Almeida a fazer-se de “morto” e outras histórias a seguir no Giro 2023

Começa neste sábado a Volta a Itália e João Almeida tem uma estratégia clara: fazer-se de morto e deixar os mais fortes lutarem entre si em “ataques estúpidos” – conceito apresentado pelo próprio.

Foto
Almeida em acção no Giro EPA/Toni Albir

Em 2021, João Almeida disse em entrevista ao PÚBLICO que tinha uma história com o Giro por acabar e que se só pudesse ganhar mais uma corrida na carreira, seria a Volta a Itália. Em 2022, quando tinha essas contas para ajustar, teve a má fortuna de sucumbir à covid-19. A partir deste sábado, João Almeida pode, finalmente, ajustar contas com o Giro. Neste plano há boas e más notícias.

A boa é que Almeida fez uma preparação pensada nesta prova e mostrou, noutras corridas por etapas neste ano, que está em boa forma. A má notícia é que vão estar em prova Primoz Roglic e Remco Evenepoel – o que equivale a dizer que, em condições normais, Almeida e os restantes ciclistas estarão a lutar pelos “restos”, o último lugar do pódio.

Vamos a três histórias a seguir na Volta a Itália que se corre deste sábado até dia 28 de Maio e que não terá o campeão Jai Hindley, focado na ida ao Tour.

Almeida vai ser feliz a fazer um “Almeida”?

Em dias montanhosos, João Almeida não ataca agressivamente nem responde aos ataques com instinto. Vai ao seu ritmo e, mesmo quando perde terreno, acaba por alcançar ou mesmo ultrapassar os rivais – a isto já se chama fazer um “Almeida”, estratégia que tanto é vista como uma imagem de marca como criticada por revelar má leitura de corrida e incapacidade de trabalhar mais a explosão.

No Giro, não podemos esperar outra coisa e vai ser interessante ver se a estratégia resulta. O ciclista português assumiu que não pode vencer Roglic e Evenepoel no jogo deles. Por isso, vai fazer o seu – o de sempre.

“É bom deixá-los estar a disputar a corrida, a desgastarem-se um ao outro (…) não sou o corredor explosivo para reagir àqueles ataques ‘estúpidos’ que eles fazem, mas no geral espero dar-lhes dores de cabeça e estar na disputa pela vitória”, disse, entre risos, em entrevista ao site Top Cycling.

E não teve pudor em detalhar o plano de acção: “Os esforços que eles fazem vão pagá-los, isso é certo. Por mais fortes que sejam vão ressentir-se. Eu acredito nas minhas capacidades e sei que àquele ritmo se não chegar a eles é porque eles estão super-homens. É assim que eu penso. Eles eventualmente vão abrandar porque também não são de ferro. Temos de ser cautelosos porque Jumbo e Quick-Step levam blocos muito fortes também. Se calhar deixá-los gastar as balas mais ao início e aproveitar um momento, uma oportunidade que possa surgir”.

Almeida deixou claro ao que vai. Jumbo, INEOS e Quick-Step – ou Roglic, Geoghegan Hart e Evenepoel – deverão desgastar-se e Almeida vai assistir de perto – e de trás, como faz sempre.

O peso do “crono”

Outra história interessante de seguir será o impacto dos contra-relógios neste Giro. Os largos quilómetros contra o cronómetro não são novidade e não é por aí que o Giro será diferente. Importante é perceber o impacto da fase da corrida em que os “cronos” estão colocados.

Os dois primeiros surgem antes da fase mais dura da corrida, o que equivale a dizer que, quando chegar a alta-montanha mais dura, alguns ciclistas poderão já levar grandes perdas nos “cronos” e outros levarem já ganhos consideráveis. Nessa medida, essas duas etapas poderão influir de forma tremenda nas estratégias, já que colocará à defesa quem se defendeu bem e ao ataque quem mais perdeu, permitindo ter ciclistas de primeira linha em ofensivas à distância.

Depois, há um contra-relógio já no fim da prova, para acertar contas. Mas trata-se quase de uma crono-escalada, tal é a dureza do percurso – o que pode mudar tudo no final, já que será corrido com o desgaste brutal da última semana.

João Almeida disse que Roglic e Evenepoel vão estar claramente à sua frente no contra-relógio, deixando já a ideia de que, apesar de ser um contra-relogista competente, no Giro vai correr por minimizar perdas nesses dias. Mas também lembrou que a sua maior arma é a consistência. E é por aí que o último “crono”, numa fase final da prova que geralmente tem Almeida em melhor forma do que no início, pode ser útil ao português.

Quem torce pelos “velhotes”?

Mark Cavendish e Thibaut Pinot vão ao Giro e trazem duas histórias “atreladas”. O britânico precisa de uma boa preparação para a Volta a França, onde só precisa de uma vitória para bater o recorde de Eddy Merckx de mais vitórias no Tour.

Em Itália, tem de ganhar química com os colegas – mesmo não levando o lançador Cees Bol – e, se possível, confiança de que ainda sabe sprintar. Com concorrência “apenas” de Mads Pedersen, Pascal Ackermann e Fernando Gaviria, “Cav” tem espaço para poder brilhar – se é que ainda é capaz disso – e, num cenário idílico de quatro triunfos em Itália, pode chegar a Mario Cipollini no segundo lugar de mais vitórias em “grandes voltas” (57, contra as 63 de Merckx).

Depois, há Pinot. No último ano como ciclista profissional, o renomado gaulês, de carreira bem abaixo do que o próprio imaginou, vai correr por si próprio onde quer que vá. Mostrou bons sinais nas últimas semanas e, em Itália, vai querer ganhar uma etapa no seu último Giro. Alguém não torcerá por isso?

Sugerir correcção
Ler 1 comentários