Operação Babel. Ministério da Justiça naturalizou empresário israelita agora detido por corrupção
Elad Dror foi certificado como sefardita pela Comunidade Israelita do Porto em Janeiro de 2018 e os seus sócios também foram naturalizados
O fundador da imobiliária de luxo Fortera, Elad Baruch Dror, detido esta terça-feira por suspeitas de ter corrompido o vice-presidente da Câmara de Gaia para obter vantagens urbanísticas em megaprojectos imobiliários, foi naturalizado português em Novembro de 2020, depois de a Comunidade Israelita do Porto ter certificado a sua origem sefardita dois anos e meio antes.
Após esta certificação, o Ministério da Justiça naturalizou o empresário de 43 anos, a 19 de Novembro de 2020, segundo o PÚBLICO conseguiu apurar.
Quando chegou a Portugal, em 2010, Dror fixou-se no Porto mas não abraçou logo a promoção imobiliária. Num artigo publicado há perto de quatro anos, explica como criou a Beyond Fresh, empresa-mãe das lojas de acessórios e reparação de telemóveis Smart Talk e Dr. Smart.
Num livro publicado apenas em hebraico e intitulado De Um Limão a Um Milhão, numa referência à venda de limonada nas ruas durante a infância, Elad Dror descreve o seu atribulado percurso: “Fundei mais de 77 empresas, cheguei a zero liquidez mais de uma vez, ganhei milhões e perdi milhões, às vezes num dia e às vezes em vários anos.”
De empresas de cosmética a carrinhos para bebé, passando por brinquedos, vinhos e cannabis medicinal, o luso-israelita negociou um pouco de tudo. Chegou a gerir um restaurante em Madrid, uma das cidades onde morou. Também residiu nos Estados Unidos, Inglaterra e Bélgica.
Em Portugal, estabeleceu 35 contratos de pequenos quiosques em centros comerciais Dolce Vita para vender brinquedos. Abriu depois um escritório no Porto e fundou outra empresa de acessórios para telemóveis, que ainda mantém, com mais de 200 trabalhadores.
Em 2016, funda o grupo Fortera, juntamente com dois sócios israelitas, também certficados como judeus sefarditas pela CIP e que obtiveram a nacionalidade portuguesa - Nir Shalom (membro da CIP, assim como Dror) e Shimon Danino. A imobiliária tem em curso vários projectos emblemáticos, como a construção de um hotel no Cais de Gaia, a escassos 50 metros da Ponte de D. Luís, que deverá terminar ainda este ano, ou a implantação da torre mais alta do país no futuro Centro de Congressos de Gaia, com 28 andares e 100 metros de altura.
Previsto para a Rua do General Torres, nas traseiras da Câmara de Gaia, o empreendimento projectado pelo arquitecto Souto de Moura terá 160 quartos de hotel e 111 apartamentos com serviço, um terraço, uma piscina-infinita, um clube de bem-estar, bar, dois restaurantes e vista panorâmica. O grupo lançou também o projecto Alive Riverside, um conjunto de apartamentos em Gaia com vista para o Douro, perto da Ponte da Arrábida, que implica um investimento de 110 milhões de euros e cuja conclusão está prevista para o Verão de 2025. “Ficará também a 200 metros da futura Linha Rubi do metro, que deverá ligar o Porto a Santo Ovídio em 2025”, lê-se no site do empreendimento do grupo imobiliário.
Estes dois últimos empreendimentos estão na mira das autoridades, no âmbito da Operação Babel, que ontem deteve sete pessoas, incluindo o número dois da Câmara de Gaia. De acordo com um comunicado da Polícia Judiciária emitido esta terça-feira, a investigação “centra-se na viciação de normas e instrução de processos de licenciamento urbanístico em favor de promotores associados a projectos de elevada densidade e magnitude, estando em causa interesses imobiliários na ordem dos 300 milhões de euros, mediante a oferta e aceitação de contrapartidas de cariz pecuniário”.
A Operação Babel realizou buscas em três inquéritos diferentes, um dos quais investiga suspeitas de práticas destinadas a favorecer particulares no recrutamento de recursos humanos e na prestação de serviços contratadas pelo executivo municipal de Gaia. É neste processo, que não tem detidos, que o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, foi constituído arguido.
As autoridades falam ainda em “fenómenos corruptivos ao nível dos funcionários de outros serviços” nos quais os promotores imobiliários suspeitos possuíam interesses económicos, uma referência a um outro inquérito no âmbito do qual estão detidas duas pessoas. Trata-se de um funcionário da câmara do Porto que trabalha na área do urbanismo e de um antigo colega que agora está num julgado de paz, mas que ainda venderia a sua alegada influência no município portuense.