PS quer nomes sem género no registo civil. Jo e Riley querem mais

Projecto de lei do PS quer acabar com a obrigação do nome não poder “suscitar dúvidas sobre o sexo do registando”. Jo e Riley, duas pessoas não-binárias, explicam como levar a proposta mais longe.

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PS lança proposta de lei para incluir nomes neutros no registo civil Norbu GYACHUNG/Unsplash
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O PS apresentou um projecto de lei para passar a permitir nomes neutros no registo civil, acabando, desta forma, com a obrigação do "nome próprio indicar o sexo da pessoa", como consta no código do registo civil.

Na proposta, os socialistas defendem que a lei actual deixa de fora pessoas trans, não-binárias ou intersexo que decidiram não mudar o marcador de género no registo, opção que limita a escolha do nome próprio, que, além de ter de ser um nome português, não deve “suscitar dúvidas sobre o sexo do registando”, lê-se no artigo 103.º do Código do Registo Civil.

O PS alega que esta exigência se sobrepõe ao direito à identidade pessoal e pede, por isso, que a mesma seja retirada “para permitir a possibilidade de todas as pessoas autodeterminarem o seu nome próprio” e dispensar “o Estado da tarefa de decidir com que sexo será conotado cada nome”. “A maior parte dos países da União Europeia não tem a limitação que, neste momento, vigora em Portugal. Achamos que não há hoje motivos para mantermos esta limitação legal”, completa o deputado socialista Miguel Costa Matos.

Em declarações ao P3, o deputado esclarece que o que propõem é "a possibilidade de existir um nome legal que não é apenas um nome social” e que, por si só, não está associado ao género feminino ou masculino. Não está a ser discutida, no entanto, a hipótese de acrescentar ao registo civil um terceiro género ou o género neutro.

Jo Matos, da direcção da rede ex aequo, considera que a proposta é uma “evolução positiva”, mas limitada. “Há a questão das pessoas não binárias que, neste caso, podem ver os seus nomes neutros em género reconhecidos mas vão ter que continuar a ter o marcador de género como feminino ou masculino, o que não é ideal”, acrescenta, dando como exemplo o seu caso.

A proposta também não fala sobre ser necessário ou não pagar para mudar o nome no registo, algo que, na opinião de Jo, constitui “uma grande barreira no acesso à autodeterminação”.

Neste momento, a lei diz que a mudança de nome para afirmar a identidade de género é gratuita, mas para todos os outros casos tem um custo de 200 euros. Se Jo mudar o nome e escolher o género masculino é gratuito, mas se escolher o feminino já não, explica.

Questionado sobre este tema, Miguel Costa Matos afirma que o partido concorda com o que está na lei: quando se trata de autodeterminação de género, a mudança de nome deve ser gratuita. No entanto, no caso dos nomes neutros, e mesmo para afirmar a identidade de pessoas não-binárias, a mudança terá o custo de 200 euros.

Na lista de nomes próprios de cidadãos portugueses nos últimos três anos, existem nomes que se repetem na coluna do masculino e feminino. Noah é um exemplo.

Nomes neutros só não chegam

Jo destaca que, em Portugal, as propostas de lei sobre estes temas já deveriam estar mais avançadas. Da mesma forma, defende, a lei para incluir nomes neutros no registo civil não deve ficar por aqui e sugere que se retire o género do cartão de cidadão e exista um marcador de género neutro. “É preciso continuar a lutar por mais até que toda a gente seja efectivamente protegida e reconhecida pela lei."

Línguas como a inglesa (they), francesa (iel), sueca (hen) já incluem pronomes neutros. Em Portugal, existe o sistema "elu", que inclui os “neopronomes” pessoais elu, delu, nelu, aquelu, equivalentes aos pronomes femininos e masculinos, mas a língua "e os nomes próprios são também muito binários", aponta Riley Silva.

A viver na Coreia do Sul há alguns meses, Riley escolheu um nome "reconhecido internacionalmente" — mas também "assumidamente neutro", e quis que este mantivesse a primeira letra do seu nome de nascença: "Como em Portugal os nomes próprios têm uma divisão de género tão marcada, não gostava da interpretação imediata e errada sobre mim quando me apresentava a pessoas novas. Não sentia desconforto [com o nome de nascença], apenas com o que ele significava." Na lista de nomes próprios registados em Portugal nos últimos três anos, Riley surge apenas na coluna do masculino.

Os nomes internacionais, diz, são uma escolha popular para pessoas portuguesas não-binárias: Sam, Juno, Rey, Ary, Noah, Logan, Jayden/Jay, Robin, Charlie, Kai ou Hayden, exemplifica. Outra opção é a utilização de "abreviaturas de nomes que as pessoas irão associar como podendo ser masculinos ou femininos, como é o caso de Alex, Cris, Jo, Lou, Lu, Dani, Fran, Gabi, Leo, Rafa, Ari/Ary, Gil ou Tomi. "Também adjectivos, cores ou palavras associadas à natureza como Azul ou Blue, Sol, Mar, como normalmente têm menos conotação de género."

Em Abril, o Parlamento aprovou um outro projecto de lei do PS que permite a autodeterminação nas escolas, o que significa que os jovens podem, entre outros aspectos, alterar o nome e o género nos documentos da escola.

Na próxima quarta-feira, dia 17 de Maio, o Parlamento deverá discutir um projecto para assegurar uma mudança de nome automática nos registos predial e comercial depois de a mesma ter sido feita no registo civil. Segundo Miguel Costa Matos, os nomes neutros estão incluídos na proposta.

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