Recorde Rita Lee, a “padroeira da liberdade”, em dez músicas
A cantora brasileira morreu na noite desta segunda-feira em São Paulo.
A cantora e compositora Rita Lee morreu na noite desta segunda-feira na sua cidade natal, São Paulo, aos 75 anos, vítima de cancro.
Em dez músicas, visitamos os mundos cantados pela rainha do rock brasileiro: o mundo do prazer e do sexo, o do amor, o das mulheres, o mundo dos loucos e mutantes. Nesses reinos, Rita Lee perde os títulos de nobreza e é aquilo que sempre preferiu ser: “Padroeira da liberdade”.
Amor e sexo
Entre bossa nova e carnaval, prosa e poesia, aprendemos, em 2003, no álbum Balacobaco, o que têm de diferente o amor e o sexo. Amor é cristão; sexo é pagão. Amor é latifúndio; sexo é invasão. Amor é divino; sexo é animal.
A canção foi inspirada na crónica O amor atrapalha o sexo, escrita em 2002 pelo cineasta e jornalista Arnaldo Jabor para o jornal O Globo.
Lança perfume
“Me faz de gato e sapato/ E me deixa de quatro no ato/ Me enche de amor, de amor/Lança, menina/Lança todo esse perfume.” Com a produção do parceiro e marido, Roberto de Carvalho, Lança perfume foi fruto do álbum Rita Lee, em 1980.
Mania de você
Um ano antes, em 1979, Rita Lee Jones de Carvalho, conhecida apenas como Rita Lee, canta “Meu bem, você me dá água na boca/Vestindo fantasias, tirando a roupa/Molhada de suor, de tanto a gente se beijar/De tanto imaginar loucuras.”
Como conta na sua autobiografia, publicada em 2016, a música foi “composta em cinco minutos com o inspiradíssimo script de uma recém-trepada perfeita”. “Sem pudores, o casal se mostrava de corpo e alma, oferecendo a trilha sonora da sexualidade elegante para motel cinco estrelas nenhum botar defeito.”
Ovelha negra
Rita Lee levava uma vida sossegada, até que o pai lhe disse: “Filha, você é a ovelha negra da família, é hora de assumir, e sumir.” Também a banda de rock Lisergia tinha dias pacatos (apesar da referência à droga LSD, ou ácido lisérgico, no nome) até conhecer Rita Lee, que cantou ao seu lado durante alguns anos e lhes mudou o nome para Tutti Frutti. Foi com eles que lançou, em 1975, Ovelha negra.
Banho de espuma
Em 1981, de regresso ao reino de Afrodite, Rita Lee canta os corpos quentes, o amor, o desejo e o sexo num banho de espuma: “Lá no reino de Afrodite o amor passa dos limites/Quem quiser que se habilite, o que não falta é apetite.”
Nem luxo, nem lixo
Do disco Rita Lee, mais conhecido pelo tema Lança perfume, também faz parte Nem luxo, nem lixo: “Como vai você?/Assim como eu/Uma pessoa comum/Um filho de Deus.” Nessa época, década de 1980, o então príncipe Carlos, “pessoa comum” coroada no último sábado na Abadia de Westminster, confessa que Rita Lee é a cantora que mais gosta de ouvir.
Cor de rosa choque
Com o sarcasmo e atrevimento que a caracterizaram até ao final da vida, a cantora paulista dá a outra face de Eva, que é bela, mas também é fera, na música Cor de rosa choque. O tema integra o álbum de 1982 Rita Lee e Roberto de Carvalho, cuja capa, em que o casal surge sem roupa, partilha o tom provocador das suas letras: “Mulher é bicho esquisito/Todo o mês sangra/Um sexto sentido/Maior que a razão.”
Balada do louco
Em 1966, dois anos após ser instaurada uma ditadura militar no Brasil, Rita Lee formou com Arnaldo Baptista, com quem começara a namorar, e o irmão, Sérgio Baptista, o primeiro “[grupo] de rock brasileiro no sentido exacto da expressão”: os Mutantes (inicialmente chamados Os Bruxos). Balada do louco, escrita por Arnaldo e Rita, foi um dos sucessos da banda influenciada por Jimi Hendrix, The Beatles ou The Beach Boys.
Seria o fim do casamento com Arnaldo Baptista e a consequente saída da banda, em 1972, a abrir as portas da carreira a solo de Rita Lee.
Santa Rita de Sampa
A “autocanonização” de Rita Lee aconteceu depois de a Arquidiocese do Rio de Janeiro criticar a “grave decomposição moral” que foram os concertos dos Rolling Stones e de Rita no estádio Maracanã, em 1995, em que a cantora usou roupas em alusão à padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida.
“Santa Rita de Sampa surgiu em homenagem a mim mesma, que havia passado pelos quintos dos infernos e ressuscitado direto para o céu, minha definitiva autocanonização, uma respeitosa e escumbalhada adoração à imagem da padroeira dos frascos e comprimidos”, escreveu na sua autobiografia.
Minha vida
Em 2001, Rita Lee lança Aqui, Ali, em Qualquer Lugar, álbum em que interpreta músicas dos Beatles em ritmos bossa nova. Dessa selecção faz parte Minha vida, uma versão de In my life, da autoria de John Lennon e Paul McCartney. “Tem lugares que me lembram/Minha vida, por onde andei/As histórias, os caminhos/O destino que eu mudei.”