Mimicat quer lembrar o musical Chicago na Eurovisão. E já ensaia em Liverpool
Ai Coração é uma das 15 canções da primeira semifinal da 67.ª edição da Eurovisão, que começa em Liverpool esta terça-feira e pode ser acompanhada em directo na RTP1.
Em Março, Mimicat venceu o Festival da Canção com a sua canção, Ai Coração. Não tinha sido convidada para o concurso: fez parte da livre submissão, em que qualquer pessoa pode deixar um tema da sua autoria à apreciação do comité de apuramento. Agora, Marisa Mena, o nome verdadeiro da artista, está na primeira semifinal da Eurovisão, em Liverpool, que poderá ser acompanhada em directo na RTP1 esta terça-feira, a partir das 20h.
“As minhas expectativas são chegar lá... E rezar para que corra bem”, conta ao PÚBLICO via Zoom, a partir da cidade inglesa onde tem estado na última semana em preparativos para a competição, entre ensaios, entrevistas e convívio com os colegas. Soam-lhe aborrecidas as conversas sobre as casas de apostas e probabilidades (vão sempre variando, mas à hora de fecho desta edição algumas previsões apontam para a canção estar no 9.º lugar nesta semifinal composta por 15 canções, ou seja, com hipóteses de ser uma das dez apuradas para a final). “Queremos é divertir-nos e aproveitar esta oportunidade de pisar um palco visto por 200 milhões de pessoas [mundo fora e] outros milhares [mesmo ali à frente]”. Um palco, admite, que até pensou que fosse de maior dimensão antes de chegar à Liverpool Arena. “Não é todos os dias que acontece. É tentar aproveitar esta maravilhosa oportunidade, divertir-nos e continuarmos a ser verdadeiros”, resume.
“Obviamente, gostaria”, continua, “de passar à final.” “Se vai acontecer ou não, é completamente imprevisível, mas há sempre os burburinhos e os favoritos. Tento, honestamente, que isso não me influencie. Acho que não vai influenciar a maneira como eu vou abordar o palco”, mantém.
De Chicago a Liverpool
Ai Coração, que foi escrita há largos anos e conta com a colaboração de Luís Pereira na letra, é uma mistura dançável de burlesco, jazz clássico e várias tradições, entre Portugal, Espanha, os Balcãs e a América Latina. O seu travo de cabaré vem de um dos filmes favoritos da autora e intérprete: Chicago, a oscarizada adaptação de 2002 assinada por Rob Marshall do musical de palco de Bob Fosse de 1975, cuja acção se desenrola na década de 1920.
O filme é a “maior fonte de inspiração” para o aspecto visual da interpretação da canção. Aquilo de que gosta no musical é o ambiente sombrio. “Não é piroso, é muito elegante. Não sou assim tão fã de musicais, gosto de teatro musical, mas não de tudo”, afiança. Chicago tem “tudo muito estilizado”, diz, referindo-se à estética, maquilhagem e guarda-roupa. “Tentámos manter essa parte retorcida e sombria, mas sem perder a energia.” O filme, diz, “é intimista e ao mesmo tempo tem cenas visualmente muito fortes”, referindo a canção Cell Block Tango. “Das minhas cenas de cinema favoritas de sempre”, enfatiza. “Estamos a tentar ir um bocadinho por aí, mas infelizmente há muita gente que não conhece Chicago.”
Entre a final portuguesa e a semifinal europeia foram introduzidas algumas mudanças: intérprete e dançarinos estarão de vermelho. “Dantes, eu estava de vermelho e um bocadinho de preto na final, e os bailarinos de preto”, conta. Para a Eurovisão, Mimicat queria “uma mancha vermelha”. Em termos de coreografia, “mudou muito pouco”, tirando perder-se o sofá. “Tudo o que fazíamos no sofá estamos agora a fazer em pé”, garante a intérprete. “Íamos ter um trabalho de LED diferente, mas não conseguimos”, adianta, dizendo que, ainda assim, estão a “chegar muito perto” da estética do filme “com o trabalho de luzes”. “Quisemos sempre manter a intimidade da luz, mas ao mesmo tempo não perder o drama”, explica. O trabalho de câmara está orientado para manter “a teatralidade da coreografia” e não perder “a parte cómico-dramática que a coreografia tem”.
Mimicat tem já dois álbuns, For You, de 2014, e Back in Town, de 2017, mas nunca tinha chegado tão longe na carreira. Em 2001, participou, ainda adolescente, no Festival da Canção, sob o nome Izamena e com a canção Mundo Colorido. A experiência não lhe deixou boas memórias. “Não escrevi a canção, não fiz nada de criativo nela, fui só cantá-la, nem sabia bem que lá ia”, recorda. Os colegas da escola “fizeram uma festa” para assistir em conjunto ao Festival da Canção; na segunda-feira seguinte, recorda, foi “gozada”. Na altura, diz, “era uma adolescente muito insegura no palco”.
Há uns anos, lembrou-se do momento. E partilhou-o nas redes sociais antes de voltar ao Festival da Canção. Pedia aos seus seguidores para prestarem atenção ao vídeo e aos contrastes. “[Nesse tempo,] não tirava os olhos do chão e tinha uma voz completamente diferente, saía tudo pelo nariz – horrível”, lembra. Agora, assume que a idade lhe foi de feição: “Se não tivesse evoluído, teria sido um bocado chato.”