDA), a entidade reguladora dos medicamentos nos EUA, ao abrigo de um programa de aprovação acelerado, devido à sua capacidade de remoção de placas de beta-amilóide. O Leqembi encontra-se actualmente em processo de revisão normal da FDA, com a decisão prevista para 6 de Julho.

A Lilly ainda está a finalizar o trabalho relativo ao preço do donanemab, que deverá ter a mesma ordem de grandeza de outras terapias similares, disse à CNCB o CEO da empresa, David Ricks. Mais de seis milhões de norte-americanos vivem com Alzheimer e estima-se que o número suba para quase 13 milhões até 2050, segundo a Associação de Alzheimer.

[Embora não haja estudos muito detalhados em Portugal, estima-se que existem actualmente no país cerca de 200 mil pessoas com demência, sendo a doença de Alzheimer a principal causa deste tipo de patologias, informa Tiago Gil Oliveira, presidente da Sociedade Portuguesa de Neurociências. Para 2050, a estimativa é 350 mil pessoas com demência em Portugal].

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